bem que a mãe do Mustafá disse que ele estava diferente. que a sua voz havia mudado, que a sua postura havia mudado. ainda mais depois que Mustafá pôs aquele lenço de playboy no pescoço. a mãe do Mustafá perguntou a ele: que roupas são essas, filho? ele disse: eu comprei. são roupas de luxo! para trabalhar com eles eu preciso estar bem arrumado! o Mustafá fala como aquele garoto que aparece com dinheiro em casa, e não sabe explicar a procedência. eu me lembro do seu pai dizendo a ele, que se ele ficasse com Fatmagul, depois que ela havia "dormido com outro homem". as aspas são minhas. será que ele iria aguentar? em suas cabeças Fatmagul era culpada. Fatmagul era sempre culpada. Mustafá deve sentir saudades da época em que Fatmagul era culpada. pois agora que a batata quente caiu em suas mãos, agora que ele tem certeza de que foram eles que acabaram com a sua vida, e não ela. ele terá de enfrentá-los. mais gente sabe da sua desgraça. é mais gente para dar satisfação. e para provar o quanto ele é homem. Mustafá gostou de dirigir aquele carro. ele gostou de ir à porta daqueles restaurantes. mas ele também quer entrar. ele quer brincar também. saber como é lá dentro. como outros ganham ar condicionado na cara e sobremesa. enquanto outros comem marmita no sol. a vida era tão mais simples na cidadezinha do interior. quando a gente não sabia que existia isso tudo. naquele que Mustafá foi ao quarto do Edogan... ele experimentou os óculos. o relógio. Edogan deve ter a mesma idade que Mustafá. Mustafá pensa, eu posso... tudo acaba justificando seus atos. ele ficou com o carro porque era seu por direito. enquanto os que foram mais prejudicados com tudo. empurram um carro velho. eles haviam destruído seu mundinho cor de rosa. eles acabaram com a Fatmagul que ele conhecia. eles fizeram pior, eles a jogaram nos braços de outro. ela não é mais a mesma. Mustafá também não é mais o mesmo. ele descobriu que tudo aquilo que ele sonhava conquistar, com muito trabalho, e esforço, não era nada para aquilo que outros possuíam apenas por ter herdado. simplesmente. outros que não eram dignos em sua cabeça. destruíram sua vida. feriram a sua honra acima de tudo. ele não tem mais nada a perder. Mustafá que antes se envergonhava do que fizeram a Fatmagul... agora se delicia na cama ao lado da Asu, uma linda garota de programa. que se apaixonou por sua robustez, e inocência, com a qual Mustafá chegou a cidade grande. vindo se vingar daquele de quem foi tirado a sua princesinha inocente, casta e pura. Asu ensinou a Mustafá as delícias da cama. de uma forma tão rápida e veloz, e tão independente, que era como se ele não imaginasse. não soubesse que aquelas facilidades da vida em Istambul não existiam. quando ele sempre estivera preocupado com o quê o povo de sua cidade iria pensar. Fatmagul está com outro. casada com outro. não é assim que eles fazem. compram as pessoas. ela não vai mais fazer programa. não fala mais em programa! ele dá um chilique. Mustafá está parecendo um gigolô.
quinta-feira, 29 de outubro de 2015
domingo, 25 de outubro de 2015
Depressão...
eu tenho depressão desde criança. só que eu não sabia disso. por isso que algumas reações minhas, sobre alguns acontecimentos, eram descabidas. decidi frequentar aquelas reuniões de doze passos. li algo aqui, outro ali, foi abrindo a minha mente. fui a um primeiro psiquiatra incentivado por minha esposa. ele me mandou tomar remédio. há anos já estava convencido de que tinha depressão. e mesmo assim relutava em tomar remédio. por puro preconceito. o segundo psiquiatra me disse para que tomasse remédio. aí eu confiei nele, aceitei. e a minha vida passou a ter alguma esperança. mas ainda tenho crises de depressão. passei a fazer terapia. as pessoas não tomam remédio. nós brasileiros somos preconceituosos. e não temos educação. nem cultura. eu mesmo sou um exemplar de machão suburbano latino americano de escola pública. e como eu vou chegar na roda dos malucos, e dizer que tomo remédio? e que tenho depressão, que é doença de fresco, doença de rico? depois eu pensei que fosse frescura minha. um charme de artista. mas não. os números da organização mundial de saúde são alarmantes. ninguém sabe porquê. nem os médicos. ninguém sabe nada. eu desconfio que nosso modelo de sociedade seja um clima bastante propicio para deixar o sujeito pinel. com todo ódio ciúme inveja. mas aí na terapia eu contei a psicóloga sobre acontecimentos da minha vida. da minha vida em comunidade. da minha vida em família. coisas que na minha concepção pareciam acontecimentos normais da vida de uma criança. mas que na verdade, provocavam bem mais sofrimento do que aparentavam. eu fui um moleque normal. assumindo até uma atitude de liderança em alguns momentos, em atividades na rua e na escola. mas tinha depressão. que na minha cabeça era doença de fraco. deveria tomar remédio. não que eu tenha vergonha de ser fraco. ou medroso. que na verdade eu sou. pois sei da fragilidade humana. pior do que ser fraco, é os outros ficarem sabendo que você é fraco. descobri em minha pesquisa, que nas civilizações mais evoluídas, os médicos são obrigados a receitar o remédio para quem tem depressão. aqui depressão ainda é coisa de maluco. não é. quem dera que fosse! o maluco não sabe que está maluco. você sabe porque está sofrendo. ou melhor, nem sempre... mas tem consciência de que está sofrendo. se é que o maluco está sofrendo. depois que você volta de uma crise de depressão fica de ressaca. envergonhado. com remorso, do que disse na hora do nervoso. da crise de choro. no Brasil normalmente depressão é curada com sexo, crack, pó, maconha, cerveja, internet, televisão, churrasco, aplicativos, violência, açúcar, sal, velocidade, dinheiro, popularidade... e muitos remédios tomados a torto e a direito. mas a depressão está bombando no mundo todo. e a conclusão de uma depressão desviada, para um outro local, um vício por exemplo. creio eu, que não sou especialista de nada. que seja triste! que seja um fiasco... depressão têm motivos. acontecimentos. ou não. cada um reage de uma forma. e só quem tem depressão. sabe o que quem tem depressão sente. é igual ser preto e pobre no Brasil. não adianta explicar que você não vai entender. você vê tudo