terça-feira, 21 de abril de 2020

A Flor Medicinal...

A tua língua com gosto de éter
Teu jaleco branco que encobre o céu
Teu batom vermelho da cor do suéter
E você me dizendo que estou num hotel

O sangue que corre nas minhas veias
O fluxo de pensamento das tuas teias
As vias expressas do meu corpo
A maca da tua cama que incendeia

Pitada de sal na sopa
Me dá o veneno na boca
Respingando na roupa

Oh! Minha flor medicinal
Quem me dera passar passando mal
Para no final morrer com o teu beijo
Deitado em teu leito de hospital

Eu que sinto dor e não sofro
Porque o sumo escorre do corpo
O soro que evita o último sopro
Se não for o teu gozo eu estou morto

É você a plantonista louca
Eu quero mais da tua saliva
Que me fez viajar no coma
E que tem me inspirado lida

Pitada de sal na sopa
Me dá o teu veneno na boca
Respingando na roupa

Oh! Minha flor medicinal
Quem me dera passar passando mal
Para no final morrer com teu beijo
Deitado em teu leito de hospital

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Corrida de Chapinha...

Num sei se você lembra do cinema poeirinha
Ou da minha escola Santa Terezinha
Num sei se você lembra do nosso pique bandeira
Como se faz rabiola ou então atiradeira

Num sei se você lembra como é que pega rã
Ou como se faz um carrinho de rolimã
Lembra do hi-fi da festinha americana
Ou de como se começa uma nova gincana

É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Hoje a criança brinca com o computador
É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Mas é que às vezes é tão bom lembrar do tempo que passou

Num sei se você lembra da corrida de chapinha
Ou como se faz uma caixa de bombinha
Num sei se você lembra como se faz garrafão
Do recorde do Enduro ou do carrinho de fricção

Num sei se você lembra da capa de bate-bola
Quem ficava de gelo ou ficava de gaiola
Num sei se você lembra como se joga carniça
Ou do Recreio no Ariosto macarrão com salsicha

É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Hoje a criança brinca com o computador
É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Mas é que às vezes é tão bom lembrar o que passou

A Modernidade Cinematográfica Presente em À Bout de Souffle de Jean-Luc Godard...

Índice


3. Modernidade Cinematográfica

3.1 Renovação Geracional

3.2 Independência Industrial

3.3 O Filme Como Obra Aberta

3.4 Reivindicação do Diretor Como Autor

3.5 Ideologia e Moral

3.6 A Cooperação do Espectador

3.7 Novas Tecnologias

4. As Temáticas dos Novos Filmes dos Anos Sessenta

4.1 Temática Pessoal Individual

4.2 A Infância

4.3 Mitologia Sobre a Juventude

4.4 Questionamento da Família

4.5 Instituições Educativas

4.6 Aprendizagem Sentimental e Sexual

4.7 Relações Entre Pares

4.8 O Filme Dentro do Filme

4.9 Considerações Finais

5.0 Bibliografia


3. Modernidade Cinematográfica


3.1 Renovação Geracional

Usando como base o capítulo 17, La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega, publicada pela Alianza Editorial, é possível perceber que o autor de À Bout de Souflle, Jean-Luc Godard, pode ser enquadrado no que Noriega chama de Renovação Geracional. Pois Godard, realizador pertencente a Nouvelle Vague francesa, também não frequentou a escola de cinema.
Nuevos cineastas se han forma viendo mucho cine en las sesiones de las filmotecas y escribiendo críticas y ensayos.” (Noriega, p.264). Segundo Jacques Mandelbaum: “… ele passa mais tempo nos cineclubes e na Cinemateca Francesa, chumbando no exame de acesso da Escola de Cinema, o IDHEC.” (Mandelbaum, 2018, p. 11).
Godard escrevia para Cahiers du Cinéma, revista fundada por André Bazin, e que possuía em seus quadros; Claude Chabrol, François Truffaut, e Jacques Rivette, críticos que se tornariam fundadores da Nouvelle Vague. Da mesma forma que os neo-realistas italianos romperam com o cinema fascista, os membros da Nouvelle Vague iriam ao encontro de um novo cinema que representasse suas ambições, e não aquele dos seus predecessores que imperava em França. Ao contrário do Novo Cinema alemão; que lutaria por um cinema que fosse uma alternativa ao cinema americano, Godard e os seus compatriotas, buscavam em seu país, um cinema que fosse menos intelectual, e que não recusasse os autores americanos. Humphrey Bogart é uma inspiração para à personagem Michel de À Bout de Souflle, que repete o seu gesto de passar os dedos nos lábios enquanto persegue Patricia, a menina americana. Assim como o filme faz reverência ao cinema noir americano, reconhecido como estilo em França primeiro.

3.1 Independência Industrial

17 de Agosto de 1959 marca o primeiro dia de rodagem, que ficam concluídas a 19 de Setembro, mas que envolveram apenas 20 dias úteis, o que revela o respeito muito relativo do realizador pelo seu plano de trabalho. Um orçamento de um terço do que era prática na altura, uma equipa reduzida…” (Jacques Mandelbaum, p.17).
À Bout de Souflle foi rodado da mesma forma que alguns clássicos do cinema Neo-Realista. Assim como De Sica, em Ladri di Biciclette, ou Luchino Visconti em seu La Terra Trema. Câmera na mão e equipe reduzida. “Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça…” viria a ser o lema do Cinema Novo brasileiro. Em O Bandido da Luz Vermelha de Rogério Sganzerla, filme do movimento sul-americano, fica evidente a influência de À Bout de Souflle.
“(..) Y de directores-productores que frecuentemente financian sus películas con capitales familiares.” (Noriega, p. 264).
Visconti vendeu móveis de sua família para filmar La Terra Trema. O Novo Cinema alemão viria a defender o associativismo e o financiamento alternativo.
Sin embargo, los nuevos cines, salvo excepciones, no interesaron al público, y tuvieran malos resultados en la taquilla.” (Noriega, p. 264).
Os realizadores não tinham como distribuir os seus filmes e divulgar com a mesma intensidade do cinema americano. Da mesma forma que o Neo-Realismo italiano não teve um grande público, eles também sobreviviam dos cineclubes e festivais de cinema. Como foi o caso de À Bout de Souflle, ganhador em 1960 do prêmio Jean-Vigo de Melhor Realizador do Festival Internacional do Filme de Berlim.

3.2 O Filme Como Obra Aberta

Por ello se rechaza el relato novelesco de argumento muy trabado, con personajes definidos y una secuenciación rigurosamente causal; por el contrario, el guión es un apunte abierto a la improvisación y al hallazgo en el proceso de rodaje y de montaje. Hay una nueva aproximación a los textos literarios que son adaptados de modo creativo, sin el academicismo que imperaba en el cine comercial.” (Noriega, p. 265).

