terça-feira, 4 de setembro de 2012

Billy Paul No Parque Madureira

Um cara de uma dessas revistas alternativas me ligou. Qual é cara, você pode escrever uma matéria sobre o show do Billy Paul que vai ter aí no subúrbio? Eu disse: posso. Ele: mas não vai rolar cachê e nem divulgação. Eu perguntei: mas rola algum dinheiro pra um pastel e uma Coca-Cola? Ele respondeu: qual é cara? nós fazemos tudo pelo poder transformador da arte! Desligou. Vou logo avisando. Não sou crítico musical. Não sei se essa profissão existe. Assim como comentarista de futebol que eu acho uma profissão tão dispensável quanto ascensorista de elevador. Nem conheço o vasto trabalho do Billy Paul. Mas era de graça. Perto de casa. E com o agravante de ser em Madureira, que é a casa da música negra no Rio de Janeiro. A capital cultural do Rio de Janeiro. Então, justo. O cara certo no lugar certo. Eu e minha mina assistimos de camarote. Pendurados nas grades do fundo para poder ver o palco. Billy Paul não grita. Ou melhor, dá um grito de vez em quando, quando necessário. Ele é como aquele meio-campo, ou cabeça de área clássico, que joga para servir o time. Puxa a responsabilidade para si. Não é um show para quem não gosta de música e só está preocupado em balançar a bunda. Ele tem um tempo diferente, e Billy Paul sabe disso, pois deixa o cara das teclas, e o guitarrista solar tranquilamente... Fiquei impressionado com a falta de pressa mesmo quando se tratava dos hits. Assisti a shows clássicos nos últimos tempos. As pessoas vivem se repetindo. Billy Paul, não. Ele toca como se fosse desconhecido. Como se estivesse tocando num bar. Eu vi alguma coisa de verdade nessa noite. Não esses shows plásticos, em que a tecnologia é um componente tão importante que deixa tudo frio. E que você sabe de cor a hora em que o vocalista irá dar boa noite. Se o Prince ouvisse a versão de Purple Rain em Madureira, ele nunca mais cantaria essa música. Assim como acho que o Chico Buarque não deveria mais cantar Samba e Amor depois daquela versão do Caetano só com o violão. As backing vocals eram maravilhosas assim como a banda. De vez em quando em época de eleição acontece alguma coisa interessante no subúrbio.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Dois Personagens...

Eles passaram por mim na escada. Não reconheci nenhum dos dois. Um deles estava de cabeça baixa e nem pude perceber a sua fisionomia direito. Mas fiquei com a certeza de que os conhecia. Matutei isso durante um bom tempo. Eu tinha certeza que havia uma intimidade imensa entre a gente. No dia seguinte, durante a manhã, aquela encontro me veio a cabeça novamente. Eu fiz aquela força que se faz com o cérebro quando se quer lembrar da letra de uma canção que não se ouve a muito tempo. E aí sim lembrei quem eles eram. Foi muito rápido. Talvez uma fração de segundos, como esbarrar , dar um encontrão no meio da rua com alguém. Mas eu tive certeza absoluta. Eram eles. Eram eles dois. Os meus dois personagens. Eu havia sonhado com eles. Com os dois.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

O Furúnculo

A briga. Eu acabei rolando por cima da cama. Tentei me esconder. Era uma mulher furiosa com TPM, menopausa, ou sei lá o quê mais. Estava disposta a me trucidar. Depois dessa moda de homem ser picotado por mulher, nunca se sabe não é mesmo? Mas eu consegui fugir e me abrigar no banheiro. Eu sabia que havia cometido um crime. Aquilo não iria ficar barato. Mesmo que eu ficasse a noite inteira ali. Uma hora eu teria que sair. E com certeza ela estaria me esperando lá fora. A marca da traição estava no meio das minhas pernas. Ela sabia disso. Era tarde para apagar aquele rastro. Depois de algum tempo resolvi sair. Ela estava deitada na cama fingindo ler um livro, e olhou por sobre o mesmo, e por cima dos óculos. Ela já havia ralhado seriamente comigo antes. Nem que eu inventasse de dar flores ou caixa de bombons, ou carros com tele-mensagens, a essa altura do campeonato não adiantaria. Mas dessa vez eu pisei na bola realmente. Eu já havia espremido espinhas escondido. Mas o prazer dela em colocar aquele carnegão para fora era inestimável. Ela me agarrou sem dizer nada, puxou a minha calça e viu que eu havia espremido o furúnculo sozinho. Sentou na cama e chorou. Você espremeu teu furúnculo sozinho... buá... eu senti pena.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Vício!

Não consigo me controlar. Já foi o meu dinheiro quase todo. Toda vez que estou naquele lugar compro a minha droga. Certamente tenho que ir sem grana. O meu programa de doze passos me diz para evitar lugares e pessoas. Mas eu simplesmente não consigo. Voltei pra casa sem grana nenhuma depois que passou o efeito da viagem. E que viagem! Eu me senti um pinto no lixo, e agora estou jogando no chão, deprimido com o final da festa. E começo a perceber que vício é vício, e não importa qual vício seja, e que um vício sempre vai te levar para o buraco. Seja ele qual for! No começo é sempre assim, você acha que vai ser diferente, e que será aquela pessoa que vai conseguir se controlar. A gente nunca sabe quem vai ser o sorteado. Mas o tempo passa e nada, você é apenas mais um drogado que não come, não dorme, e que vaga pela cidade igual um zumbi, atrás de mais uma dose da maldita. Então que diferença faz ser viciado em cocaína, sexo, ou em qualquer outra droga? Se o processo é sempre o mesmo. O meu psiquiatra diz, o quê é a ansiedade sem a depressão? E qualquer vício sempre vem acompanhado destas duas. Quando percebo que estou duro de novo. E que não fui a praia e que fiquei um dia todo num quarto escuro com um livro na mão, eu percebo que não posso mais frequentar shoppings ou livrarias, e que tenho que manter a distância de sebos e feiras. As minhas costas estão fodidas de tanto ficar sentado escrevendo. Bom, pelo menos, isso é melhor que bebida, não dá ressaca, e quem sabe algum dia eu ganhe alguma coisa.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Sexo!

Eu espero a minha mina na estação. E vejo um grupo de adolescentes. Eles parecem ser de uma igreja dessas. E se revezam na hora de abordar os passageiros. Eu acompanho a cara e o sofrimento de cada um dos “escolhidos”. Sofro junto com eles, que estão vestidos de adultos “almofadinhas”. Três meninos e três meninas, que provavelmente devem ter algo melhor para fazer, do que ficar importunando as pessoas, com aquele papo de que deus vai resolver os problemas que a gente criou. Eu começo a acompanhar os seus gestos e movimentos, e penso que há algo errado no paraíso, como dizem os Paralamas do Sucesso. E pergunto a minha mina, por que eles não estão em outro lugar namorando, ou fazendo coisas que “adolescentes normais” fazem?  Ela me responde: obviamente os pais deles não deixam. E provavelmente eles vão se casar muito cedo por causa disso. Eles têm duas opções, ou ficam com os “irmãos” da igreja, ou ficam com os “irmãos” da igreja. Eu pergunto a ela: por quê? Ela me diz: sei lá, cara! Aí é querer saber demais...

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Drive, ou Taxi Driver?