cinza. você que foi criado para ser o macho. o provedor. o protetor. se vê chorando igual uma criança em frente a sua esposa. impotente. pois a depressão é incapacitante. aquela à qual teoricamente nessa sociedade machista você deveria proteger. você se sente o elo fraco da corrente. a minha depressão é pública. mas poucas pessoas com quem eu comentei algo, disseram alguma coisa de volta. o número de pessoas que sabe, é maior do que o número que finge que não sabe. em sua maioria me disseram para que não tomasse remédio. e me sugeriram que haviam feito um feitiço pra mim. o que não foram poucas vezes. e já sugeriram que eu estivesse impotente sexualmente. algumas vezes me desencorajaram da terapia. depressão carrega o estigma da doença mental. e além do mais ninguém quer ouvir choro. ainda mais de quem está aparentemente saudável. você se sente um cafajeste, num mundo com tanta criancinha sendo triturada. esse cara que está na rua. e quê você vê na cachaça. no crack. talvez tenha começado com uma depressão. depressão não tem cura. mas tem tratamento. manutenção para que não piore. esse maluco que mora na calçada da sua rua. que fala sozinho. todo sujo. cabelo grande. tudo bem que você chega no posto de saúde. e fica junto dos malucos, não existe uma triagem, muito doido! não que eu não seja maluco, ou que tenha algum problema com isso, e do qual a sociedade quer empurrar para debaixo do tapete. vamos nos livrar da vergonha dos malucos e dos suicidas que temos na nossa grande família complicada. só que aí vamos ter de nos livrar de muito mais gente do que a gente imagina. não é Simão Bacamarte? ninguém quer carregar o estigma de ser anormal. ainda mais na sociedade do rebanho. porque o número de gente que tem depressão, e não sabe não está no gibi! eu falo sobre depressão, porque é importante falar. pois se consegue apoio. porque eu sou artista também, e muitos, mas muitos artistas que eu gosto, morreram ou se mataram por causa da depressão. Não vai acontecer comigo. Melhorei, e continuo o tratamento.
quinta-feira, 15 de outubro de 2015
Fatmagul... 2
Fatmagul... vai catar o feijão! Mukaddes grita. Fatmagul sai de perto do fogão. a cozinha é pequenina. Fatmagul deixa o que estava fazendo para ir fazer o que a outra mandou. Fatmagul vai catar o feijão. Fatmagul dorme espremida num sofá cama com o sobrinho de quem ela cuida. o sobrinho é filho do seu irmão. Rahmi. que chama. Fatmagul... E filho da cunhada que aqui faz o papel de bruxa. antes de dormir Fatmagul olha para os lados. ela vê se todos na pequena casa já estão dormindo. Fatmagul aspira ao silêncio. sente o ar. enfia a mão embaixo do sofá. tateia. ela ainda está lá. que alivio! A cartinha que está ensebada de tanto ser manuseada. Fatamagul sente o cheiro da carta escrita em folha de caderno. e a guarda novamente... é de se imaginar que aquela carta pardacenta seja o seu refúgio. o seu descanso. o seu álibi para o presente. o seu paraíso. o seu pequeno segredo de estimação. desses que compõe a vida. Kerim ouviu da boca de Mukaddes ela gosta de você! se não gostasse não guardaria esta carta! Fatmagul guarda a carta com unhas e dentes. Kerim diz a Mukaddes que devolva a carta de volta ao lugar onde a encontrou. Aquela frase de Mukaddes fica indo e vindo a cabeça de Kerim. e sempre que ele quer se ver livre de todo aquele sofrimento... ele aciona a frase de Mukaddes que fica pululando em seu cérebro. enquanto o coração de Fatmagul acelera. Kerim sente a calmaria. ele está feliz por ter um emprego. por poder trabalhar e ajudar em casa. por poder pagar seus pecados. numa daquelas conversas de quartinho com a tia, Kerim diz que sonha levar todos para o estrangeiro. para que eles possam ter paz. ou melhor, para que ele possa ficar em paz com Fatmagul. era o que Mustafa sonhava. apenas ter o seu recanto de paz com a sua amada... uma casinha no subúrbio com flores. chegar com o dia claro, ainda. trazendo o pão debaixo do braço. Mustafa só queria que as coisas permanecessem como estavam. as vezes é apenas isso que a gente deseja. Kerim quer ir para longe dali. sem a sombra de Mustafa... e daqueles vampiros! Ninguém nunca desejou o perdão como Kerim. a sua frase fica valsando na cabecinha de Fatmagul. eu não fiz nada! você estava inconsciente, por isso não se lembra! ele era cúmplice. não fez nada para impedir. Ebe Nine, a tia, ficará feliz se ele for perdoado. Fatmagul representa o sonho da inocência campestre. do interior. Fatmagul é a inocência em tudo. na roupa. no olhar. Na pessoa... nos olhinhos verdes. ou claros. a simplicidade... Fatmagul é um anjinho. Uma santinha que precisa ser protegida. Mustafa não entendeu isso. ele vive por uma vingança... Kerim entra na loja. lembra do sapato de Fatmagul. ele nunca comprou nada com tanto ardor em sua vida. nunca trabalhar um dia inteiro pregando, e martelando, fez tão bem a uma pessoa! ele pergunta se tem desconto ao cara da loja. tem. Kerim olha para o vestido. imagina Fatmagul vestida com ele... Fatmagul não pode saber que foi Kerim quem comprou. cabelo solto. ano novo! e só o Kerim sabe o quê sentiu...
quinta-feira, 24 de setembro de 2015
Amelinha...
não era qualquer música. era Frevo Mulher. do Zé Ramalho. e isso para um suburbano que gostava de festa junina e quadrilha, deveria dizer muita coisa, sendo que essa era uma das músicas mais tocadas. e uma das preferidas dos grupos folclóricos. penso que aquela gravação é impecável. uma das melhores da música brasileira! musique. music. Amelinha é esta cantora. eu conheço a sua voz. a sua voz única. Amelinha deu sorte com a natureza. pois tem um timbre peculiar. e seu estilo não é aquele, você canta em lugar tal... num camelô no Ceará numa negociação em que envolveu uma coletânea do Moreira da Silva, consegui negociar uma coletânea da Amelinha. não era apenas uma cantora que me lembrava a minha infância. a sua música é viva. ela não deixa nada a desejar aos seus conterrâneos, contemporâneos. já ouviu aquele disco O Pessoal do Ceará com Amelinha, Belchior e Ednardo? e essa gravação do Dia Branco de Geraldo Azevedo? ela está ligada ao que existe de melhor da música brasileira, moderna, original. assim como a música de Minas.
quarta-feira, 23 de setembro de 2015
Henry Miller...