À Bout de Souflle é baseado num argumento de François Truffaut, de onde o seu realizador extraiu apenas o fio condutor da história. As filmagens foram improvisadas com Godard dizendo as falas para os atores. A base do filme é o improviso. Assim como fez Luchino Visconti em seu La Terra Trema, em que escrevia os diálogos durante a rodagem, do filme inspirado no livro I Malavoglia, de Giovanni Verga, que seria um documentário, e acabou por se tornar uma longa-metragem de ficção.

3.3 Reivindicação do Diretor Como Autor

“La Cámara como médio de expresión, la mirada a la realidad propia del cinéfilo”, “… se oponen al modo de significación del cine clásico – la transparencia narrativa y el montaje invisible.”, “… el salto de eje e la ausencia de raccord.” (Noriega, p. 265)
Godard é um cinéfilo que se fez autor. É possível ver a sua marca em À Bout de Souflle, filme que ficou conhecido pelo uso que fez do jump cut, e por sua ausência de raccord. É notória à assinatura do cineasta na montagem. Mesmo nos diálogos do casal Michel e Patricia, existem perguntas que ficam sem respostas, e frases que não são concluídas. No filme Câncer de Glauber Rocha; do Cinema Novo brasileiro, o público percebe até mesmo um microfone.

3.4 Ideologia e Moral

En los nuevos cines hay un rechazo del didactismo ideológico propio del cine que expone metáforas políticas o plasma héroes positivos; pero ello es compatible con el compromiso ideológico y el cine mititante de signo anticapitalista y liberador-iszquierdista…” (Noriega, p. 265).

Godard utiliza um anti-herói de filme noir com o seu passado sombrio e sua femme fatale. Como um boxeur de filme noir, Michel dá socos no ar, mas é apenas marginal. Um ladrão contumaz que vive de roubos que pratica a todo o momento. Está preocupado apenas com o presente. Patricia por sua vez sofre com os seus dramas existenciais, fala sobre a morte e a velhice. Parece um personagem existencialista de Camus ou Sartre que estavam em voga nos anos sessenta. Assim como Maria Braun do alemão Fassbinder, estes personagens pairam entre o certo e o errado de acordo com as suas necessidades. Estão afundados num mundo cruel, e não por culpa própria. Eles reagem ao que à sociedade lhes oferece. Godard está próximo dos neo-realistas que romperam com a mitologia nacionalista e o heroísmo guerreiro. Da mesma forma que os personagens de Rio 40 Graus de cinquenta e cinco, obra considerada precursora do Cinema Novo brasileiro, e os marginalizados de Glauber Rocha de Deus e o Diabo na Terra do Sol.

3.5 A Cooperação do Espectador

“… la construcción de un nuevo espectador, más colaborador con el texto fílmico, ante el cual ha de reflexionar para hacer su propria exégesis.” (Noriega, p265).

O novo espectador do cinema é como o novo cineasta. Ele lê revistas especializadas em cinema e frequenta cineclubes. Godard e Glauber Rocha escrevem e pensam sobre cinema antes de produzirem suas obras de estreia. Este novo público, pensa o cinema, e não se importa que ele siga outro caminho para além daquele trilhado pelo cinema clássico. Os novos cinemas têm muitos finais abertos, dos quais os seus espectadores podem chegar às próprias conclusões. Um dos exemplos é Roma Città Aperta, de Roberto Rosselini. É um público aberto a novas experiências estéticas, como aquelas que foram vistas na montagem de À Bout de Souflle.

3.7 Novas Tecnologias

“Un factor importante en el surgimiento de los nuevos cines es la evolución de la tecnología con las cámaras ligeras y la toma de sonido direto.” (Noriega, p265).

Da mesma forma que o Neo-Realismo italiano , a Nouvelle Vague francesa beneficiou-se com as novas tecnologias do som direto e da câmera portátil.

“Travelling feito a partir de uma cadeira de rodas, a transformação de uma película cinematográfica ultra-sensível, a câmara escondida num triciclo de um carteiro e um excelente conhecimento do terreno.” Página 20. Jacques Maldebaum Sobre À Bout de Souflle.

4. As Temáticas dos Novos Filmes dos Anos Sessenta

A partir de um enquadramento temático de José Enrique Monterde que Noriega Cita, podemos mostrar À Bout de Souflle se relaciona com determinadas temáticas.

4.1 Temática Pessoal Individual

Protagonizados frecuentemente por antihéroes y seres más o menos marginados en busca de su identidade.” (Noriega p. 268)

Michel é o anti-herói e Patricia busca por sua identidade. A sua indecisão é notória em seu discurso existencial, ela contesta a si mesma: “ Não sei se sou triste porque não sou livre. Ou se não sou livre porque sou triste.” Patricia não sabe se gosta de Michel. Se quer ficar com ele. Ela não tem convicção sobre que rumo dar a sua vida. Mesmo de entregar Michel para à polícia, ela parece se arrepender.

4.2 A Infância

“Y en la que se encuentran claves de la identidad del sujeito…” (Noriega, p.268)

Das personagens de À Bout de Souflle vemos apenas Michel relembrar a infância ao falar de um passeio com um avô, e do seu pai que seria clarinetista. Diz isto quando Patricia põe um disco. Mas pelo tom de mitificação com que ele fala do pai, não fica claro se é sério, ou se é apenas mais uma troça sua. Michel ao passar por uma praça, diz num tom de saudade que é o lugar onde nasceu, e que construíram prédios e estragaram tudo por ali.

4.3 Mitologia Sobre a Juventude

La incorporación de la juventud a la vida social, laboral y de consumo en marco del desarrolismo de los años sesenta…” (Noriega, p.268)

Patricia é um exemplo do ápice de uma cultura juvenil que teve o seu marco nos anos sessenta. Sendo iniciada décadas antes. Ela tem vinte anos e mora sozinha em outro país. E todo o seu estilo de vida corresponde ao de muitos adolescentes da sua época, que adquiriram uma forma própria de viver através da cultura, da moda, e de um estilo de vida identificado com sua geração.