Aquele escritor idiota vai na tevê dizer que é uma cidade turística linda. O taxista me diz: esse lixo está por todo lado. Alguém tem que limpar essa cidade. Esses putos infestam as ruas. Os putos são os travestis que fazem ponto de ponta a ponta na orla de uma das praias mais famosas do país. Não vejo travestis no meio da rua durante o dia. A barra deve ser pesada para eles aqui. Eu penso no quanto a maioria deles são machistas. Preconceituosos. Bebem demais. Enfiam a porrada nas mulheres. Só lavam a sua honra com sangue. Devem estar em primeiro lugar na estatística do crime passional. Também devem comer travestis. Alguém deve comer esses travestis. Senão eles não estariam ali. Estrangeiros. A cidade está cheia deles. Quando você para numa fila para fazer um jogo de loteria, consegue ouvir os seus sotaques. Eles são donos de restaurantes, de lojas, são donos de quase tudo. Provavelmente não vão para outra cidade aonde as coisas sejam mais difíceis, e as mulheres mais espertas. Por falar em mulheres espertas, volta e meia, uma delas consegue se casar com um deles. Basta adentrar um cibercafé para ouvir uma delas falando em outro idioma. Eu ouço uma mulher falando sobre o quarto onde eu vou ficar hospedado. Ela me diz: você vai ter que pagar uma taxa se perder a chave do apartamento. Homem não pode circular sem camisa pelos corredores. E me vem a cena na cabeça. Um homem branco, 50 anos, quase vermelho, parece um camarão queimado de praia. Eu já vi essa cena de madrugada. Mas ela se repete durante o dia. Ele abre o portão para duas meninas ainda adolescentes. Se tiverem quinze anos completos, cada uma, é muito. Ele vai até a cabine do porteiro que abre o enorme portão de ferro. Na tevê diz que nesta cidade, o que as câmeras de segurança mais flagram depois do uso de entorpecentes, é o atendado violento ao pudor. Eu desligo a tevê. A minha cabeça está doendo. Engulo um comprimido de Melhoral junto do meu antidepressivo. E desmaio.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Se Não Bebe, Usa Droga!

O moleque tem 16 anos. Toca guitarra pra cacete. Ele pensa que o Nirvana foi a última coisa boa da música pop. Nem sabe que a Amy Winehouse lançou um disco foda depois que o Kurt Cobain se matou. Ele se acha a última bolacha do pacote com aquela camisa do Ramones. O moleque não gosta de beber pois sente dor de cabeça. Ele deu um tapinha num baseado uma vez, mas não sentiu nada. Odeia o cheiro do cigarro. Nem quer sonhar com outras drogas. A namorada dele, não. Essa adora uma erva. Ele é obrigado a ficar se cagando esperando por ela em frente a boca de fumo. Ela com aquela camisa do Sex Pistols. Ela nem sabe que existem os Strokes e os Monkeys. Ela pensa que o Sex é melhor do que os Beatles. Só porque eles eram punks e os Beatles não. Quando ela apresenta o moleque a sua mãe, ele se esforça para dar um boa tarde senhora. A mãe dela responde com um mugido. Ou será um rugido. Melhor. Ela faz um barulho estranho com a boca. O moleque diz a menina. A sua mãe não falou comigo direito. Ela diz. Deixa isso pra lá, ela é assim com todo mundo. Quando o casal sai. A mãe da menina diz para o pai que está com a cara enfiada no jornal. Esse aí, se não bebe, usa droga!

terça-feira, 24 de julho de 2012

Troque Seu Cachorro Por Uma Criança Pobre

Agora essa moda de cão com sapatinho no colo chegou ao subúrbio. Antes isso era coisa de “fresco”. De madame da Zona-Sul. De “bicha”. De senhoritas de Manhattan que trabalham em revista de moda. Deixa o bicho andar. O bicho sabe se virar sozinho. Se você não o tivesse “adotado”, provavelmente ele ia conseguir se virar. Diferente de uma criança. Tem gente quem ama o bicho. Mas não tem amizade com um vizinho. Não se entende com o filho. E vem dar discurso a favor do animal. E dizer que é a favor da natureza. Todo dia morre criança assassinada. Tem uma porção de criança na fila de adoção. Faz igual ao Eduardo Dusek, troque seu cachorro por uma criança pobre.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

A Marquise

A marquise fica numa esquina próxima a minha casa. Antes ali funcionava um bar onde um daqueles senhores portugueses que te olham por cima dos óculos ficava sentado o dia inteiro. Ele olhava as pessoas paradas no ponto do outro lado da rua. Esse era o seu passatempo. Analisar as pessoas. E talvez ele reparasse nas suas roupas ou para onde elas iam. E talvez ele traçasse até um perfil psicológico delas. Antes do bar fechar as portas, e esse senhor botar a viola dele no saco, os adolescentes ficavam ali parados a noite. Fumando maconha e fugindo do frio. Quem sabe até espantando alguém que quisesse se recolher da chuva. Ficavam ali e pareciam fazer questão que todo mundo visse que estavam fumando maconha. Eu passei a nutrir uma simpatia silenciosa por eles. Pois me lembram de uma adolescência longínqua. Andam dizendo que estão roubando. E se isso for verdade, daqui a pouco vão aparecer mortos. E será uma pena saber que eram apenas crianças que pularam a infância, e estavam brincando de herói. Como dizem os sociólogos em jornais de hora do almoço. Mas logo após o bar fechar e os adolescentes darem uma sumida. É impressionante, como rapidamente apareceram uns mendigos para se acolher. Como se na cidade não houvesse nenhum lugar vago. E muita gente precisasse apenas de um pedaço de concreto para se ficar embaixo.

terça-feira, 17 de julho de 2012

A Lista de Promessas Que Um Homem Faz A Si Mesmo

O menino passou todo ensino básico olhando para aquela menina. Que devia se chamar Maria Clara ou Clarice. Algum nome desses que os ricos põem em seus filhos. O menino devia se chamar Zé ou Beto, uma dessas corruptelas que os pobres ganham junto dos seus nomes. A menina era branca de feições finas e narizinho arrebitado. Mas não era metida. Ela exibia uma cabeleira vermelha encaracolada. O menino era preto da cor da borracha do meu tênis. Mas por essa época ele ainda não sabia nada sobre racismo. Então isso não era nada que impedisse uma aproximação. Ele pressentia ser diferente. Mas não pela cor. Talvez por ter ganhado uma bolsa para estudar, e a sua mãe ser uma das faxineiras da escola. Todos os dias ele voltava para casa sozinho. Enquanto a sua mãe ficava varrendo a escola, a mãe da menina ia buscá-la. Todos os dias. A menina tirava as melhores notas. O menino era um aluno medíocre. Estava sempre a espreita da menina pelos corredores. Ela sempre retribuía o olhar. Ele sentia isso como uma forma de caridade. Aquele olhar era complacente. De santa. Como quem diz. Eu sei que você olha pra mim. Em nenhum momento ela era indiferente aquele olhar, ou tentava evitá-lo. O menino passou todo o ensino básico assim. Na esperança de que um dia ela retribuísse aquele olhar com alguma palavra. Terminou a escola. Nunca mais eles se viram. Até que um dia. Num supermercado. Os dois já bem crescidinhos. Se esbarraram. A menina disse "oi" para o menino. E escandalosamente pronunciou seu nome. Foi só isso. Depois ela se afastou com o carrinho. Mas era como se tivesse selado o segredo dos dois. Ele ficou feliz. Mas também arrependido de não ter tentado nada na época. E agora prometia a si mesmo nunca mais deixar de tentar. Mas aí ele já era um homem. E essa promessa entrou na lista de promessas que um homem faz a si mesmo. E que nem sempre cumpre.

domingo, 8 de julho de 2012

Estou Fora Para Ti!