Henry Miller vai para o inferno e arrasta o leitor junto. e depois ele te mostra a luz. talvez por isso o nome de sua trilogia se chame A Crucificação Encarnada. ele mesmo diz que um homem para chegar ao paraíso tem de conhecer o inferno primeiro. sendo ele o narrador, memorialista, até onde é possível, Henry Miller divide o ponto de vista com você. fazendo com que experimente suas vivências. você se vê transladado para os sentimentos de Miller. em algum momento se sente confortável. Henry Miller disse que um homem que nunca sofreu com as suas próprias neuroses, não sabe o quê é sofrer. é isso que ele nos apresenta. as suas neuroses. da mesma forma que o esgoto exposto do Brooklyn em A Primavera Negra. Henry Miller disse que se tivesse lido o Tao Te Ching antes não teria sofrido com todos aqueles conflitos. acredito que no Big Sur ele tenha dito que não guardava mágoa de ninguém do passado. essa é a mesma impressão que se tem ao ler Henry Miller. a insatisfação de não ter lido, ou compreendido Henry Miller antes. Henry Miller é libertário. leia o início de Trópico de Câncer em que ele se diz. não tenho dinheiro, nem recursos, nem esperanças. ele afirma. sou o mais feliz dos homens vivos! ou aquela passagem de Marússia. em que ele responde ao homem que diz que os americanos são ricos, Henry Miller diz que eles são ricos, sim, ricos de espírito, que ele não tem dinheiro, mas que irá para Atenas, e que vai conseguir o dinheiro para comprar a passagem. Henry Miller ficava feliz por qualquer coisa, pois sabia que não tinha nada. uma passagem de um livro. uma paisagem. o cheiro de uma comida. um rosto de uma mulher. tudo é sublime porque estar vivo é uma sorte. ele destruía o mundo para depois edificá-lo ao máximo. era forte como Walt Whitman, ou Blaise Cendrars, homens que admirava. o seu ponto de vista é sem maquiagem. para Henry Miller não existe gênero, raça, cor, nacionalidade. ele ri de si mesmo. detesta a si mesmo. e ama o ser humano, fingido e patético. ele amava viver. simples. talvez por isso continue vivo em seus livros. clichê. Henry Miller publicou seu primeiro livro depois dos quarenta anos. incentivado por Mona ele foi para a França. havia abandonando tudo para escrever. emprego, família. aprendeu uma nova língua. depois recomeçou a vida em Big Sur. com as dificuldades de se morar em um local isolado, criar crianças, e levar uma vida simples. com a qual se aprende muito. Henry Miller encarou a si próprio para recomeçar. E morreu velho. como morrem os homens sábios.
segunda-feira, 21 de setembro de 2015
Rio de Janeiro Lugar Limpo e Pacífico...
você olha a manhã pela janela. faz um dia bonito. você diz. eu vou comprar pão, e aproveitar para pegar um solzinho. os pássaros estão cantando em frente a sua janela. o beija-flor bebe a água que você deixou para ele num daqueles troços de plástico que vende na feira, e que têm flores artificiais em volta. você caminha olhando o céu azul. na esquina da padaria um caminhão arrasta um carro e uma árvore. começa a esquentar. a temperatura. e as pessoas. você vê o trocador do ônibus dizendo ao motorista, que palhaço! o motorista olha para o retrovisor com aquele olhar de gavião. de rabo de olho. ele bufa atrás do volante. parece que vai jogar o ônibus em cima do carro do cara. na entrada da favela você vê os policiais abordarem três moleques pretos. de mão pra parede. eles devem ter entre treze, e quinze anos. o moleque do banco da frente diz. tenso. o senhor está discutindo com três mulheres com uniforme da Claro. ele grita. você não é a gerente! você é a gerente?! a mulher grita ao telefone. manda ele pro inferno, Soraia! os camelôs saem correndo. aconteceu alguma coisa. mais, mas, o quê? você olha as imagens do arrastão na tevê. você está em pé em frente aquele pé-sujo. você olha as pessoas correndo na praia. você diz pra mulher. caralho, anos noventa!