4.4 Questionamento da Família

“En general hay una crítica al autoritarismo y a las incomprensiones de la família que han llevado a diversos traumas.” Noriega, p.268)

Nesta temática À Bout de Souflle não se enquadra. Pois os personagens são muito evasivos sobre o passado. O filme é um recorte de um momento de suas vidas. Num muro está escrito: “Viver perigosamente até o fim.” É isto que Michel faz quando recusa fugir. O único comentário concreto sobre o passado é quando Patricia lê no jornal que ele era casado. Michel diz que abandonou a mulher pois era louca. Não sabemos se ela é a mulher que aparece na primeira cena do filme, que ajuda Michel a roubar um carro, e que pergunta se pode ir com ele. Michel diz que não. Logo após matar o policial Michel vai ao apartamento de uma menina a quem pede dinheiro. E ao contar uma história de que trabalhava em Roma nos estúdios Cinécittà, ela pergunta se na verdade ele não era gigolô. Quando Michel vai ao apartamento de Patricia, ele procura por dinheiro, e não encontrando faz um comentário que mulheres novas nunca têm dinheiro. Quando uma menina tenta vender a ele um exemplar da Cahiers du Cinéma, e pergunta se Michel gosta da juventude, ele responde que não, que prefere as velhas. Não podemos dizer categoricamente que estes fatos estejam relacionados, e que Michel explorasse a esposa, e que esta era mais velha. Mas é uma possibilidade. Esta mulher que não conhecemos é a única informação real da vida pregressa da personagem.

4.5 Instituições Educativas

“Las peliculas sobre colegios, internados os reformados que subrayan o autoritarismo…” (Noriega, p.268)

Outra temática que não é explorada em À Bout de Souflle, mas que está fortemente presente no filme de François Truffaut, outro membro da Nouvelle Vague, que escreveu o argumento de À Bout de Souflle, Les 400 Coups, onde o personagem principal, Antoine Doinel se revolta contra uma dessas instituições.

4.6 Aprendizagem Sentimental e Sexual

“En el desequilíbrio afectivo y en la iniciación sexual…” (Noriega, p.268)

Patricia não sabe que caminho seguir tanto em sua vida sexual quanto afetiva. Ainda sente muitas dúvidas. Mesmo em relação a Michel. Tem horas que diz querer ficar com ele, depois se afasta. Quando eles conversam em seu quarto, ela diz querer viver com ele como Romeu e Julieta. Da mesma forma que pergunta porque ele está atrás dela, ou conta que saiu com o repórter. Ela vive a dualidade. Entrega Michel à polícia, mas corre atrás dele como quem teme que aconteça algo ruim com o parceiro.

4.7 Relações Entre Pares

“El adulterio y los tíos amorosos aparecen con un tratamiento renovador, alejado de los postulados dramáticos del cine clásico.”  (Noriega, P.268)

O casal de À Bout de Souflle representa a libertação sexual ocorrida nos anos sessenta por parte da juventude. Patricia vê o sexo de maneira prática, Michel também. Eles não escondem um do outro que têm outros parceiros. Michel fala o tempo todo das suas preferências sobre mulheres. Ele pergunta a ela sobre o jornalista, mas tudo sem alarde, sem dramas ou cenas de ciúmes. O filme é um marco daquela geração por representar o comportamento vigente e longe de julgamentos. Ela é livre e usa o seu corpo como bem entende e não dá espaço para que Michel cobre isto dela, e ele também não parece ter esta pretensão. Michel diz abertamente querer dormir com Patricia, e em nenhum momento ela o recrimina por isto. Eles contam um para o outro o número de parceiros sexuais que tiveram.

4.8 O Filme Dentro do Filme

Reflexiones y la significación fílmicas y homenajes a los géneros.”  (Noriega, p. 269)

À Bout de Souflle exalta o estilo noir. Existe a obsessão da personagem em ir para a Itália, que deu a Nouvelle Vague o Neorrealismo. Uma inspiração com os seus cenários naturais, a sua câmera na mão, o filmar na rua, a inclinação documental, e os seus atores naturais. Tudo isto está em maior ou menor grau em À Bout de Souflle. A menina que Michel visita diz que trabalhava num estúdio de cinema. Michel diz que trabalhou nos estúdios da Cinécittà em Roma. Ele vê um cartaz do filme The Harder They Fall, um filme noir com o seu ídolo Humphrey Bogart, e que fala sobre boxe. Michel diz para Patricia que não é bonito, mas é um boxeur. E ainda é possível ver ao fundo, numa das cenas, um letreiro que anuncia Hiroshima Mon Amour de Alain Resnais.

4.9 Considerações Finais
O autor José Enrique Monterde, citado por José Carlos Sánches Noriega, aborda outras três temáticas que não serão exploradas no presente artigo, por entendermos que não são questões presentes na obra À Bout de Souflle de Jean-Luc Godard. São elas: Contexto Político, Revisão do Passado Histórico, e Debate Ideológico.

5.0 Bibliografia

17. La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega (263-269)
Cinema Contemporâneo: Román Gubern, 1980. Salvat Editora do Brasil
Jacques Mandelbaum Coleção Grandes Realizadores, Cahiers du Cinéma, Edição exclusiva para o Jornal Público, 2018.
Luchino Visconti: Alain Sanzio / Louis Thirard, 1988. Publicações Dom Quixote
Luchino Visconti: Clareta Tonetti, 1983. Columbus Film

Porque a Poeisa na Música Popular Brasileira Acabou...

Antes da bossa-nova qualquer um que tivesse acesso aos músicos e cantores podia compor letras que eram vendidas, compradas, ou assimiladas em lugares como à casa da Tia Ciata, o ponto dos músicos na Praça Tiradentes, no Café Nice, e etc. Em épocas diferentes é claro. No final do século dezenove e início do vinte, o brasileiro tinha à mania dos versos, como é dito no livro O Rio de Janeiro Do Meu Tempo de Luís Edmundo. Olavo Bilac era reconhecido na Rua do Ouvidor. Assediado por senhoritas. Era o que hoje podemos dizer de famoso. Um poeta. Os cantores lançavam uma ou duas músicas na época do carnaval, por exemplo. Não gravavam discos com uma quantidade grande de músicas. Existia o profissional letrista de música, e alguns não tocavam nenhum instrumento. João de Barro é um deles. A música popular perdeu muito com o letrista sendo deixado de lado. Existiam algumas besteiras, mas boa parte eram ótimas. Basta lembrar Cartola, Noel Rosa, Geraldo Pereira, Wilson Batista, e… Ainda não existia o cantor profissional personalista que compõe às suas próprias músicas e ganha muito dinheiro com os direitos autorais. Depois de João Gilberto, embora tenha ficado mais fácil ser cantor, pois não era mais preciso ter aquele vozeirão de longo alcance, mesmo por conta da evolução tecnológica, a poesia da música popular brasileira pode-se dizer que chegou ao ápice de sua exigência com os compositores Caetano Veloso e Chico Buarque. Mas com o vaivém do mercado e o grande glamour, infelizmente, a figura do letrista foi pouco a pouco abandonada, e o acesso aos cantores ficou mais difícil. Ainda existem registros do apenas letrista nos anos oitenta, mas já pessoas ligadas intimamente ao mercado da música. O jornalista Nelson Motta pode ser citado. Com as novas tecnologias, o progressivo desmantelamento da educação no Brasil, e a voracidade da indústria, os letristas foram praticamente abandonados. Hoje na maior parte dos casos, quando alguém compõe, mas não aparece, já faz parte dos bastidores. Não é porque o cantor procura por autores e boas músicas, como fazia Bezerra da Silva que ia com o seu gravador aos morros, e gravava às composições para depois fazer uma seleção. Zeca Pagodinho é outro que tem por hábito gravar músicas de muitas pessoas, e a prova é o impacto de sua carreira. Sempre existiram bobagens na música. Mas essas besteiras hoje dominam às rádios, os estúdios de televisão, gravadoras e porque não dizer home.studios. Eu ouvi da boca de um cantor famoso num debate, que se ele tivesse de gravar música de alguém, ele gravaria dos seus amigos. E de outro, que os direitos autorais rendiam a ele um bom dinheiro. Concluí que por isto ele gravaria apenas músicas de sua própria composição, independente do impacto que a música de outro compositor pudesse produzir. Talvez por isso os últimos bons letristas da música popular brasileira tenham surgido até o final dos anos oitenta. Com algumas exceções no início dos noventa, como Mano Brown e Chico Science. Os melhores que existem vem daquela época ou de antes. Independente de estilo. É por isso que a poesia na música popular brasileira acabou.