Ela atendeu ao telefone e disse: fala. Eu odeio quando ela faz isso, pois me dá a sensação de que está falando com um cachorro. Eu disse: sou eu. Ela disse: eu sei, fala! A minha mãe gritou da cozinha. Não demora no telefone que a conta vem alta! Eu tapei o bocal com vergonha. Mas ela do outro lado continuou em silêncio. Eu disse: e aí quando você volta pra casa? Ela me disse: quando acabar a feira, sabe aquele cara aquele prêmio no ano passado, aquele eu te falei, ele tava falando aqui hoje! Nossa, ele é legal, é sim, Como ele é legal! Eu queria dizer a ela que o baile acabou porque prenderam o frente. Não tive coragem. Logo veio a minha cabeça aquele escritor afetado de echarpe que ela admira. e me deu vontade de desligar. Eu disse a ela: quando... Ela me cortou: está uma barulheira danada aqui, e o Brian tá falando comigo... Ela disse: já vou, Brian! Esse deve ser um puta intelectual, pensei. Um baita intelectual. Um puto desses que usa óculos, boina, e pronuncia as palavras corretamente. Ela disse: João, eu vou ter que desligar. Eu sei que quando ela fala João, ao invés de falar “Jão”, é porque ela quer esquecer daqui. Eu também, ás vezes eu quero. Eu disse: tudo bem. A minha mãe gritou: já vai desligar, ou não? Interurbano, pô! Ela disse: eu vou estar fora para ti por enquanto. Eu pensei "eu também". Estou fora para ti!

quarta-feira, 4 de julho de 2012

O Emissário do Capeta!

Ele tem seis, ou sete anos no máximo. É de uma família da classe média. Ou média baixa. Mas os pais dele pensam que são ricos. Eles moram num condomínio metido a besta que fica próximo a um bairro realmente chique. Mas não dentro dele como eles dão a entender. O pai é não sei o quê da Petrobrás. A sua mãe é uma espécie de mulher de jogador de futebol ou dançarina de funk, que usa aquele rádio horroroso em que todo mundo no supermercado ou no salão ouve a sua conversa bocejante. Em que ela diz o quanto gastou com o quê, ou chama as outras mulheres de traveca. E o moleque é o capeta. O cão. Mete a porrada em todas as crianças do condomínio. É o dono da bola. Ele apaga a velinha dos outros quando há festa de aniversário. Um dia desses ele estava conversando com um comparsa no corredor. Um cupincha. Um parceiro. Quando uma menina com o dobro de sua idade, que pelos dias de hoje, obviamente podia ser sua mãe, passou. E o mancomunado disse a ele: que gostosa! e ele, como se fosse um homem experiente. É isso que você chama de gostosa? Talvez por isso o seu apelido seja, O Emissário do Capeta.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Eu vou ser capa do New York Times de Amanhã

(Selecionei o trecho que considero mais polêmico)

Você é um artista desconhecido em seu país, como é ser estudado por um dos maiores antropólogos do mundo numa das maiores universidades do mundo? Eu disse: não faz diferença. Você faz isso e pronto. É o que tem que fazer. Eu sou um artista como outro qualquer. O repórter me perguntou: e ser estudado em inglês, se você escreve... Eu disse: é como ler Henry Miller sem saber inglês. Você olha aquelas palavras ali no papel, e não entende nenhuma delas. Mas sabe que tem alguma coisa. A barreira da língua não existe. Nem todo mundo que gosta dos Beatles sabe inglês. Mas saber um pouco de inglês é bom, eu disse, e o repórter sorriu. Você defende a legalização da Marijuana... Defendo porque eu vivo na América latina. E por que lá morre muito mais gente do que aqui, por exemplo, por causa da bebida, do cigarro, e da violência do tráfico de drogas. Se bem que lá agora o crack que está fortíssimo. E o tráfico é uma empresa que não sabe lidar com produtos e clientes. Seria melhor que fosse regulamentado para que existisse controle, e fiscalização. O seu argumento é esse? Não é o meu argumento, a lei seca não acabou com a bebida no seu país... É a mesma coisa. No outro dia o Presidente Obama falou que era a favor do casamento gay, dias depois foi feita alguma coisa por aqui, e acredito que isso tenha ajudado. Dependemos de vocês. E espero que entendam isso, até porque as maiores vítimas somos nós, e não vocês.

Tomara que eles publiquem na íntegra.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

3 Dentes Arrancados e Cinco Costelas Quebradas

Ele era o único da turma que não fumava maconha. Todo mundo fumava. Menos ele. Ele não. Sempre que alguém saía em direção a rodinha dizia a ele: nem um tapinha, fulano? Ele respondia: não, e levantava a garrafinha de água em direção a pessoa. Por esse motivo ele nunca seria parado numa blitz e preso por tráfico de entorpecentes ou porte ilegal de armas. Pois era um cara do bem. Da paz. E também não seria preso e levado a delegacia por dirigir embriagado. Já que ele não bebia. Ele levou um susto ao ser parado numa curva por carro policial. Ele era o tipo de cara que quando cruza com polícia começa a gaguejar. E ao ser indagado para onde ia, ele disse o óbvio. Pra casa. Quando ele atendeu um desses rádios em viva voz. Era um de seus amigos. Marinho. Marinho disse: tô indo pra boca! E para explicar aos policiais que boca era uma amiga de boca grande? Só depois de 3 dentes arrancados e cinco costelas quebradas.

domingo, 17 de junho de 2012

Eu Atirei Num Homem Só Para Vê-lo Morrer

Ele está ali no chão estrebuchando e virando os seus olhinhos japoneses em minha direção. Eu queria sentir alguma coisa por ele. Pena, ou sei lá o quê. Mas por mais que eu tente não consigo. Ele fica me olhando sem acreditar. Daquele mesmo jeito que me olhou a primeira vez que foi se encontrar comigo naquele prostíbulo de quinta categoria. Ele sempre me olha como se o dinheiro não fosse importante. Da mesma maneira quando ele me olhou a primeira vez. Como se a coisa menos importante fosse o que eu ia carregar na bolsa no outro dia de manhã. As outras meninas ficavam impressionadas com esses idiotas como se eles passassem dos limites em sua burrice. Eu não. Sempre fui indiferente a eles. E a ele que está me olhando pensar isso. Não me importo com aquela menina com quem ele estava. Mas também não quero que ela fique com o meu dinheiro. Não sei o que eu posso fazer com esse corpo. Não quero ser descoberta porque se não vou ter que me comportar como se acreditasse que um puto que é viciado em puta não merece morrer.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

É Melhor Ser Feio Do Que Ser Burro

No dia 12 de Junho, dia dos namorados, o rapaz pediu uma namorada a deus. Ele disse: deus me mande uma filha sua, que eu a farei feliz! No dia 13 de Junho, dia de Santo Antônio, o seu pedido foi atendido. Ele olhou para os céus e reparou que deus era um pouco de qualquer coisa, e que parecia não ter cor nem religião. No dia 14 de Junho, ele reclamou da namorada para deus. Mas senhor, essa mina é um bujão! E deus disse: quando você me pediu uma das minhas filhas, não especificou se queria uma modelo intelectual de Big-Brother. Ou uma pessoa normal dessas que se vê nas filas do supermercado. E quem é você que não sabe tocar duas notas, para dizer se o que eu criei é belo ou não? Você não me disse que a sua carência era sexual e não afetiva. Na hora ele se calou e agonizou com aquela injusta tarefa de contrariar a deus, e devolver a ele um pedido feito e atendido na hora. Então o rapaz decidiu que ficaria com a gordinha. Mocinha prendada que ia a uma igreja qualquer todo final de semana. Mas com o tempo não é que ele passou a gostar da gordinha cada vez mais. Pelo seu companheirismo, fidelidade e amor. Concluindo. Moral da história. Parábola filosófica. É Melhor ser feio do que ser burro.

sábado, 2 de junho de 2012

Evoluindo do Macaco!