sábado, 19 de setembro de 2015
Fatmagul! 3
Resat Yasaran cospe para o filho. e para o sobrinho. idiotas! nós demos tudo a vocês para quê? para que no final vocês se comportassem como animais! a decoração da sala é suntuosa. Yasaran parece um bicheiro. ele tem relógio e cordões. anda de camisa com o botão de cima aberto. e sempre põe a mão no quadril e a outra para o alto quando dá esporro. o velho de barbicha branca insinua. ele é o dono do vilarejo. ele é o dono da cidade. o playboy de olhos verdes e barbicha serrada, primo de Selim Yasaran, ele não tá nem aí! ele olha para a secretaria. Resat Yasaran é grisalho. magro. Resat tem uma presença imponente. ele é impetuoso. implacável com os inimigos. ele estraçalha. bate na cara do filho. a noiva do filho viu. ele olha para eles, e diz que se eles saírem da linha outra vez, eles não imaginam do quê ele será capaz. de maneira intrínseca insinua de que pode passar por cima do vagabundo miserável. ele seria capaz de matar o próprio filho. é isso que ele quer dizer. o irmão fala no mesmo tom. o primo de Selim olha para a secretaria com olhos de gavião, mal sabe ele que ela é a comidinha de Resat. eles são uma família de mafiosos. o irmão de Resat fala com o filho, e com o sobrinho no mesmo tom. antes de sair da sala eles ficam sabendo que irão trabalhar. e trabalhar. a mãe de Selim sofre tremendamente. o pai da noiva liga para saber que história é aquela nos jornais. é impressionante o diálogo de Selim com o pai. é um pingue-pongue. a mãe de Selim sofre horrores por causa do filho. ela vê o quanto o filho se parece com o marido. o filho só está preocupado em proteger seu casamento e o negócio do pai. e o pai consequentemente. em nenhum momento eles pensam em Kerim ou em Fatmagul. Da mesma forma que Mustafá só se preocupa com a sua honra. que ele diz que está manchada, mas que ele irá limpar com sangue. em nenhum momento se refere ao sofrimento de Fatmagul a mãe morrendo pede que ele jure a ela que não vai fazer nada. mas Mustafá é sangue no olho. só pensa em vingança. ele diz que não pode prometer algo que não vai cumprir. Mustafá queimou a casa em que ele ia morar com Fatmagul. tão grande é seu ódio. a noiva já sabe. sofre. o seu pai liga para Resat. ele quer esclarecimentos. tanto ele quanto o filho negam aquela história. quando uma mulher vai a casa de Fatamagul pegar de volta a aliança, ela diz, não mate o mensageiro! Kerim marcou uma conversa com os playboys. eles estão dentro de um iate. o clima fica tenso como num filme de Hitchcock vira um tríler psicológico. Kerim diz que não suporta ficar perto da garota. que fica olhando para ele. ele não suporta ficar perto dela. ele está atrelado a ela. eles não. ele diz que eles são uns vermes. depois que o Kerim saí e deixa os parasitas sozinhos. eles conversam entre si. nenhum deles tem conseguido dormir. na hora em que Kerim avança a mão para segurar o copo. Fatmagul vê a marca em seu braço. a marca daquela noite. ele puxa a manga da camisa. ela olha para ele com ódio. eles estão naquela pensão em Istambul. Fatmagul está sentada numa cadeira. de costas para janela. é possível ouvir a voz do seu irmão em off. Fatmagul, onde você vai? espera Fatmagul! Mustafá acorda o careca com as duas mãos em seu pescoço. Mustafá diz, você vai me dizer tudinho o quê aconteceu aquela noite. o careca diz para os playboys. idiotas! ele é um advogado de porta de cadeia. será tio de Selim? o careca logo se recompõe, e com a sua frieza leva Mustafá na conversa. a trilha sonora é passional. o cenário da pequena cidade praiana de pescadores, é paradisíaco. idílico. mas eles sofrem. a pressão psicológica é insuportável. o careca diz a Mustafá que não é nada disso. e que Fatmagul é que armou aquela história de estupro. Mustafá leu o jornal. em sua fúria só ele havia dado uma passada na casa de Kerim. ele só não bateu em sua tia. mas quebrou tudo que viu pela frente. e com todo ódio cortou o nome de Kerim escrito na árvore. Fatmagul olha para o canivete em cima da cama. ela pega o canivete. e vai enfiar em Kerim que dorme. ele acorda. e segura a sua mão. saí batendo a porta. logo após, ou antes. Fatmagul se senta de costas para a janela. é tão linda Fatmagul... parece uma menina brasileira de verdade. deve ter uns vinte anos.
quarta-feira, 16 de setembro de 2015
Samo Está Morto Basquiat Está Vivo!
Samo is dead. Basquiat está vivo. andando por aí. Basquiat caminha no centro da cidade. anda de um lado para o outro com a pilot na mão. rabisca frases aparentemente desconexas nas paredes. no banco do busão. breath teeth. Basquiat vaga pela cidade. dorme pouco a noite. no sofá de amigos. aqui e ali. mal tem onde dormir. come sanduíches de queijo. anda com roupas folgadas para o seu corpo. o seu cabelo tem um corte peculiar. reconhecível. Basquiat diz que não tem nada diferente para falar. diz que não se lembra do quê sente raiva. Basquiat deu uns pegas na Madonna antes dela ficar famosa. Madonna tem apenas três músicas na época. Basquiat já tem uma obre imensa. sua namorada Vênus, Suzzane, parte pra cima da Madonna na Roxy. Basquiat pinta sobre a briga. Basquiat tem uma banda de jazz. instrumental. e ele quem nomeia as músicas. uma delas se chama Mona Lisa. Basquiat tem uma banda chamada Gray. é um som experimental. será minimalista. não sei. Basquiat caminha sobre os corpos dos viciados em Heroína que infestam o Soho. Basquiat dorme e trabalha no estúdio. vende seus cartões postais com embalagens de bala. Basquiat pinta ouvindo jazz. John Coltrane. escuta David Byrne. pinta ao som da música. faz isso compulsivamente como se fosse a única coisa interessante a ser feita sobre a Terra. Basquiat começa a usar cocaína. fica paranoico. cobre as paredes do estúdio de preto e branco para não ser visto. diz que o serviço secreto está atrás de si. desconfia das pessoas. começa a usar heroína. saí na capa da New York Sunday Times. Basquiat está de terno. mas do mesmo jeito em que podemos encontrá-lo quando pinta. o cara que promove a arte de Basquiat chega ao estúdio. não necessariamente nessa ordem cronológica. Basquiat está chapado de ópio. Suzzane diz que quando Basquiat usa cocaína a sua pintura é mais detalhada e que quando ele está chapado de heroína, a sua pintura é mais expressionista. Ela consegue perceber. Basquiat vende um de seus postcards para Andy Warhol. um desses que valiam dois dólares e que hoje valem uma fortuna. Basquiat decora apartamentos de yuppies de Wall Street viciados em cocaína. que recebem o pó no açucareiro. a sua arte se torna um comodities. Basquiat expõe junto com Andy Warhol. a crítica detona a exposição. Basquiat está deprimido. paranoico. parecendo um velho de oitenta anos. Basquiat morre de overdose. Basquiat morre aos vinte e sete anos. assim como todos os grandes. Jimi Hendrix. Kurt Cobain. Jim Morrison. Janis Joplin. Amy Winehouse...
terça-feira, 15 de setembro de 2015
A Casa da Família...