domingo, 19 de abril de 2020

Qual Bergman?

Existe quadro ao qual eu paro em frente no museu e fico olhando o tempo todo para ele. Às vezes nem sei porque gosto do quadro, mas sei que gosto muito de um quadro, quando sinto vontade de entrar nele… Foi essa sensação que tive diante da fotografia da Sonata de Outono. A linda e talentosa Ingrid Bergman e à implacável Liv Ullman com os seus olhos de feitiço. A fotografia desta longa é tão impressionante quanto à de Persona, outro filme de Bergman. Em Sonata de Outono a filha é conservadora. A liberdade está com a mãe ousada. Uma artista que se dedica integralmente à sua arte e segue o seu caminho. Não importa quais obstáculos ela tenha de ultrapassar ou a quem vá magoar para fazer o que quer e executar a sua música. Charlotte é cruel ao cobrar a filha Eva que toca na paróquia, para que toque corretamente. Enquanto Eva olha para ela com um olhar entre admiração e medo. Mas o artista que sacrifica tudo pela sua arte, é quem senão o próprio Bergman? Que se dizia melhor como artista do que como homem. E dizia saber mais ou menos as idades dos seus filhos. O psicólogo canadense Jordan Peterson diz que alguém para chegar a excelência em seu trabalho, inevitavelmente irá negligenciar outros aspectos de sua vida. Um workaholic que sofria de forte ansiedade. As pernas tremiam segundo disse em uma entrevista. Quem sabe através da sua arte Bergman quisesse fugir do passado sombrio ao lado do pai pastor rígido, religioso igual Eva. E que se chamava Erik, o mesmo nome do filho morto do casal no filme. O irmão de Bergman apareceu para dizer que na verdade era ele o abusado pelo pai. O protegido seria Bergman. Na época o diretor proibiu à entrevista de vir a público. Eva cuida da irmã incapaz que foi abandonada por Charlotte que traiu e abandonou o marido. Viktor, marido de Eva, é o amigo companheiro que cuida da esposa a quem dá um amor incondicional. Bergman foi casado com Liv Ullman, Ingrid Bergman e Käbi Laretei, que é quem realmente toca o piano do filme. Eu vi à foto de Bergman na capa do livro que Charlotte lê antes de dormir, e que conta a filha ser um escritor ruim e apaixonado por ela, paixão que ela rejeita. Fellini dizia que filmava os seus sonhos e a sua realidade à qual fantasiava. John Lennon ao ser perguntado sobre a compra de uma casa luxuosa, se aquilo não caía em contradição com a letra de Imagine, ele respondeu, Imagine é só uma música. Talvez Sonata de Outono seja apenas um filme para Bergman. Ingmar dizia que filmava a si próprio. Talvez Bergman esteja apenas jogando com os significados. Mas, qual Bergman?

Bonecas Infláveis...

Eu tenho roupa de marca que entra e saí de moda
Eu tenho carro do ano enquanto dura aquele ano
Eu conheço uma música que toca um instante
E tem um livro lá em casa que nunca saiu da estante

Tenho amigos virtuais
Produtos descartáveis
Amantes irreais
Bonecas infláveis

Tem gente que eu conheço que é uma voz no telefone
Eu só converso com o porteiro se for pelo interfone
Eu durmo de noite eu vivo de dia
Eu amo uma linda, uma linda mulher vazia

Tenho amigos virtuais
Produtos descartáveis
Amantes irreais
Bonecas infláveis

sábado, 18 de abril de 2020

Chuva Ácida...

Eu pensei que fosse ter uma noite plácida
Mas essa mulher é uma chuva ácida
Ela rasga tudo o que eu penso em escrever
O tipo de nuvem que não deixa o sol nascer

Eu queria levar uma vida prática
Mas essa mulher é uma chuva ácida
Que me mostrou o caminho da solidão
E o quanto faz falta uma cama e um colchão

E quando os teus pingos começam a cair
Eu pego o meu guarda chuva e me apronto para sair
Mas é justamente quando para de chover
Que o meu peito começa a doer

Eu pensei que fosse evitar as lágrimas
Mas essa mulher é uma chuva ácida
Do tipo que age com o tempo
E que é ajudada pela ação do vento

Eu pensei que fosse ver o mundo quente das máquinas
Mas essa mulher é uma chuva ácida
Que provoca toda sua erosão
E tem gotas que são como larvas de vulcão

E quando os seus pingos começam a cair
Eu pego meu guarda chuva e me apronto para sair
Mas é justamente quando para de chover
Que o meu peito começa a doer

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Não Me Diz Respeito...

O que a minha ex-namorada tem postado ao meu respeito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito
O que o meu amigo do peito tem dito ao meu respeito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito
O que o senhor prefeito, declarou ao meu respeito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito.
O que aquele sujeito, escreveu ao meu respeito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito
Mesmo que digam tudo,
Tudo o que for de direito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito
E se falam mal de mim, e reclamam desse meu jeito
Eu sinto muito, mas não me diz respeito
Não me diz respeito,
Não me diz respeito,
É que simplesmente,
Não me diz respeito

quarta-feira, 15 de abril de 2020

A Fuga de Alcatraz!