A gente tava assistindo ao Globo Repórter. E a minha mina disse: vamô num zoológico ver como esses putos se movimentam ao vivo! Nós ficamos ali num domingo. Jogando pipoca aos macacos. Em determinado momento um macaco puxava o rabo do outro e se escondia. Puxava o rabo do outro e se escondia. Eu disse a minha mina: lindinha. Ela: o quê é?! Eu disse: esse puto tá sacaneando o outro. Esse puto tá sacaneando o outro igual à gente faz. Caralho, que foda! Ela disse com o seu mau humor feminino: e daí? Eu respondi: e daí que nós devemos ter vindo desse bicho aí, mesmo! Ela disse: eu não vim da costela de Adão, e muito menos dessa coisa nojenta! Além do mais essa teoria já deve ter caído. Outro dia eu vi uma reportagem que se passava na Índia que dizia que um macaco distraia o dono da barraca de fruta pro outro poder roubar. Um amigo meu me contou, que antes de um macaco morrer numa caçada, ele põe a mão em frente ao, digamos, rosto. Como quem sabe que vai morrer! Nós até podemos não ter vindo desse bicho. Mas que nós temos alguma semelhança com ele, ah, isso nós temos!

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Deus é Mau!

Minha mina me chamou: vem ver aquele preto que você gosta na televisão! Aquele preto que eu gosto é um pastor. Toda vez que eu assisto a televisão, eu assisto ao programa desse pastor. Não há nada melhor na televisão. E ontem o pastor contou uma história impressionante. Ele foi assaltado e ameaçado de morte por três caras. Puseram uma pistola na cabeça dele. A mulher dele chorando. Todo mundo gritando. Maior terror. Aí ele leu um trecho da bíblia pros caras. E disse a eles que aquela era a última oportunidade que eles tinham de se arrepender. Os cabras foram embora sem levar nada, e não se arrependeram. Então depois ele apareceu na televisão falando que ia dar mais sete dias para eles se arrependerem. E nisso ele leu um trecho da bíblia em que deus diz seus inimigos são meus inimigos. Eles não se arrependeram de novo. Pronto. Sete dias completos. Os três apareceram baleados com um número de balas simbólico em suas respectivas cabeças. Sete. E eu cheguei a conclusão que: deus é mau!

domingo, 27 de maio de 2012

Eu Odeio a Escola

Eu odeio a escola. Como instituição. Com os seus muros altos e os seus horizontes fechados. A escola destruiu o que restava da minha autoestima. Ela me reprovou cinco vezes na quinta série! Hoje em dia todo mundo passa. Mas em compensação ninguém sabe ler ou escrever direito, ou o que é pior, interpretar o que se lê e ou o que se escreve. Eu odeio a escola. Com toda a sua acentuação indesejável, e a sua matemática inexata. Coitada dessa escola com seus acadêmicos bundões que pensam que só eles podem salvar o mundo, como se nós precisássemos deles, que não enxergam um palmo na frente do próprio nariz, para nos mostrar o caminho. Eu odeio a escola com todos os meus clichês. Assim como ela tem os dela. Inclusive que é o de me querer trabalhando num balcão de uma loja de departamentos, para que o melhor lugar fique com alguém mais apto que eu, pois não há vaga para todo mundo. Mas sem discurso marxista de esquerda brasileira frustrada por não ter uma ditadura como inimiga. Eu odeio a escola. E a única coisa interessante que aconteceu por lá, foi uma professora me apresentar um livro pela primeira vez. Depois disso, eu peguei os livros em sua própria biblioteca, e a escola nem percebeu. Até que um dia ela me expulsou do seu colo com um pé na bunda. O que me deixou com toda essa mágoa e ódio, por ter me feito perder tanto tempo, e não ter me ensinado quase nada do que eu realmente queria aprender. E de não ter aproveitado nada do pouco potencial que eu sempre tive. Eu odeio a escola. Por sua falta de tempo, e por ela me iludir com um diploma, e subestimar a minha inteligência. Eu odeio a escola por ela julgar que todo mundo é igual. Eu odeio a escola. Mas eu escrevo, e mesmo errado, você entende o que eu escrevo. Mas duvido que você entenda tudo que ela escreve.

sábado, 26 de maio de 2012

Vai Passar o Rambo na Televisão!

Naquela época antes de pirataria um filme levava mais ou menos dois anos para chegar a televisão, e depois ao vídeo-cassete, e vice e versa. Se é que já existia o vídeo lá em casa. Então na escola foi aquele furdunço. Todo mundo na expectativa. Só se falava disso. Era uma espécie de final de copa do mundo. O Rambo ia passar na televisão. No SBT canal onze. Eu não me lembro bem que Rambo era, se o 1, o 2, ou três. Só sei que os sacanas da Globo decidiram esticar a novela. E o sacana do Sílvio Santos com aquele riso puro e franco para um filme de terror, como dizia o Raulzito, resolveu que não ia passar o filme enquanto não terminasse a novela. E fez algo inacreditável para os dias de hoje. Ele pôs na tela uma imagem congelada do Rambo, dizendo que o filme iria começar logo após a novela. Não dava nem pra esperar navegando na internet, pois ela ainda não existia. Eu estava cansado e tinha que acordar cedo pra ir pra merda daquela escola. Disse a minha mãe e ao meu pai: se eu cochilar, vocês me acordem, pelo-amor-de-deus, hein? Ai, ai, ai, ai, ai! Quando acordei assustado o meu pai com a sua nostálgica pança e o seu bigode ridículo me disse: que filmaço! Ainda deu pra pegar as letrinhas subindo. Nunca mais eu quis saber do Rambo. Nunca perdoei os meus pais. E vocês não sabem o trauma que carrego daquele dia seguinte.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Carta A Um Amigo Famoso

Não acho que você deva se justificar publicamente. Você só deve fazer isso perante a quem prejudicou. E se está fazendo isso agora, é porque o povo é “moralista”. Aposto com você que tem uma porção que acha a tua desculpa louvável, mas que continua fazendo o mesmo que você fez, ou pior. No fim das contas as pessoas públicas ficam com o quinhão de dar o “exemplo”. Mas numa sociedade, não são apenas as pessoas públicas que tomam decisões importantes. Tem que se tomar cuidado, pois a nova era está decretando o fim da nossa privacidade, e nós estamos embarcando nessa. Quem sente verdadeiramente o que você fez, ou faz, é quem está próximo a você. Para gente como eu, você vai sempre ser alguém imaterial que eu vou poder admirar quando quiser. Pois queira ou não, para gente como eu, você é uma bela de uma arte. E você pode até relacionar a sua arte aos seus atos... Mas não costumo me interessar nem pelo que os políticos fazem. A não ser que isso influencie diretamente na minha vida. Não vou deixar de ouvir uma música, ou assistir a um filme, por causa do que o artista é pessoalmente. Já conheci artistas que me decepcionaram. Mesmo assim continuei admirando, e acompanhando os seus trabalhos. Pois eles são inspiradores. Não carregue esse fardo, amigo. Pois ele é pesado demais.

terça-feira, 22 de maio de 2012

O Labirinto Da Língua

Eu fui num lugar. Mas o lugar nunca tem importância. E sim o que acontece nele. E lá havia uma placa onde estava escrito: proibida a entrada de pessoas estranhas. Se a placa estava se referindo ao desconhecido, de quem trabalha ali, tudo bem, eu ia poder entrar. Mas se ela estavs se referindo a estranho, sinônimo de esquisito, eu não ia poder entrar. Pois eu sou um cara tão estranho quanto aquele cara daquela música dos Los Hermanos, que é aquela banda que os universitários amam, e que tem aquele clipe que faz referência ao Kafka. Ou People Are Strange do The Doors. Eu sou o que se chama de excêntrico. E leia-se para uma sociedade careta, ainda, tão careta quanto falar careta. E no meu caso, eu sou um famigerado artista-vagabundo, ainda, depois de todos esses artistas famosos no mundo todo. Se fosse esse o sentido, eu não poderia entrar. A língua põe a gente em cada labirinto!

domingo, 20 de maio de 2012

O Mendigo Foi Pro Casamento Do Belo!