a casa vivia cheia. eram muitos filhos. eles se reuniam a noite em volta da televisão. iguais famílias de civilizações antigas se reuniam em volta da fogueira. o pai e a mãe conversavam até tarde. todos os dias. mesmo depois que os filhos já estavam dormindo. durante a manhã era aquele alvoroço. e o batalhão, como dizia a mãe, se arrumava para ir à escola. o pai e a mãe saíam trabalhar. nos finais de semana, aos domingos, eles tomavam o desjejum juntos. o pai ia cedo a padaria comprar pão, a mortadela, o leite, e trazia o jornal. eles sorriam. e juntos faziam aquele almoço suntuoso. depois que a mãe morreu todos foram embora. o pai foi o último a abandonar a casa. agora eles pouco se vêem. se falam sazonalmente. e se cumprimentam educadamente. é como se fossem estranhos. isso quando não param de se falar. a casa está vazia, mas ela continua respirando. é como se sentisse a falta deles. e ainda é possível ouvir suas vozes. e se deparar com o vulto dos vivos. mas isso já é passado. assim como o início do texto que você acabou de ler.
segunda-feira, 14 de setembro de 2015
Cadê Você Meu Querido Henry?
ontem eu me lembrei de você meu amigo Henry. de quando você descia a rua gingando e sempre trazia uma carta na manga. você se virava e me dizia, hei, man! está com sede? eu dizia. estou. você me perguntava. quer tomar Coca-Cola? eu olhava para a cantina da escola, e dizia. mas eu não tenho dinheiro. e você me dizia, eu perguntei se queria beber Coca-Cola. não perguntei se tinha dinheiro. você via alguém sentado no pátio com a Coca as suas costas. alguém cujo pai devia dar mesada, e daqui a pouco você aparecia com uma Coca-Cola. e matava a nossa sede. e a gente dizia, amo muito tudo isso! eu me lembro quando você se deitava no chão se fingindo de morto. enquanto eu e os moleques da rua acendíamos uma vela ao lado do seu corpo. e te cobríamos com jornal. você com os pés para fora do jornal... a gente adorava quando vinha uma daquelas senhoras, olhava e dizia, coitado, que pena dessa mãe! elas acreditavam que era apenas mais um daquela época que havia sido morto. e a gente caia na gargalhada. eu me lembro que quando a aula estava chata, você entrava na secretaria para roubar as carteirinhas, enquanto eu sempre o mais medroso e o mais covarde, apenas vigiava. você pegava de volta, a minha carteirinha e as sua já com a presença carimbada em azul. e a gente caia fora. ou pela porta da frente. ou pulando o muro. e estávamos livres! livres! eu me lembro de quando não havia dinheiro para comprar fichas de fliperama, e você dava um jeito. para tudo que fosse verdadeiramente importante você dava um jeito. eu me lembro de você travando as bolas do totó. ou virando a mesa para que a ficha caísse. ou pegando um pedaço de arame. para tudo você tinha uma solução. até quando aquele cara mais forte que todos nós resolveu nos bater... e você veio com aquela. eu me lembrei de você meu amigo Henry! e me lembrei de como nós éramos inteligentes naquela época, criativos, espontâneos. quando a mentirinha chamada sociedade não conseguia nos ludibriar com a sua aparência sã. mas você sumiu no mundo... e a gente acaba "crescendo", e ganhando essa aparência de "saudável". de sensato. e temos de sufocar tudo aquilo que cala fundo em nosso coração. pois os clichês quase sempre são verdadeiros e temos de fingir que não acreditamos mais em nada daquilo. e que tudo que pensávamos era coisa de gente inocente. como se toda aquela rebeldia utópica não fosse verdadeira. aí nós temos que fingir, que acreditamos em toda essa mentira. em todo esse circo que os homens criaram. para que a gente possa se parecer com os idiotas.
sexta-feira, 11 de setembro de 2015
Qual é a Contrapartida do Artista?
o seu trabalho.
o que o artista faz para contribuir com a sociedade?
o seu trabalho.
assim como,
o médico, o professor, o gari...
segunda-feira, 7 de setembro de 2015
O Pai da Menina do Vídeo que Vazou na Internet...
a menina está deitada na cama. ela acabou de descobrir que o seu corpo está exposto por toda a internet. todo mundo acordou podendo ver seu corpo na rede mundial de computadores. em cada parte do globo que existisse um mínimo equipamento que se conectasse a internet poderiam ver seu copo. ele agora era de domínio público. a intimidade que ela tanto tentara preservar, até a sua noite de núpcias com o namorado. como ele, dizia. estava em toda a rede mundial de computadores. ela queria ser descolada como uma daquelas mulheres que exibiam os seus corpos em revista sem o menor constrangimento, talvez não fossem ligar para nada daquilo. ela não era uma mulher posando ganhando milhões para tirar a roupa. não. ela havia tirado a roupa para o namorado. e não ia depois de aquilo dar entrevista, ou subir para a cobertura de um prédio. ela teria de encarar as pessoas no dia a dia. na escola. na rua. os vizinhos. o ataque havia começado. quando ela abriu o seu Facebook, já havia mensagens sobre o seu peitinho. Suzana só tinha uma certeza. ela iria dar um jeito de se matar o mais rápido possível. agora ela não entendia porque o pai viera até ali. porque ele não a deixava sozinha. ela estava com a cabeça embaixo do travesseiro de tanta vergonha que sentia. o pai sentou a cama, e ela sabia que ele iria contemporizar. e tentar dizer alguma coisa que desestimulasse uma atitude mais drástica. Jorge sabia que era jogo perdido tentar chamar atenção da filha. o pior de tudo já havia acontecido. quando ele se dirigiu a ela, e disse, Suzana, ela disse, eu tenho vergonha de você. a voz de Suzana parecia saída de um túmulo. de um buraco muito escuro. Jorge disse, pior do que isso, eu fiz abandonando você ainda criança. Jorge continuou. sabe Suzana, o quê você fez, está feito. e você vai sofrer as consequências do quê fez. agora, eu te pergunto. quem nesse mundo todo, de bilhões de pessoas, que vai assistir a esse vídeo ou a essa foto. quem deles se preocupa verdadeiramente com você. quem deles já te perguntou algum dia, como você estava se sentindo, ou te ofereceu alguma coisa. ou mudou de opinião por algo que você disse ou pensou. você é apenas uma Suzana. existem milhões de Suzana. você vai se matar, por isso? mas e as pessoas da escola da minha família. o pai disse, filha. a gente se muda. faz o que for. mas a vida irá continuar. e a partir de agora esse vídeo faz parte da sua história. não para te lembrar que cometeu um erro. mas sim, que a vida continua. pois ela sempre continua, independente de você.