Eu falo demais, penso demais, falo demais.
Às vezes falam tanto como palavras em jornais
Eu penso demais, falo demais, penso demais
Às vezes penso tanto que penso não ser capaz
Eu falo demais, penso demais, falo demais
Às vezes falo tanto mais do que dizem os anais
Eu falo demais, penso demais, falo demais
Que às vezes desejo que a minha língua,
Fuja da minha boca,
Como numa fuga de Alcatraz!

terça-feira, 14 de abril de 2020

Deus ex machina…

ele é a alvorada dos tempos
ele é o deus Saturno
ele é o sinal dos tempos
ele é o deus Netuno
ele é o Outono
ele é o Inverno
ele é o céu
ele é o inferno

ele é Marte
ele é a guerra
ele é a paz
ele é a terra

ele é o deus dos mares
o deus dos raios e dos trovões
ele é o deus dos céus
o deus dos homens e dos dragões
ele aponta os lados
as estrela e as constelações
ele é o rei dos altares
dos homens e dos leões...

segunda-feira, 13 de abril de 2020

O Acossado de Jean-Luc Godard...


O Acossado
é um sampler de rap. Um groove de funk. Uma frase de jazz que se repete. Assim como o gesto de Humphrey Bogart nos lábios de Jean Paul Belmondo; os cigarros que Michel fuma insistentemente acendendo uns nos outros ou as perguntas que Patricia faz sobre o significado das palavras em francês. O Acossado é um jump cut sem raccord. Nem mesmo os diálogos na boca dos personagens são finalizados. Eles pulam de um assunto para o outro. Algumas vezes nem concluem o que disseram. O Acossado é uma colagem. Ali é possível ver o Dziga Vertov. O cinema clássico americano. O cinema noir percebido primeiramente em França com o seu anti-herói de passado obscuro, e sua femme fatale. Embora Patricia se pareça mais com as adolescentes entediadas de Salinger. Tédio que aliás protagoniza ao dizer que não sabe se é triste por não ser livre ou se não é livre por ser triste. É o existencialismo da sua geração apoiada por Sartre e Camus. Com vinte anos divaga sobre morte e velhice. Com a sua morte precoce a atriz Jean Seberg parece ter cumprido o destino de Patricia. Dizem que perseguida pelo FBI assim como Michel perseguido pela polícia francesa. Morreu cedo e disse que não foi feliz no amor. Eles têm muito da geração perdida dos Fitzgerald`s. Dos Kerouac´s. Como Martin Scorsese disse: é beat demais! O Acossado é um clichê. Um pastiche. Não é um plágio. Cumpre o seu papel de reinventar a partir da tradição. Não é uma ruptura total. Godard exalta o passado ao criar o novo. Não teme o antigo. Michel é desengonçado. Um herói magrelo. Ele não é o galã que sonha ser. Tanto é que um de seus pares diz a ele que meia de seda não combina com casaco de tweed. Assim como Carmen Miranda, Godard não temeu voltar americanizado. Ele desconstruiu para reconstruir Hollywood. Caetano Veloso canta sobre a vontade “fela da puta” de Raul Seixas de ser americano. Michel vai realizar o seu sonho, se Patricia, a menina americana, ficar com ele. E se junto eles forem para a Itália. É lá que está a felicidade. A felicidade sempre está em outro lugar. Michel é a personificação universal do malandro; num momento representada pelo capoeira carioca do século dezenove, no outro pelo compositor de tango do Rio da Prata, e até por Barry Lyndon na literatura. Patricia é o retrato da geração que foi emancipada por um trabalho longo de outras gerações e que percebeu como é chato crescer, pois nem sempre sabemos o que fazer com a liberdade. Michel quer Patricia. Mas ele diz que ela é igual as outras. Passa a mão em sua bunda. Leva tapas. Quer dormir com ela. Pula de uma mulher para outra. Michel avalia as suecas, italianas e brasileiras. Levanta a saia de uma mulher na calçada porque Patricia chamou as francesas de putas por usarem saias curtas. E diz que as mulheres não gostam de quem gosta delas. O romancista Parvulesco diz que existem duas coisas vitais no mundo: “para os homens são as mulheres, e para elas, o dinheiro.” Patricia não tem certeza se quer ficar com Michel. Não dá garantia nenhuma. Quer algo como Romeu e Julieta, ela diz. Patricia é da geração que vai desembocar no maio de sessenta e oito. O Acossado é cheio de referências à cultura de massas. À cultura pop. Marcas de cigarros. De carros. Grifes. Cartazes de cinema. Letreiros eletrônicos. Músicas. Nomes. Pessoas famosas. Jornais. Pinturas. É um filme entulhado de referências comerciais. Assim como o Homem da Câmera de Filmar, O Acossado é o prenúncio dessa linguagem videoclipe popularizada anos depois na capa do Sgt Pepper`s e fincada de vez nos anos oitenta. É a explosão visual da sociedade de consumo. E sobrevive porque ao mesmo tempo é a negação de tudo isso. Os transeuntes observam as cenas a serem filmadas. Aparecem no filme como curiosos. Longe daquele um bilhão de figurantes de Hollywood. E distante do neorrealismo onde tudo era ensaiado com não-atores. Embora Godard filme em locais públicos, assim como os influentes neorrealistas ensinaram aos da Nouvelle Vague. A câmera na mão é um trabalho artesanal. Mesmo na cena em que Michel leva um tiro as pessoas andam como se nada estivesse acontecendo. É a representação da apatia. As dificuldades e os poucos recursos parecem ter ajudado Godard na representação do filme. Hoje ele é um oásis no meio de tanta informação perfeita, de tantas máquinas infalíveis, de tanta gente fazendo tanta coisa certinha, da fotografia no lugar certo, das cores berrantes e lindas que cansam os olhos e a própria beleza. O Acossado sobrevive. Pois através do simples foi capaz de representar o sublime. E de ser o três por quatro de uma geração que previu o futuro, mas que debochou dele, assim como fez piada com o passado.


Bibliografia

17. La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega (263-269) 
Jacques Mandelbaum Coleção Grandes Realizadores, Cahiers du Cinéma, Edição exclusiva para o Jornal Público, 2018.

sábado, 11 de abril de 2020

Bolsonaro e a Revolta da Vacina...

A maior parte da população brasileira apoia Bolsonaro. Tarefa árdua encontrar uma segunda opinião. Com excessão de alguns meios de comunicação que se comportam dignamente neste episódio do Coronavírus, os outros não querem se indispor com o governo, por algum motivo que desconhecemos, nem com à maioria do povo, talvez por causa da audiência. Mesmo no YouTube os vídeos a favor do louco, vencem com tranquilidade. A roubalheira do Lula e do PT fortaleceram o monstro Bolsonaro. Agora, como aconteceu no episódio da Revolta da Vacina em 1904, pois tomar à vacina, tornou-se uma briga moral, iam pegar no braço das mulheres, seriam obrigados, liberdade, fake news, blábláblá, e manipulação política. Foi preciso morrer muita gente para que o povo começasse a tomar à vacina. Os dois acontecimentos são muito parecidos. O triste deste episódio, é que assim como aconteceu com o PT, que é apoiado pela massa da intelligentsia brasileira em seu fanatismo, eu tenho certeza que os bolsonaristas, pensam como Bolsonaro, e acreditam em suas diretrizes. Ou você acha que governos totalitários são construídos por um homem só? É muito dificíl acreditar que todos sejam vítimas da falta de educação, e cultura, e não do seu próprio ódio.

sábado, 4 de abril de 2020

Ladrões de Bicicletas...