Eu tava parado em frente a um sebo do Centro da Cidade. Olhando aqueles livros de  5 reais que ficam naquela banquinha da frente. Que era o que eu tinha no bolso contando com algumas moedas. Eu queria que a minha mina aparecesse logo. Pois assim poderia arrancar mais cinco reais dela. E quem sabe comprar algum Rubem Fonseca. Ou qualquer outro falastrão desses. Quando aparece um mendigo, e pergunta para o outro: não vai no casamento do Belo, não? E o outro devolve: onde? Aqui na Candelária! O amigo diz: vambora! E eles saem correndo. O senhor grisalho surge no fundo do sebo e me pergunta: o que foi essa gritaria? Eu digo: eles vão pro casamento do Belo! E ele responde: tá, e eu sou um belo, um belo de um idiota!

sábado, 19 de maio de 2012

MacEscravo

Eu acordei o cara. Ele me agarrou pela gola da camisa. Tava babando. O Cheiro de bebida era insuportável. Odeio esse cheiro de cerveja envelhecida. Ele me perguntou: eu emagreci? Eu respondi: um pouco... Ele: olha o que o McDonald`s fez comigo?! Quando olhei com atenção os olhos eram duas crateras envoltas por duas crostas pretas. Olheiras que só vi em bêbados imprestáveis. E ele me disse: eu comecei a fumar, cara! Eu não fumava! Enquanto dizia isso a guimba do cigarro queimava junto dos seus dedos. Quando subiu aquele cheiro de carne queimada tipo hambúrguer. Ironia do destino. Olha o que o McDonald`s fez comigo?! Ele repetiu. Eu disse a ele: cara, tudo bem, você vai arrumar outro emprego! Ele me disse: o quê você sabe sobre isso? sobre trabalho? Você vive enganando esses otários dizendo que é artista... Eu disse: olha, prefiro fazer o que eu gosto do que ficar igual a você! De repente ele me ignorou. Puxou uma bandeja debaixo da cama. Esticou uma fileira gigante. E pum! Eu gritei: caralho!!! E ele desmaiou.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Eu Fui Atropelado, Mas Não Morri!

A mãe vivia dizendo: Juninho não corre pra rua. E Juninho sempre ficava na Calçada. Admirando os carros com o seu ardor automobilístico. A mãe dizia: Juninho, se um carro te pegar, você morre, menino! Ela sempre dizia isso. Até que um belo dia, como numa fábula, Juninho correu. E foi atropelado. Mas nada demais. Só uma pancadinha de um motorista imbecil. Apenas um galo imenso na testa. Que de tão enorme a enfermeira disse: ele vai cantar hein, menino! Quando a mãe chegou ao hospital, carregada pela família, e sobre o efeito de calmantes, Juninho disse: mãe... eu fui atropelado, mas não morri!

A mãe de Juninho vivia assistindo aquele programa policial de hora do almoço em que o apresentador aterroriza as pessoas dizendo: o bandido foi pro saco! A mãe sempre assistia aquilo. E Juninho perguntou: o quê é ir pro saco, mãe? E ela: é quando a pessoa faz coisa errada e morre meu filho. Não pode fazer coisa errada hein? Ai, ai, ai! Quando o gato da família se esquivou para a rua. E ficou grudado que nem chiclete na roda do carro, a mãe de Juninho perguntou a ele: o que aconteceu com o bichano? E Juninho respondeu: foi pro saco!

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Inadequado Para Homens Solteiros

Assistindo o casal de amigos brigões Mateus disse a Letícia. Esse casal briga demais. E Letícia disse. É normal casal brigar. E Mateus disse: é, mas tem hora que é chato. E Letícia: eu sei como você pensa e sei que você faz uma tempestade em copo d’água! E Mateus disse: é... eu só acho que as pessoas não deviam brigar a toa. E Letícia responde: a gente não briga a toa. A gente briga pra decidir as coisas. Mas briga é briga e... Não é briga! Mateus: então tá, é discussão. Letícia: não é discussão. É conversa. Se existe conversa com pessoas gritando eu desconheço, disse Mat. E Letícia contra argumentou: e de mais a mais nós não brigamos como eles. Ela apontou para os dois do outro lado da rua. Não dava para ouvir o que eles falavam. Ainda bem. Se não se ouviria uma porção de palavrões. Mas as mãos subiam e a descida era quase na cara do interlocutor/a. Letícia complementou. Nós só temos brigas bobas. E Mateus pensou, se essas brigas são tão bobas, então porque é que elas acontecem? Mas não disse nada. Pois já estava cansado de discutir, de brigar, conversar, ou seja, lá o que for!

sábado, 12 de maio de 2012

Mortinho da Silva

Ela só queria falar sobre a porra do ex-namorado dela. A porra do ex-namorado morto, que se fudeu num acidente de carro. Quando bateu o ponteiro parou no cento e vinte. No poste. Na marca. Se espatifou. Virou mingau. Cheio de pó e uísque na veia. Enquanto a boca de Karen se movimenta, Kevin não ouve mais nada de blá-blá-blá o quanto ele era legal. Só consegue observar os lábios vermelhos e tenta sentir o perfume entre os tantos odores do restaurante que uma daquelas revistas de fresco diz ser muito bom. Kevin pensa que não vai mais poder dormir um dia da sua vida sem essa mulher. Quando o garçom chega com o vinho branco suave, Kevin diz: o seu namorado devia ser alguém interessante de se conhecer... E Karen responde: acredito que você fosse gostar muito dele. E Kevin sente uma imensa vontade de dizer: foda-se a porra do seu ex-namorado! Mas depois pensa, que se foda, ela não vai poder mais trepar com ele mesmo! Pode viver esse amor platônico por toda a eternidade. Pois ele está morto. Mortinho da Silva.

domingo, 6 de maio de 2012

Lendas Urbanas 1 - O Motel

Ele parou na garagem do motel. Havia acabado de se despedir da balconista da lojinha de roupa. E daquele sexo fast food de hora do almoço, estilo machão latino americano. Quando viu um carro que desconfiou ser do seu amigo de ofício. Deu um sorriso e resolveu ligar pra ele do celular. Aí, tú tá onde? eu tô aqui na firma. E ele, sei, firma. Tô parado em frente ao teu carro. E o outro: hoje ele não tá comigo, não. Hoje é dia da minha esposa fazer compra. Ele respondeu: tô de brincadeira, queria saber sobre aquele contrato. Daqui a pouco eu tô chegando... E o outro sem entender nada se despediu. Tá bom. Até mais. Som de telefone sendo desligado.

Autor Desconhecido.

Observação: essa estória sempre é contada nos subúrbios brasileiros por alguém que conhece alguém.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Roupinol ou Boa-Noite, Cinderela...

Passei trinta anos preso. Isso foi antes das visitas íntimas, computador doméstico, telefone celular e o cacete a quatro que vocês têm hoje me dia. Quando fui preso o Escadinha ainda não sonhava bater carteira ou Comando Vermelho havia sido fundado. Saí da colônia penal pela porta da frente numa época em que a Lapa ainda era local de malandro decadente, e não parque turístico de playboy. Antes do crack. A gente só fumava uma erva do norte, e o pó era uma novidade no mercado. O chefe da boca tinha um trinta e oito cano longo. Ninguém no morro podia fumar na frente de criança, pois era falta de respeito. Enquanto caminhava em direção a qualquer lugar, eu só pensava numa palavra: mulher. Peguei todas as minhas economias de pequenos serviços prestados à comunidade carcerária, e parei para tomar uns tragos com uma menina da Praça Mauá, vulgo Cinderela, ela parecia aquela menina, Brigitte Bardot. Quando acordei estava nu deitado numa sarjeta da Rua do Ouvidor, e perguntei ao policial: “Cadê a Cinderela?” Ele me respondeu: “Se foi com a carruagem.” Desde então sou conhecido por esse vulgo de Roupinol, e o golpe ficou com a alcunha de Boa-Noite, Cinderela...


terça-feira, 1 de maio de 2012

Ainda Bem Que Eu Sou América!