sábado, 29 de agosto de 2015
Sherazade...
a senhora diz detrás do balcão. vai começar a minha novela, a Sherazade! para de ficar para lá e para cá com esse controle! o velho com o controle na mão diz a Dilma. você foi trabalhar de bicicleta, Dilma? um cliente está encostado num balcão com uma cerveja esquentando a sua frente. num daqueles botecos debaixo do viaduto. o velho continua, ela engarrafou tudo. ela foi de bicicleta. mas levou carros com ela. e ainda atraiu a atenção dos curiosos. o cliente sorri. o velho continua. não vai de Bike, Dilma! não tem ciclovia! alguns presidentes vão trabalhar de metrô porque em seus respectivos países dá pra fazer isso. coitada da Dilma que tem que pedalar num canteiro. cuidado Dilma, para que não apareça o filho do Eike Batista derrapando, e te jogando longe! ou o filho do Pitanguy subindo na calçada de repente numa numa rua tranquila. ou o filho de alguém que nunca vai ser preso porque tem dinheiro. e cuidado para que os ladrões de bicicleta não roubem a sua bike. cuidado com as facadas por todo o país. seja por nosso machismo. ou por nossa agressividade. que não é associada a imagem melíflua que o nosso turismo sexual criou. quem não vai sorrir com uma gorjeta em dólar, ou em euro, Dilma? mesmo depois de ter devorado uma de nossas criancinhas. ou uma de nossas lindas "meninas", e nossos lindos "meninos". o cliente diz para descontrair. mas esse Pitanguy é velho! acho que ele vai substituir o Niemeyer! a mulher diz. a Dilma emagreceu. ah, ele emagreceu sim... emagreceu, e muito! agora se foi por stresse. ou para se manter a forma... é o preço do poder! começa a Sherazade. e todos olham vidrados para a tevê.
Prometeu Acorrentado...
O menino dorme sozinho num dos quartos do segundo andar da casa grande, e branca. dorme é uma forma de dizer. pois aquela noite será tão longa quanto as outras. O menino teme o mico que se encontra preso a árvore. ele ouve o guinchar ensurdecedor do mico durante o dia. o medo agora é a enorme aranha na parede. ou melhor, a sombra enorme da aranha. de manhã, com a chegada da luz do dia. o medo se desvanece.
sábado, 22 de agosto de 2015
A Fita Do Noel...
o maluco do trabalho que havia me emprestado a fita do Cartola, também me emprestou uma fita do Noel. eu pus os pés no ônibus. paguei a passagem. dei boa noite ao cobrador. fiquei no último assento alto. na janela. o maluco que era para me cobrir havia faltado. então tive de ficar até tarde no trabalho. sem ganhar hora extra. puxei o walkman. dei o play. não acreditava que estava ouvindo aquelas raridades na voz do próprio. não havia internet aquela época. subiram dois malucos pela frente. com isopor. como se fossem vender alguma coisa. o quê estava com o isopor puxou um trinta e oito enferrujado lá de dentro. eu ia tirando sorrateiramente a fita. quando ele disse, passa essa porra pra cá! eu ia dizer, amigo... ele fez a aquela cara de filme americano. e disse. eu estouro seus miolos! joguei a fita dentro do isopor. o walkman era emprestado. também.
A Fita do Cartola...
um maluco do trabalho havia me emprestado a fita do Cartola. um maluco que tocava bandolim. branco, e de óculos. infelizmente não lembro o nome dele. alvoraçado eu abri a porta. joguei a mochila no sofá. a minha mãe estava na cozinha. dei um beijo em seu rosto. ela perguntou, vai onde? terraço! subi às pressas a escadinha de ferro em forma de caracol. tateei o interruptor no escuro. na luz, achei a tomada. abri o compartimento da toca fitas. joguei a fita. e quando explodiu a introdução da primeira música, O Mundo É Um Moinho. as lágrimas escorreram com a mesma velocidade com que cheguei. chorei copiosamente. não chorava por nenhum motivo especial. não era por causa da humanidade, que se mantinha firme em seu propósito lento, e gradual de autodestruição. não chorava por nenhum motivo em particular. e sim, porque havia músicas como aquela... ou a dança dos pássaros no céu. de manhã. olhando a janela. durante o primeiro café. sempre conto a mesma história. pois mesmo em silêncio... aquela introdução me vem à cabeça.
quarta-feira, 19 de agosto de 2015
Crack!
eu fiquei extremamente sem graça quando ele falou comigo. pois lembrou do meu nome. ele chamou meu nome. levantou o polegar e sorriu. ele estava sujo, e maltrapilho. carregando coisas. dava pra ver que estava no crack. eu não conseguia lembrar quem era de jeito nenhum. até hoje não sei quem falou comigo aquele dia. sei apenas que nós fomos muito íntimos, pois aquela voz me era familiar. ele parecia ter lembrado de bons momentos quando falou comigo. eu sabia que ele estava destruído pelo crack. eu o vi perto da passarela. o outro ia a minha casa. morava na mesma rua. falou comigo. eu estava do outro lado da avenida. os ônibus passavam. ele pôs as mãos no peito demonstrando o quanto gostava de mim. eu imitei o seu gesto. e olhei pra ele como quem diz, que independente daquela merda toda. eu continuava gostando dele. os meus olhos encheram de água. ali eu me emocionei, e perdi toda a sisudez de machão suburbano. presenciei a expressão de um amigo meu, numa cena parecida, e ela parecia de horror. ainda bem que pude ficar feliz perante um amigo que havia ido parar na rua por causa da bebida, e que agora estava todo arrumado, como antigamente. como quando nós éramos moleques. quando nos conhecemos. mas nunca vi ninguém liberto do crack. sempre vejo aquele moleque correndo, para lá. e para cá. e sempre me lembro dele, que está abandonado ali. tendo alucinações. sendo vítima de rituais. de espíritos malignos, segundo alguns. esquizofrênicos, segundo outros. para todo lado que olho vejo mendigo. gente morando na rua. falando sozinha. deitada na calçada. carregando trapo. esmolando. fazendo suas necessidades a luz do dia. morando no meio do lixo. andando nos trilhos.caminhando nas vias expressas. eu vi aquele moleque branco e o pessoal da favela segurando ele que estava tendo uma overdose. não sei se ele sobreviveu. mas apenas ouvi as pessoas gritando, Playboy! Playboy! Volta, Playboy!