Antonio Ricci é um trabalhador da classe operária que se encontra há dois anos desempregado na Itália do pós-guerra. Roma segue arrasada. Existe uma vaga de emprego como colador de cartazes da prefeitura. Mas para a vaga é necessário que se possua uma bicicleta. No início ele pestaneja e diz ao empregador que não tem o meio de transporte. Mas ao se dar conta da situação muda o que acabou de dizer.
Ele tinha uma bicicleta que estava na casa de penhores. Aquele trabalho significa tudo para Antonio. É a salvação da sua família. Ele está obstinado e diz ao homem que não pode esperar tanto tempo novamente.
Ao encontrar com Maria, Antonio conta a ela sobre a situação em que se vê envolvido. Na manhã seguinte terá de apresentar-se no trabalho. A mulher toma uma decisão. Puxa os lençóis da cama e os outros que eles têm guardados e que nem foram usados. E diz a ele que irão trocá-los no penhor.
Conseguem recuperar a bicicleta no prego. A alegria do filho Bruno não é menor que a do casal. Ele é apenas uma criança e já tem o seu trabalho regular. Com todo o empenho o menino ajuda o pai a preparar e limpar a bicicleta para o dia seguinte.
Feliz da vida Antonio apresenta-se no emprego. Mas ao colar um cartaz do filme Gilda com Rita Rayworth, a bicicleta que estava encostada é roubada. Antonio corre atrás do homem, mas não consegue alcançá-lo em sua corrida.
A partir daí, Antonio e seu filho vão em busca da bicicleta, na Roma abatida após o conflito, parece ser impossível sobreviver para pessoas como as que pertencem à família Ricci.
Bruno trabalha como um adulto. Se movimenta como um homem, e as suas preocupações estão longe de ser enquadradas como infantis. Pode ser encarado como parte da infância de uma época distante. Mas também, como meninos e meninas da atualidade, que em algumas cidades do mundo ainda trabalham nas ruas. Aqui não existem os culpados, ricos ou poderosos. Apenas os pobres.
Além do empregador da prefeitura, o poder público é representado pela presença de policiais. Antonio diz a um deles, você não sabe o que essa bicicleta representa para mim. Ele é recebido na delegacia por um homem que fica furioso por alguém pedir que procurem uma bicicleta. Eles têm mais o que fazer. Percebemos o quanto é comum o roubo das bicicletas. Existem ruas com feiras onde os ladrões vendem as suas peças. Se a polícia for sair em busca de todas as bicicletas que foram roubadas fará apenas isto.
Antonio persegue um velho que conversou com o rapaz que roubou a sua bicicleta. Adentra uma igreja onde é servida sopa e onde cortam o cabelo e a barba das pessoas, mediante a participação na missa. Bruno briga com o pai pois deseja comer. Leva um tapa no rosto num momento de destempero. O homem a quem Antonio pede ajuda, e que parece exercer liderança na comunidade em que vive, é um simples trabalhador da recolha do lixo.
O tapa que Bruno levou será amenizado com um momento de extravagância. Eles irão comer pizza, e beber o vinho que o pai oferece ao garoto. Um menino que toca uma espécie de sanfona leva um chute de um colador de cartazes. Um homem expulsa Bruno bruscamente enquanto ele procura as peças da bicicleta. Um padre dá um cascudo em sua cabeça quando ele abre o pano do confessionário. Outro oferece coisas a Bruno e parece querer levar o garoto para uma cilada.
Antonio quase é linchado pela população da rua em que o ladrão de sua bicicleta mora. É cercado quando Bruno consegue chamar um agente. Finalmente Antonio consegue confrontá-lo com um policial que faz uma série de exigências para prender o infrator. Ele quer testemunhas. Antonio desiste. Não vai conseguir recuperar a sua bicicleta.
É domingo. Dia de futebol. Antonio vê uma multidão de bicicletas no centro da cidade. Ele pede a Bruno que volte para casa. Vai pestanejar durante muito tempo. Andando de um lado para o outro na frente do garoto que parece perceber as intenções do pai. O menino vai pegar o bonde sozinho. Não conseguiu chegar a tempo. O pai foi roubar uma bicicleta. Não consegue fugir. É perseguido pelo dono da bicicleta, e por uma multidão que grita em sua direção. Novamente é cercado e quase espancado. É acusado de roubo. A situação inverteu-se aqui. Agora é ele quem precisa roubar.
O menino vê a situação do pai. Entra em desespero. O homem tem a mesma atitude que Antonio teve anteriormente. Não vai denunciá-lo pelo furto. É um pobre diabo. Antonio ganha uma lição de moral. Que exemplo ele quer dar para o seu filho? De Sica mostra com este filme como a situação social e o desespero podem transformar uma pessoa. É um filme poético em sua crueza. Existe um ditado no Brasil que diz, a ocasião faz o ladrão. Neste caso a frase fala sobre a oportunidade do delito fácil, e sem punições. Aqui ela parece combinar com a necessidade instada pelo desespero.

Vô Tá On-Line!

De início foi assim começou com o bate papo
Um moleque me disse dá mulher igual mato
E disse que era a grande invenção do homem
Internet banda larga mais que telefone
Quando eu fui ver, estava viciado
O silêncio era quebrado, o barulho do teclado
Todo dia assim, o dia inteiro…
Levantava pra comer ou então ir ao banheiro
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
A extensão do meu corpo era um computador
Para teclar comigo só mesmo com provedor
O Sofrimento do meu pai foi ficando tamanho
Eu não comia, não tomava banho!
Irreconhecível, um ser virtual…
Minha mãe quando me viu desmaiou passando mal!
Só que o pior viria com o tempo
Com um famoso site de relacionamento
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
O meu pai foi para o quarto e quebrou o monitor
Eu sofri tanto perdi o meu grande amor
Tive que roubar para sustentar meu vício
Tive que sair de casa que momento difícil
Cinco da manhã na porta da lan-house
Com a mão tremendo para encontrar o mouse
Ia para outra quando aquela era fechada
Uma que ficasse aberta até de madrugada
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
Nicotina vicia mais que cocaína
E internet muito mais que nicotina
Eu que era ateu pedi a Cristo e a Buda
E frequentei grupo de autoajuda
Ninguém vai te dizer que internet vicia
Tá aí o meu testemunho
A vida que eu vivia
Ninguém vai te dizer que o excesso faz mal
Pois assim como a cerveja é uma paixão nacional!

sexta-feira, 3 de abril de 2020

A Monika de Bergman...