Eu tava em frente a drogaria esperando a minha mina adquirir algum analgésico. Quando vi uma família toda com camisa do Flamengo. Pai, mãe e filha. Havia um cidadão próximo a mim com a mesma camisa vermelha e preta, e com um riso de cumplicidade para a garotinha. Observei que nesse dia existiam muitos flamenguistas na rua. Quando um gaiato perguntou ao cidadão: o Flamengo jogou ontem? ele respondeu: não. É que o Vasco foi vice de novo, e nós estamos felizes. Ele devolveu: ainda bem que eu sou América!

Um dia desses ao ver o irmão de um amigo surgir na sala perguntei a ele: qual é o teu time? Ele respondeu: o meu time é América. Eu disse: não me lembro desse time, não... Ele irritado me respondeu: ah, mas você lembra sim, você vai lembrar... lembra de quando vocês precisaram de um campo pra treinar ano retrasado? Que vocês tavam sofrendo? Claro que você lembra! 

Na rua ouvi um cara de uma barraquinha de doces gritar para um velhote. Aquele campo lá vai ser leiloado! Ele respondeu: O América não tem dívida não. Quem tem dívida é o Flamengo, o Fluminense, o Botafogo...

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Autor de Periferia é o Cacete!

A gente foi naquela bagaça de debate. E enquanto o apresentador falava ele ficou resmungando ao meu lado. Autor de periferia é o cacete! Autor é autor. Ninguém diz que um autor que nasceu em área nobre é autor de área nobre. Essa porra parece um prêmio de consolação do tipo: ah, que bonitinho! os pretinhos pobres sabem escrever... Eles falam sobre a realidade deles. É só sobre isso que eles sabem escrever. Eu posso escrever sobre a vida de um Extraterrestre se eu quiser. E não é porque a gente é envolvido com rap, que essa é a nossa literatura. O Chico Buarque é autor de MPB? E de mais a mais, o termo periferia no caso do Rio não é adequado, pois a periferia é longe do centro. Ele continuou com aqueles comentários ácidos. E a gente mora no subúrbio, que eles nem sabem definir direito. Uma favela na zona sul do Rio é periferia cara pálida? Toma cuidado com essas definições preconceituosas. O apresentador pigarreou. Ele se calou. E eu fiquei pensando no que ele disse.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

A Cura da Depressão

Eu tenho uma depressão terrível. Mas que já foi pior numa época em que eu dizia: vou me jogar da ponte Rio-Niterói! Ou então dormia e chorava o dia inteiro. Hoje não. Agora eu tomo um remédio chamado Paroxetina. Que é uma espécie de pílula da felicidade. E fumo uma ervinha recomendada por um médico que não quer se identificar. De vez em quando converso com deus. E minha oração sempre começa assim, se o senhor existe, e se está me ouvindo, me dá uma força aí! A depressão é a doença mais justa que existe. Assim como os suicidas têm razão, na opinião de quem vive num lugar equilibrado como esse planeta. Mas sempre que estou deprimido e ansioso, que é o meu estado normal, eu ligo o som e começo a arrumar a casa. Igual a minha falecida mãe fazia, sempre ouvindo Roberto Carlos. E aos poucos vou apaziguando. Pois viver é a coisa mais maravilhosa que existe. Não sei por qual motivo. Então a palavra que eu mais uso no meu dia a dia é: foda-se.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

A Proibição da Cerveja

Eu dei um pinote e caí sentado na Avenida Rio Branco. Quase fui pisoteado pela cavalaria do governo. Nunca vi a Rio Branco tão cheia. Florida. Nem naquela palhaçada de caras pintadas em que imberbe ainda em calças curtas servi de "massa de manobra" a interesses alheios. Mas isso é uma outra história. Eram velhos, crianças e todo tipo de gente que se possa imaginar. O centro da cidade parecia ter de volta os dias de glória da Revolta da Vacina. Os ônibus se encontravam virados. Os trens foram quebrados. Lojas saqueadas. Não restou nem a iluminação pública. Molotov. Lacrimogênio. Pedra. Ninguém entrava no buraco do metrô. E era um mundaréu de gente saindo pronto para atacar qualquer coisa que se movesse, e que direta ou indiretamente estivesse compactuando com a proibição do governo. Os bancos que não fecharam as suas portas foram apedrejados e os cacos eram recolhidos pelo asfalto. Pela primeira vez na vida senti um orgulho intenso de ser brasileiro.  Mais do que na copa do mundo. Agora tudo ia mudar. Nós íamos ter educação, cultura e saúde. Era só isso que eu queria. Nem precisava de segurança. A paz viria depois. Quando o casco da pata de um cavalo ia descer sobre o meu corpo. A minha mina me acordou. Acorda. Tá tendo algum pesadelo?

domingo, 22 de abril de 2012

Professor Idiota

Ela me disse: o meu professor me disse que eu tenho que ler um livro. Eu disse: qual? E ela: o tal Machado de Assis. E eu perguntei: que livro? E ela: O Alienista. E eu pensei no perfil dela. Quinze anos. Só escuta proibidão. Média de leitura de zero livro por ano. Vocabulário "limitado". Ou seja: o português falado pela maioria do povo brasileiro. E mal sabe ler ou escrever apesar de estar num sei em qual série do ensino fundamental. Não que ela não fosse se apaixonar por Machado de Assis. Como eu me apaixonei. Mas esse professor é um idiota ou é o quê?

sábado, 14 de abril de 2012

Guimba, Bituca, Beata e Bagana

A gente tava na Praça Camões. A minha mina sentada num banco. Um frio de cinco abaixo de zero. A gente tava mamando um garrafão de vinho barato. A única coisa que sobrou da crise em Portugal. O único remédio pra que a ossatura não congelasse. Eu assistia o cara enrolar o baseado. A policia do outro lado da rua também. Não senti saudade do Brasil. Quando o vagabundo disse: lá no Rio beata é guimba. Eu disse: é, mas beata é mais estranho que guimba. E o outro: em São Paulo beata é bituca. E continuou: guimba, bituca, beata e bagana, quatro senhoras solteironas...

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Ronald McDonald e a Carne de Cordeiro

Ronald Mcdonald deu uma golada no uísque. E disse: vamo. Pra aturar essas crianças só assim! E andando torto ele desceu a escada. Igual ao Paul McCartney naquele clipe dos Beatles. A criançada logo começou a gritar. Ele ignorou a todas elas. O diretor veio mostrar a folha com a frase. E disse: você só tem que dizer isso. Ronald leu e respondeu: carne de cordeiro, não! O diretor perguntou: você tá louco?! Ele repetiu: carne de cordeiro, não! Isso eu não faço. Coloca outro bicho. Se fosse vaca, boi, qualquer coisa. Mas cordeiro não, pera lá! E tem a lã e aquela coisa toda. O diretor ficou possesso. Os óculos caíram pelo nariz, e o homem gritou: tirem esse maluco daqui! Ronald me chamou: vamo. E nós saímos pela calçada. Ainda olhei pra ele na esperança que a gente fosse voltar. Aquele sonho que eu tinha de conhecer os Estados Unidos se esvaiu por causa de um capricho dele. Um molecote de óculos, de mãos dadas com a mãe, novinha, bonitinha, sorriu para o palhaço. Ronald pegou o seu nariz e enfiou no do menino que ficou feliz. E em contrapartida tomou a Coca-Cola das mãos do miúdo que nem ligou. Ele me deu uma golada. E foi o melhor gole que eu dei na minha vida. Estava um sol bonito, e nós descemos aquela rua do Leblon que te dá uma sensação de que você não está no Brasil. E que pode ser em qualquer lugar do mundo. Inclusive na França. Que eu não conheço, mas que tenho vontade de conhecer.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Quem Comeu a Velha?