terça-feira, 11 de agosto de 2015
O Repórter...
o repórter se indigna com a menina loura que matou os pais. enquanto isso, Romário se equilibra num vagão da SuperVia, ele pergunta, mas o seu nome é Brad Piti por causa do ator? O outro diz. sim. a minha mãe gosta muito dele. o amigo com nome de jogador de futebol sorri. a repórter pega carona de bicicleta. Brad Piti pensa que ela age igual político em campanha. ela diz as pessoas, nós temos de ter força de vontade. Brad Piti não consegue entender. ele pensa, porque eles têm que ter força de vontade, se os políticos são empregados? não entendo! Obviamente que o repórter está indignado porque os pais mataram os filhos. ele não entende como eles são capazes de fazer isso tendo a vida que tem. Romário em sua depressão chega a chorar na do repórter. não existe nada mais triste do quo pais matando filhos. Romário sabe que no canal ao lado, durante a semana é uma carnificina só. jorra sangue. crianças são esquartejadas. bebês são mortos. baleados. pessoas são enterradas vivas. Crianças abusadas. Um horror. mas ninguém está nem aí! diz o cara com o nome em homenagem ao jogador de futebol. vovós são mortas a machadadas nas periferias. a violência brasileira é feia, e triste. e se aquele repórter tivesse lido O Casamento de Nelson Rodrigues, ele saberia que os doentes estão em todas as classes. se é que ele não sabe disso. pensa Romário. a repórter fica feliz com a presença do secretário de obras, que deu o ar da graça depois de tanto tempo. ele apareceu para asfaltar ruas que nunca foram asfaltadas na história. mas que serão asfaltadas agora quando a humanidade começa a pensar em povoar Marte. ele põe a culpa disso nos governos anteriores, asfalta uma rua. e cai fora. as pessoas que moram na rua ficam agradecidas. E ficam pensando em como ele é generoso em ceder parte do tempo para conversar com eles, que vibram quando o secretário diz que vai fazer alguma coisa. Brad Pit diz a Romário. eu estava naquele vagão da SuperVia que passou por cima daquele rapaz. o repórter só falta chorar. ele está indignado com a mulher que matou o marido para ficar com o amante. ele não consegue acreditar que ela possa ter feito isso tendo a vida de rica que tinha. ele só falta dizer a ela que se ao menos ela fosse uma miserável. Brad Pit chora copiosamente. junto ao repórter que chora na tela da televisão. e repete aquela frase clichê. o mundo está perdido.
segunda-feira, 3 de agosto de 2015
Sophie Miller...
Sophie Miller é o tipo de menina que tem dois olhinhos pequeninos e brilhantes no fundo dos óculos. Ela ficou com este ar de inteligente depois que começou a usar óculos. Mas antes disso Sophie Miller já dizia, acho tão bonito quem usa óculos... Sophie Miller ficou com cara de boazinha mesmo contra a sua vontade. A sua voz é igual à voz dessa mulher que nos diz quando devemos acrescentar um novo número ao telefone discado. Sophie Miller parece uma apresentadora de telejornal que eu admiro... Se reparar nas olheiras de Sophie Miller, você irá pensar que ela é algum tipo que não dorme de madrugada. Outro dia perguntei a ela, Sophie, a que horas você dorme, normalmente? Depois das duas... Porquê? Eu disse Nada, não é por nada, não... É só por curiosidade, mesmo... Sophie Miller assiste a um daqueles programas que passam tarde da noite, e que sempre tem um cara metido a inteligente como entrevistador, e outro cara metido a inteligente sendo entrevistado. Sophie Miller é o tipo de menina que lê o livro da moda em pé no metrô. E que ouve músicas com fones de ouvido enormes. Ela conhece as dez mais tocadas da temporada. E música de um ano atrás, Sophie Miller considera velha. Sophie Miller masca chicletes. Fuma cigarros de sabor. Fala do seu cantor preferido com a desenvoltura de um crítico musical. E conhece de cor todas as suas letras. Sophie Miller é o tipo de menina que senta no chão do aeroporto. E que tem fotos das férias espalhadas por tudo quanto é canto da casa. Ela faz pose numa porção de cartões postais pelo mundo, e em fotos com as amigas dentro do banheiro da escola. Sophie faz uma pose de perfil expondo o lado direito do rosto, e dispara a foto com a mão direita estendida, e inclinada para baixo. No espelho vemos o reflexo de Sophie, e os de suas amigas. Sophie Miller usa aquele tênis que tem uma estrela, e que todos os seus amigos usam. Igual aquele casaco que tem o nome formado por três letras. Acho que eles combinam para não repetir as cores... Cada um tem a sua máquina para que se comuniquem em rede. Eles têm perfis em redes sociais, e os polegares tortos. A maioria dos meninos é viciada em jogos, futebol e pornografia. No almoço todos bebem esse líquido escuro que vicia, e comem hambúrguer naquele restaurante onde a foto do funcionário do mês, com o uniforme que incluí o boné, fica pendurada na parede. Mas um dia, quem sabe, Sophie Miller poderá fazer regimes estranhos na busca pelo corpo ideal. Talvez deixe de comer carne vermelha para só comer vegetais. E quem sabe ela passe a defender os animais. Ou as pessoas que moram nas ruas. Você pode ver Sophie Miller próxima a uma rua de shopping chique de qualquer lugar do planeta. Seja no hemisfério norte, ou no hemisfério sul. Usando um traje básico, de short, blusa branca, sandálias, óculos escuros, e chapéu contra o sol que ela segura para que não voe. Sophie viaja uma ou duas vezes por ano. Você pode até pensar em Sophie como uma menina comum, mas quando a gente era criança, perguntei a Kevin Thompson se ele sabia que um de nossos amigos se dizia apaixonado por Sophie, ele disse: Jacob Smith, não seja idiota! Quem não é apaixonado por Sophie Miller? Sophie e Kevin formam aquele tipo de casal que você não consegue imaginar separado, e não os imaginava junto.