Monika é a puta. A Vagabunda… A piranha! A nora que nenhuma sogra deseja. A destruidora de lares. Desviadora de destinos e índoles. A vadia! Harry é à sua presa mais fácil. Monika é à adolescente eternamente entediada; que acende o cigarro logo que acorda, e que mastiga o chiclete enquanto a tia do noivo fala. É uma espécie de Madame Bovary em seu tédio profundo, e depressão. Ela tem um ataque dos nervos quando começa a chorar naquele barco. Monika quer mais. Monika sonha ser uma mocinha do cinema clássico americano, onde galã encantado sempre aparece. Mas, volta e meia tem de voltar para o muquifo onde dorme com à família; à sua triste realidade de menina pobre, completamente diferente daquela exposta na tela, no breu do cinema ao fundo onde acontecem os amassos. Mas ela é uma Lolita encapetada. Tem o diabo no corpo! Aquela vida é um tédio. O que mais Monika deseja além de Harry? O príncipe que abandona tudo para fugir com ela? O que mais se pode desejar além de uma amor e uma cabana? Nada. Ninguém sabe. Quando chega lá Monika já deseja outra coisa. Parece até essas adolescentes atuais que sonham o tempo todo com a festa, e quando chegam na festa enfurnam a cara no celular e só levantam o rosto para bocejar de vez em quando. O objectivo foi alcançado. Não há mais caminho a percorrer. É uma fome de tudo. Uma insatisfação infinita. A libido nunca é saciada. Os desejos são mórbidos. Quanto mais se deseja mais se vai desejar. Somos seres insatisfeitos por natureza. Harry aceita a vida. Ele gosta dela. Ela diz: saia! Ele sai. Do emprego. Da sua vida. De tudo. É o corno não conformado. Monika agora quer um casaco novo. Monika tardiamente descobriu que não tem nada. Monika diz que quer se divertir. Ela vai dar para Lelle novamente. Àquele vagabundo do bairro onde ela cresceu e por quem viverá apaixonada. Monika vai abandonar o bebê. Os bebês só são bonitos nos filmes. São fofinhos. Berrando de madrugada são insuportáveis. Harry está resignado. Vai cuidar da criança. Talvez entre para uma igreja e case com uma outra mulher menos esbelta que Monika. Talvez ela não se mantenha em forma com o passar do tempo. Talvez o seu corpo irresistível que levou Bergman à loucura naquela praia, ceda ao tempo. Um dia desses, talvez, Monika esteja sentada num bar, e seja aquela senhora gordinha ao canto. Longe dos seus dias de glória. Com a voz enrouquecida. O cigarro entre dedos. Vai lembrar de Harry, e mostrar fotos para alguém. E dizer, ele cuidou do meu filho, o pai do meu filho é bom! E Harry vai ter uma família feliz. Ou quem sabe não aconteça nada disso, e Monika vire uma carola com uma família feliz assim como à de Harry. Talvez seja Harry que comece a beber, enquanto a sua criança anda sozinha pelas ruas. Talvez ele morra de cirrose. Talvez o destino seja diferente de tudo isto. Pois assim como o cinema de Bergman... A vida um final sempre aberto!

Poeminha a Favor...

Ainda hoje, na Crimeia, alguém dormiu com o seu amor.
Ainda hoje, na Galileia, alguém acordou com estupor.
Ainda hoje, no Butão, alguém soube o que é felicidade.
Ainda hoje, no Japão, alguém gritou por liberdade.
Ainda hoje, em Amsterdã, alguém se disse feliz.
Ainda hoje, no Irã, alguém fez o que quis.
Pois existe um outro mundo,
Do lado de lá, outra cidade.
Nem sempre o que acontece no Brasil…
pode ser encarado, como verdade.
Pois mesmo longe, em Chernobyl,
existe outra realidade.

quinta-feira, 26 de março de 2020

A Síndrome de Aglomeração…

Alguns dos meus pacientes tiveram recaídas bruscas nesta época de confinamento. Como não conseguem ficar sozinhos e nem desenvolver atividades que necessitem de silêncio e solidão, esses pacientes sentem enorme dificuldade ao se verem confinados. Mesmo com as suas famílias. Aumentando assim os níveis de exposição as redes socias e à ansiedade. Levando alguns a cometer o ato intempestivo de ir para a rua, agravando o perigo de contágio e propagação do Coronavírus.

A Síndrome do Interior…

Alguns dos meus pacientes apresentaram sintomas da Síndrome do Interior. São pessoas que normalmente moram numa cidade do interior com ótima qualidade de vida, e que vivem sonhando com cidades grandes; poluídas, e barulhentas. Estas pessoas vivem a reclamar que a cidade não tem nada. Mas também não fazem nada para melhorar a cidade. E não conseguem perceber as coisas boas que lá existem. Estão sempre em busca de outra localidade, como se este lugar pudesse curar a sua enfermidade. Culpam o local de nascença ou de moradia por seu mal, que na verdade encontra-se em seu interior.

quarta-feira, 25 de março de 2020

O Pronunciamento do Presidente...

Medo. Medo da morte. Medo de que o meu pai morra. Pensamentos catastróficos. E que morram pessoas da minha família. Pessoas que eu conheço. Senti medo que o Brasil finde. Espalhe o vírus pelo mundo. Acabe a vida na terra. Senti raiva. Ódio. Nojo. Repulsa. Instinto assassino. Vontade de voar no pescoço dele... Esganá-lo! Ele roubou a minha pureza. A minha paz. Subestimou a minha inteligência. Deu vontade de voltar para as redes sociais e xingar. Eu só ia xingar. Chorei três ou quatro vezes. Perdi a concentração. Fiquei dentro de casa andando de um lado para o outro. Eu preciso meditar. Alcançar a iluminação. Ser um filósofo da moda. Respirar alguns segundos. Esquecer. Rezar. Ficar em paz. Estar acima de tudo isto. Ter pensamentos positivos. Vou pensar positivamente. Ser um ser iluminado. Pacífico. Evoluído. Um verdadeiro guru.

terça-feira, 24 de março de 2020

É Preciso Parar De Culpar Os Chineses...

É preciso parar de culpar os chineses. É preciso parar de culpar os outros. É preciso ficar de quarentena. É preciso isolamento para o cérebro. Longe de tantos aparelhos… de tantas ideias que engavetam, e, engarrafam a mente. É preciso deixar de lado. Deixar a natureza respirar um pouco. Interromper o fluxo. Esquecer. Desligar a máquina. Ficar só com os próprios pensamentos. E pensar numa parada necessária. Tudo que aconteceu foi por desígnio da natureza. Uma fatalidade. Os governos não prestam. Disso todo mundo sabe. Mas ninguém tem culpa de nada. É preciso aproveitar a quarentena para ficar offline. É preciso manter a distância realmente. Mantenha distância! É preciso manter à distância das distâncias. É preciso tocar o outro. Mesmo sozinho, em silêncio.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Gatos e Pombos...