Quem comeu a velha? Essa foi à pergunta que o meu tio PM fez na sala. Todo mundo gelou. Era óbvio que ninguém sabia. Ele estava com a pistola na mão. E queria saber quem manteve relações sexuais com a minha avó de oitenta e tantos anos que estava grávida. O meu primo gordinho disse com a voz trêmula: não sei... E me deu uma vontade de rir insuportável. Eu tive que respirar, e olhar para o chão. Mas a risada começava a surgir no estômago. Ele virou para a própria mãe: quem foi mamãe? Fala! E ela: não vou falar, já disse que não falo, eu gosto dele! E o tio: seus filhos da puta, incompetentes! Vocês deixam a avó de vocês, sozinha! Bando de vagabundos maconheiros! A vontade de rir estava aumentando. E eu ficava imaginando se quando a minha vó teve o primeiro filho na primeira metade do século passado, também havia tido esse drama. Quem comeu a velha? Todo mundo tremendo cada vez mais. O tio com a pistola em punho disse indignado: quem é que vai cuidar dessa criança, meu deus! Nessa hora mais risos foram abafados. E eu me lembrei de que quando a minha irmã adolescente ficou grávida, a pergunta foi à mesma. Mas pedi: posso ir fazer xixi? E o riso de todo mundo ameaçou sair. Quando o meu primo gordinho disse: ela ainda pode abortar... Houve um catatau de risos. E foi então que o tio PM se revoltou: eu sou contra o aborto! E começou a disparar para o alto. Não sei como todo mundo conseguiu passar junto por aquela porta tão estreita.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Quando Mataram o Meu Irmão Mais Velho

Eu tava no banheiro mijando. Não aguentava mais esperar na sala. Quando começou a gritaria. Foi insuportável. A mulher gritou muito. Eu ouvi os estalidos secos. E fiquei paralisado lá dentro. Desesperado. De repente ouvi a porta bater, e os passos apressados na escada. Quando consegui sair, o AP tava todo arreganhado. Ela me olhava sentada no assoalho, com um choro agudo, e quase inaudível. Pelo rastro de sangue no quarto em direção à janela, eu já sabia o que havia acontecido. Desci as escadas, e vi o corpo sem vida, com as pessoas olhando em volta. Fui saindo de fininho me arrastando até o ponto de ônibus. E rezando pra ninguém me chamar. E o meu corpo ficou tão pesado, que ainda hoje tenho a impressão que continuo naquele lugar.

terça-feira, 20 de março de 2012

A Invenção de Santos Dumont

Ele tinha uma porção de aviões. Era obcecado por aeronaves. Juninho tinha uma coleção inteira. A mãe dizia: Juninho é louco por aeroplanos... Esse menino vai ser piloto! E todo mundo só dava a invenção de Santos Dumont para o moleque. No aniversário, dia das crianças e natal. Juninho ainda ia fazer cinco anos, e mal sabia falar. Mas era capaz de soletrar o nome de todo modelo que via no céu. Um dia antes de dormir ele perguntou a mãe: cadê a vovó e o vovô?A mãe disse: o avião levou os dois pra casa deles. No dia seguinte, quando Juninho acordou, a primeira coisa que ele fez foi deitar abaixo a estante com a coleção de aviõezinhos. A mãe perguntou: porque você fez isso, meu filho? E ele disse: porque o avião leva embora todo mundo que eu gosto!

terça-feira, 13 de março de 2012

O Escritor

Ele não bebia e não fumava. E nem sabia o que era droga. E também era de um ceticismo fervoroso. Não acreditava em deuses ou demônios. Nem de onde nós viemos ou para onde nós vamos. Nada. Extraterrestre. Sorte. Azar. Destino. Nada. Morreu, acabou. Ele dizia. Um dia contestado, e os sonhos? O quê você acha dos sonhos? Coisas da nossa cabeça. Coincidências. Outro dia ele estava saindo de uma livraria, quando se deparou com dois de seus personagens. Eles eram tão de carne e osso que um deles disse: obrigado por tudo! Ele gelou. E depois se perguntou: porra, será que eu to perturbado? Enquanto se afastava os dois permaneciam lá parados. Ele continuou sem acreditar em deus. Mas passou a acreditar em tudo. E todo mundo deixou de acreditar nele.

sábado, 3 de março de 2012

Pirataria é Crime!

Eu tava ali naquele bar com o cotovelo no balcão. Esperando alguém enquanto a cerveja esquentava. A minha vida é esperar. Quando chegou esse moleque. São os últimos, ele disse. Com todo o respeito, amigo, só pra fechar o dia do vendedor... Ele não deve ter dezoito anos. E eu penso que se tivesse essa lábia era prefeito dessa cidade. Dá pra se ver que é um fodido, mas que “vai se dar bem na vida!”, como dizem. Independente do que isso signifique. Ele mostra uma coleção de filmes que me provocam tédio. Mas alguns DVDs de música interessantes. Quando o dono do bar que limpa o balcão diz: pirataria é crime! E eu fico a me perguntar, embora particularmente não tenha nada contra álcool e a nicotina, porque o dono do bar se sente menos prejudicial que o pirata? E quando um CD do Michel Teló vem parar numa das minhas mãos, ouço o moleque dizer: Pirataria é o crime perfeito!

sábado, 25 de fevereiro de 2012

É um Mentiroso!

Não lembro exatamente quando ele começou mentir. Mas me lembro de ouvir alguém dizer: ta mentindo. No começo pensei que ele tivesse apenas contando uma vantagenzinha. Normal. Então de repente aquilo se tornou uma obsessão. E nessa altura do campeonato as pessoas se perguntavam: porque mente, tanto?! Os amigos ricos e imaginários se multiplicaram em suas estórias. E as beldades também. E se você dizia ter ido a algum lugar. Ele também tinha ido lá. Se você dizia ter feito algo. Ele também havia feito. E alguns diziam: é esquizofrênico! Mas o pai bufava: se fosse maluco não me pedia dinheiro! Até que veio o dia fatal. Ele tava falando com alguém muito importante no celular. Como sempre tava falando com alguém muito importante no celular. Eis que de repente o telefone toca. Toca em seu ouvido. E toda a plateia fica sem graça, por ele. E eu tive a certeza: é um mentiroso!