Roberto Carlos na Vitrola...
a mãe de Samuel dizia a ele, Samuel, se o seu pai não voltar pra casa eu me mato! eu taco fogo na casa com você dentro! você vai ver, Samuel! você vai ver! eu mato a gente, Samuel... nós dois! Samuel era muito novinho. era criança, ainda. ele estava no início do antigo primário. Samuel olhava para a mãe, e imaginava a casa pegando fogo, crepitando, com eles dentro. Samuel se lembrava daquele filme em que a mãe do psicopata suava. Samuel não conseguia se lembrar se o psicopata morria queimado no final, ou se a sua mãe morria queimada, ou se a casa do psicopata terminava em chamas, pegando fogo. a mãe de Samuel em nada se parecia com a mãe do psicopata. em alguns momentos ela nem parecia irritada. acabava colocando Roberto Carlos na vitrola, e passando a cera vermelha no chão. a cera era de uma vermelhidão, tremenda. ela passava a cera no chão, como se isso fosse a coisa mais importante do mundo. enquanto Samuel jogava bola sozinho no quintal. ou com o primo que era mais ou menos da mesma idade que ele. quando a mãe de Samuel estava de bom humor, ela não falava nem da morte, e nem da piranha que o pai de Samuel havia arrumado. e aquelas manhãs de sábado de sol eram tranquilas. com Samuel jogando bola no quintal.
domingo, 2 de agosto de 2015
Sangue Bom!
tava jogando a pelada de segunda meia noite na praça. quando ainda tinha algum fôlego para correr. enquanto eu passava eles gritavam, tá na capa! físico de jogador de dominó! tá malhando? pele e osso. aí eu me lembrava daquela música em que o Cartola diz, e quando eu passo, a gurizada pasma, horrorizada, como quem vê um fantasma! e o esqueleto humano, assim vai, cambaleando, quase cai, não cai. eu falei pro moleque no meio da pelada. passa a bola, sangue bom! ele explodiu, caraca! sangue bom! da antiga aí, valeu! ele ficou deliciado em ouvir aquela gíria. talvez ela o remetesse a algum pai, ou a algum tio com quem tenha convivido quando era criança. ou trouxesse a ele lembranças da rua.
Bater Ponto...
todo dia naquele horário nós estávamos sentados naquele portão. então ele passava por nós, e dizia. eu vou bater o ponto. e se encaminhava até o orelhão da esquina. um dia eu disse, nossa, que legal... cool. você bate o ponto por telefone! o pai dele me olhou como se eu estivesse viajando. eu havia achado o máximo uma pessoa trabalhar em casa, e bater o ponto pelo orelhão. era algo que me remetia a grandes empresas de tecnologia. achei aquilo super evoluído. e moderníssimo para a visão mundo cão, que parte de nós brasileiros temos do trabalho. quando cheguei a casa comentei o acontecido com a minha esposa. e fiquei decepcionado ao descobrir que o rapaz não se referia ao trabalho. e sim, ao ato de telefonar para a mesma pessoa todos os dias, ritualisticamente, no mesmo horário. fiquei triste ao vê-lo dia seguinte de manhã cedo de uniforme do trabalho no ponto do ônibus.
sábado, 1 de agosto de 2015
A Crise!
ele não sabe responder ao filho porque existem tantas placas de aluga-se, e vendem-se penduradas por todo o bairro. já que quando eles foram procurar casa para alugar, a mãe havia dito que não havia casas para alugar naquele lugar. agora as placas se multiplicavam uma por cima das outras. então ele diz ao filho, é a crise. o filho pergunta, o quê é a crise, pai? ele corta. quando as coisas estão ruins. e o filho insiste, as coisas estão ruim pai. ele diz, sim, meu filho. as coisas estão ruins. mas elas irão melhorar. então o pai se afasta dizendo. vamos embora, meu filho, e o menino o segue... este outro homem estava assustado. não sabia o quê fazer. ele não era alguém que a cerveja conseguisse ludibriar. depois que passava a ressaca. ele sempre se lembrava dos filhos adolescentes. sendo educados ao léu. e ele estagnado naquele emprego. ele sabia que homens que tiveram tudo na vida acabavam espremidos em quartinhos. os seus medos eram muitos. quando olhava para a filha, ele temia que um dia aparecesse com outra criança nos braços. ele se preocupava ao ver que os seus seios começavam a brotar. e pensava. ou eu tenho dinheiro para dar de comer aos meus filhos. ou eu tenho tempo para educar meus filhos. era assim que ele pensava. imaginava quando o filho fumaria o primeiro baseado. e temia que experimentasse a cocaína. e crack que era o maior sofrimento que ele presenciava em sua vida. ou que assim como ele, que não admitia ser alcoólatra, o filho bebesse todos os dias. meninas também não estavam livres de nada. ele vivia num lugar onde era perigoso andar nas ruas. na escola em que seus filhos estudavam havia de tudo. agora havia de tudo em todo lugar. às vezes ele sonhava que seus filhos batessem com suas cabeças, e se convertessem a alguma religião. ou quem sabe se apaixonassem por alguma coisa que fosse além da violência, e da pornografia, assim como ele era viciado nessas coisas. ele estava espremido na cama igual a um feto. era apenas uma criança assustada, que se pudesse gritaria. mãe!
domingo, 26 de julho de 2015
Tim Maia, Fábio e Hyldon... Velho camarada!
um skatista desce a rampa. Fábio de branco caminhando canta a parte dele. lentamente. o letreiro anuncia Velho Camarada de Augusto César. Fábio dubla a parte com vozes femininas. faz aquela expressão de felicidade em tom agudo. uma porção de figurantes estão sentados ao fundo. Tim Maia canta a sua parte metido num blazer azul, enquanto dança fazendo pose. Hyldon está sentado no meio de umas minas que são o "must" da época. a cor dos olhos de Hyldon está singular. Hyldon veste calça branca e camisa praiana. todos estão tostados pelo sol. eu não acredito que esteja vendo isso! que ano era aquele, mesmo?
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