As pessoas que davam ração aos gatos sumiram por causa do Coronavírus. Eu vi uma senhora de sua varanda jogando ração para os pombos. A idosa que leva alimento para os gatos nos jardins do castelo todos os dias continuou com a sua rotina. Acho que ela encara isto como um compromisso. Alguém sempre deixava um bocado de ração para os gatos ao lado da igreja. Os gatos da praça foram obrigados a correr atrás do prejuízo. O último pombo que vi foi devorado aqui embaixo no corredor. O gato estraçalhou o bicho. Havia sangue vermelho e penas brancas para todo lado. Um pombo branco é um símbolo da paz. Um gato é um animal que faz estripulias na internet. Imaginei um vegano apaixonado por gatos assistindo uma cena destas. Esta quarentena nos leva a pensar tanta coisa. Eu, hein! Besteira...

quinta-feira, 9 de maio de 2019

Uma Palavra...

Ele vivia perdido no alto de uma pilha de livros
Mas no cume da pilha, não havia sentido
Ele vivia perdido num mundo de palavras
Em meio às palavras não encontrava nada
Ele vivia perdido para um mar de gente
E para um mar de gente era indiferente
Ele vivia perdido para uma pá de olhos
E por um par de olhos perdeu o seu espólio
Ele vivia perdido por enormes narinas
Enormes narinas apontadas para cima
Ele vivia perdido para tantas mentes brilhantes
Mentes brilhantes que se julgavam diamantes
Ele vivia perdido para uma porção de bocas
Que disparavam palavras... iguais metralhadoras
Palavra que mata, palavra que mente
Palavra que humilha e que fere a gente
Palavra que se arrepende, mas que magoa
E palavras ao vento que são ditas à toa
É um mundo que acaba por causa de uma frase
E assim como um tolo teme pela falta de crase
Uma palavra tem de ser pensada
Uma palavra tem de ser lapidada
E não pode ser dita a toda hora...
Assim... do nada!

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Eu Sou...

Eu sou o negro em seu lugar
Eu sou Tupac
Eu sobrevivi a náusea
Eu sou Jean Paul Sartre
Eu venci o mal-estar na civilização
Eu sou um Sigmund
Eu sou o líquido Bauman
Eu sou um Zygmunt
Eu sou um estrangeiro
Eu sou Albert Camus
Eu faço a coisa certa
Pois eu sou Skype Lee
Em um século de solidão
Eu sou Garcia Marques
E luto contra a mais valia
Pois eu sou Karl Marx
Eu sou Simon, eu sou Garfunkel
Eu sou o som do silêncio
Eu sou Chirstopher Reeve
Eu posso voltar no tempo
Eu sou Durkheim relativismo
Eu sou Einstein relatividade
E eu sou Nelson Mandela
Em busca da liberdade
Eu fugi da caverna
Pois eu sou Platão
Eu vi o mundo lá fora
Eu vi além da escuridão
Eu vim, eu fui
Eu vou, eu sou
Eu sou sim
Eu sou o verdadeiro...
Delano Valentim!

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Vinte e Quatro Horas...

Boa noite amigos meu nome é João
Um dependente em recuperação
Ainda hoje tive uma recaída
Cair e levantar sabe como é a vida
Quando acordei eram três da madrugada
Quem usa sabe como é essa parada
Não quero vir aqui tomar cafezinho
Fora daqui eu conheço esse caminho
Eu que agradeço
Pelo seu depoimento
Por emprestar seu ouvido
Doar o seu tempo
Sei que é tão pouco ponho nesta sacola
Ganho muito mais do que ganhava lá fora
Esquecer o passado, o orgullho, o rancor!
Ter fé em Deus num poder superior
Não deixar de ir à praia ou tocar um instrumento
Não ficar praticando perdendo o meu tempo
Só Deus sabe o que a gente sente
Quando falta força pra lutar contra a corrente
Um morto vivo
Um vivo morto
Roncar sobre a mulher
Achar que tá ficando louco
Agradeço a Deus por vir
Por ter alguém disposto a me ouvir...

Boa noite amigos o meu nome é José
Ainda hoje eu perdi a minha fé
Novamente pensamento suicida
Seriamente tirar a própria vida
Sei que é difícil encontrar um ombro amigo
E que dirá quem sabe um par de ouvidos
Queria sumir apagar o meu nome
Foi então que peguei no telefone
A tristeza conforta sedutora
Com voz de veludo aconchega acolhedora
Eu pergunto o que há de errado
Não sou vítima, não sou culpado
Um sentimento que deixa impotente
Uma voz que diz pra tentar novamente
A lágrima escorreu a boca ficou muda´
Parei e pensei, eu vou lá pedir ajuda
Só Deus sabe o que a gente sente
Quando falta força pra lutar contra a corrente
Um morto vivo
Um vivo morto
Roncar sobre a mulher
Achar que tá ficando louco
Agradeço a Deus por vir
Por ter alguém disposto a me ouvir...

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

A Braba!

A Velha está sentada pitando o seu fumo. Quase todo mundo que passa por aquela rua do subúrbio carioca diz a anciã. É a braba! Ela sempre responde: é a braba! A vizinha diz a idosa. A senhora é uma velha... sem vergonha! A Velha responde. Realmente, eu estou muito velha para sentir vergonha... A vizinha xinga um palavrão. A Velha conclui. É a braba!

domingo, 17 de fevereiro de 2019

O Celular Roubado...

Qual valor o meu Atari, o meu 286, ou o meu Bip tem hoje? Nenhum! O caminho de todas as coisas é... lixo, museu, ou o porão de alguém excêntrico como eu. Por isso não fique triste porque um ladrão roubou seu celular. Eu vou te dar um livro até a gente comprar outro. O meu avô disse. Esqueci o choro.

O Filho do Presidente...

Na reunião da cúpula do governo, o filho do presidente, disse: papai, ainda tem aquele assunto da mudança da embaixada. Um general de alta patente, bigode grosso, tampado de medalhas, interviu. O seu pai vai arriscar a vida caso se envolva nisso. O presidente arregalou os olhos. O rapaz encolheu os ombros.

sábado, 16 de fevereiro de 2019

Matrix...

Ele perguntou para o amigo ao telefone: sabe aquele tênis...? Estou afim de comprar um! Quando desligou sentou para procurar um jogo no site de busca. Apareceu o tênis com o preço. Que coincidência... Ele pensou. Ao acessar a  rede social em sua linha de tempo viu uma página do tênis. Ele se escondeu embaixo da cama enquanto sussurrava para si mesmo. Matrix...