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Um ou Dois Contos

Eu tava na casa dele. E lá é tudo sujo, jogado e quebrado. Ele mora num buraco e trabalha varrendo aquelas ruas sujas. Do lado de fora existe um armamento pesado de guerra. Crianças, mulheres e homens que vivem no meio do lixo em função do deus crack. E meninas que se prostituem por um ou dois contos. Roubam qualquer coisa. Comem qualquer coisa. E sempre me lembram zumbis sem vontade própria. Quem me levou naquele lugar não interessa mais. E sim a propaganda que fez sobre aquele homem. O barraco parecia uma casa de ópio de tanta fumaça. Eu li parte do meu livro pro homem que ouviu com o olhar mais sereno que já vi. Nunca ouvi um silêncio tão respeitoso. E o riso no canto da boca e dos olhos era de quem tava gostando muito. Todo homem do pensamento é assim igual a você, ele disse. Não entendi a frase, mas senti que era algo maravilhoso vindo de quem vinha. E respondi: tem o lado bom de quase ninguém ter acesso ao que eu escrevo, ou ouvir as minhas músicas; que assim eu posso fazer aquilo que realmente gosto de fazer. Ele disse: é isso aí. Temos que fazer o que deve ser feito. E me olhou como se a gente não tivesse conversando em clichês. Logo assim que entrei naquele ambiente pensei que ele não devia ter nada a me dizer. E ele não me disse quase nada. Mas fiquei com a sensação de ter conhecido um homem sábio. E não entendi aquela serenidade no meio daquele inferno.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Quatro Cervejas Bem Geladas

Eu tava no fundão do ônibus. Vinha meio sonolento nesse calor dos diabos que ta fazendo no Rio. Quando olhei pro lado. Pra fora da janela. Vi aquilo que parecia parte do sonho que tava tendo. Era, ela, mesma. Sentada numa mesa as três da tarde do horário de verão. Nada de anormal. Desci do ônibus puto e corri em direção ao boteco que fica naquela praça perto do hospital. Eu perguntei a ela: que porra, é essa? Ela respondeu: cerveja. Ela tava sozinha. Eu tentei olhar em volta pra ver se existia alguma explicação praquilo. Olhei pro atendente que passou a toalhinha no rosto pra limpar o suor. Ele nem me deu bola. Eu disse a ela: garota, quatro garrafa, já?! E ela: quem é você pra falar? Ela se referia ao baseado encontrado no quarto da minha mina. Eu tava vindo do trabalho, cansado, sujo, suado. Ela tava de camisa da escola. Eu disse: e-a-porra-da-escola? E ela: eu matei aula. E completou: a tua mãe sabe. E grogue repetiu: quem é você pra falar? E passou o batom na boca. Essa situação era pra ser normal. Se ela não tivesse apenas catorze anos. Eu desisti e fui andando por aquela rua da academia.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O Rei do Passinho

Um dia eu fui cantar e tinha um grupo de moleques se apresentando com a dança do passinho. No começo achei aquilo forçação de intelectuais da zona-sul querendo fazer média com o povo. A minha mina falou: nada de diferente, eles só misturam os estilos. Eu falei: verdade. Mas aí surgiu um moleque. Ele dançava, passava a mão na barriga, imitava uma bicha afetada, e sorria pra todo mundo. E todo mundo sorria pra ele. E eu e a minha mina aos poucos fomos quebrando a carapaça, e começamos a sorrir também. Ela disse: legal. Ele sorria pra todo lado, como se aquilo que tava fazendo, fosse à coisa mais maravilhosa do mundo. E era. E ele tava ali no lugar certo, e na hora milimetricamente exata. Era provavelmente um cara que dançava porque a coisa que ele mais gostava de fazer era dançar. E naquele dia deu uma inveja danada da alegria do moleque. Por ele ser realmente O Cara. E por todo mundo gostar realmente dele. E eu nem sabia que ele era tão conhecido assim. Outra vez fui cantar. Ele fechou o evento, mas não fiquei sabendo. Saí antes. Dias depois vi os jornais nas bancas e reconheci a foto do figura. Se você é jovem, negro, e pobre como eu, sabe muito bem que o Brasil é um país perigoso para se viver. Ainda mais pra gente. As estatísticas comprovam isso. Então ninguém mais se choca com esse tipo de coisa, como dizem. Até porque gente como ele, que ninguém conhece, é assassinada aos montes. Mas confesso que quando ouvi aquele funk no YouTube, no dia seguinte, dizendo: já bateu saudade, hein! Porra, maior saudade, maior saudade do Gambá... vi uma lágrima descer no reflexo da tela do computador. Mas isso não deve ter muita importância. Que nem nossas vidas.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

O Segundo Piso do Shopping

Ela olha do segundo piso do shopping. E sabe que o velho com tufos de cabelos nos ouvidos, terno preto, e carteira recheada está à sua espera. Ele e aquele rapaz andrógino que parece não querer estar ali. E que logo, logo, fará coisas às quais parece não querer fazer. Mas que sempre, faz. O carro é longo e preto. Ela lembra do noivo que está em casa, tão doce ao telefone, igual um personagem de uma comédia romântica. E pensa no casamento. Quando a amiga ameaça falar, ela diz: já tô indo.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Preso No Elevador

Ele ouviu um estrondo. Viu o teto desmoronando. E correu pra dentro do elevador pra tentar se proteger. Mas não se lembra de mais nada do que aconteceu. Ele deve ter ficado alguns segundos, desacordado. Então tentou o botão de emergência, e nada. Quando viu uma bota em cima do elevador. Senhor, eu tô aqui no sexto andar! Era um bombeiro que respondeu: amigo, você não tá no sexto andar, não, você tá no primeiro! Quando ele foi retirado do elevador, descobriu que o prédio em que tava havia caído. O homem olhou o cenário de guerra, e foi a primeira vez que alguém agradeceu ter ficado preso num elevador. Ele saiu andando entre os escombros. Ileso.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Dez Por Cento

Eu pego a nota e digo: amigo, tem coisa demais aqui. Ele com aquela cara de tédio, boceja. O quê? Eu digo: esses dez contos, por exemplo? Ele: dos músicos, mas é opcional, se não quiser não paga. Então respondo motivado pela falta de respeito e por meu pãodurismo. Não quero pagar. O outro me diz: eu quero pagar os músicos. Então fico com aquela cara de pão duro. Embora o corporativismo sempre fale mais alto. Tudo bem. Depois pergunto, e esses outros dez contos? Ele diz: é do garçom. Eu me lembro que os taxistas nunca tem troco, e que os garçons e os músicos nem sempre recebem esses dez por cento.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

O Dia De Lixo

Ele chega do trabalho suado. senta no sofá e puxa uma cerveja. O irmão pergunta: como é que tá a rua? Ele responde: cheia de lixo!  Depois pendura a camisa de gari nas costas da cadeira. E percebe que na tevê é um jogo sem importância. Parte do calor desce com o suor do rosto. Ele ouve uma gritaria e vai até a janela pra ver o que é. Não é nada demais. Apenas alguns moleques de férias batendo bola. Um senhora enrugada desce a rua conduzindo, ou sendo conduzida por um poodle tosa e banho. Em uma das mãos ela segura uma sacola. Antes de olhar a lua, ele vê que a velha joga o saco na árvore do vizinho da frente. Ele diz: fiadaputa! É um sussurro para si próprio. E se vira para o irmão e pergunta: esses putos aqui jogam o lixo fora do dia do recolhimento? O irmão não diz nada, como se aquilo não fosse importante, e continua olhando para o jogo. Ele pensa que talvez aquela velha pense que o lixo não é dela. Ou que é algo do qual tenha que se livrar. E que simplesmente não deixar o lixo em sua casa, resolva o problema. Mas ele pensa que aquilo não é só um problema de quem recolhe o lixo. E que talvez ela acredite que há alguma diferença entre a rua e a sua casa. Fiadaputa!

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Ascensorista De Elevador

Ele estava cansado de dizer: sobe e desce. E de subir e descer com gente que não conhecia ou não gostava naquele elevador no prédio público do centro da cidade. Então pensou que talvez apertar um botão fosse um trabalho digno que precisava ser feito. Mas depois disse a si mesmo: conversa fiada! Ninguém precisa de ninguém para apertar um maldito botão. E pensou também que aquela era uma profissão que podia ser exterminada como tantas outras. E por mais que precisasse da grana, se continuasse ali, ele estaria subjugando a sua própria inteligência. E estava cansado de ouvir sobre a rodada de domingo, o tempo, os filhos dos outros; suas esposas, doenças e faculdades.  E resolveu abandonar o posto, antes que a perua pedisse “o décimo!”. Mas ainda deu tempo de dar bom dia ao porteiro, que olhou para o seu rosto sem saber o que dizer. E saiu com as mãos nos bolsos assobiando um tema da novela das nove.