terça-feira, 14 de abril de 2020

Deus ex machina…

ele é a alvorada dos tempos
ele é o deus Saturno
ele é o sinal dos tempos
ele é o deus Netuno
ele é o Outono
ele é o Inverno
ele é o céu
ele é o inferno

ele é Marte
ele é a guerra
ele é a paz
ele é a terra

ele é o deus dos mares
o deus dos raios e dos trovões
ele é o deus dos céus
o deus dos homens e dos dragões
ele aponta os lados
as estrela e as constelações
ele é o rei dos altares
dos homens e dos leões...

segunda-feira, 13 de abril de 2020

O Acossado de Jean-Luc Godard...


O Acossado
é um sampler de rap. Um groove de funk. Uma frase de jazz que se repete. Assim como o gesto de Humphrey Bogart nos lábios de Jean Paul Belmondo; os cigarros que Michel fuma insistentemente acendendo uns nos outros ou as perguntas que Patricia faz sobre o significado das palavras em francês. O Acossado é um jump cut sem raccord. Nem mesmo os diálogos na boca dos personagens são finalizados. Eles pulam de um assunto para o outro. Algumas vezes nem concluem o que disseram. O Acossado é uma colagem. Ali é possível ver o Dziga Vertov. O cinema clássico americano. O cinema noir percebido primeiramente em França com o seu anti-herói de passado obscuro, e sua femme fatale. Embora Patricia se pareça mais com as adolescentes entediadas de Salinger. Tédio que aliás protagoniza ao dizer que não sabe se é triste por não ser livre ou se não é livre por ser triste. É o existencialismo da sua geração apoiada por Sartre e Camus. Com vinte anos divaga sobre morte e velhice. Com a sua morte precoce a atriz Jean Seberg parece ter cumprido o destino de Patricia. Dizem que perseguida pelo FBI assim como Michel perseguido pela polícia francesa. Morreu cedo e disse que não foi feliz no amor. Eles têm muito da geração perdida dos Fitzgerald`s. Dos Kerouac´s. Como Martin Scorsese disse: é beat demais! O Acossado é um clichê. Um pastiche. Não é um plágio. Cumpre o seu papel de reinventar a partir da tradição. Não é uma ruptura total. Godard exalta o passado ao criar o novo. Não teme o antigo. Michel é desengonçado. Um herói magrelo. Ele não é o galã que sonha ser. Tanto é que um de seus pares diz a ele que meia de seda não combina com casaco de tweed. Assim como Carmen Miranda, Godard não temeu voltar americanizado. Ele desconstruiu para reconstruir Hollywood. Caetano Veloso canta sobre a vontade “fela da puta” de Raul Seixas de ser americano. Michel vai realizar o seu sonho, se Patricia, a menina americana, ficar com ele. E se junto eles forem para a Itália. É lá que está a felicidade. A felicidade sempre está em outro lugar. Michel é a personificação universal do malandro; num momento representada pelo capoeira carioca do século dezenove, no outro pelo compositor de tango do Rio da Prata, e até por Barry Lyndon na literatura. Patricia é o retrato da geração que foi emancipada por um trabalho longo de outras gerações e que percebeu como é chato crescer, pois nem sempre sabemos o que fazer com a liberdade. Michel quer Patricia. Mas ele diz que ela é igual as outras. Passa a mão em sua bunda. Leva tapas. Quer dormir com ela. Pula de uma mulher para outra. Michel avalia as suecas, italianas e brasileiras. Levanta a saia de uma mulher na calçada porque Patricia chamou as francesas de putas por usarem saias curtas. E diz que as mulheres não gostam de quem gosta delas. O romancista Parvulesco diz que existem duas coisas vitais no mundo: “para os homens são as mulheres, e para elas, o dinheiro.” Patricia não tem certeza se quer ficar com Michel. Não dá garantia nenhuma. Quer algo como Romeu e Julieta, ela diz. Patricia é da geração que vai desembocar no maio de sessenta e oito. O Acossado é cheio de referências à cultura de massas. À cultura pop. Marcas de cigarros. De carros. Grifes. Cartazes de cinema. Letreiros eletrônicos. Músicas. Nomes. Pessoas famosas. Jornais. Pinturas. É um filme entulhado de referências comerciais. Assim como o Homem da Câmera de Filmar, O Acossado é o prenúncio dessa linguagem videoclipe popularizada anos depois na capa do Sgt Pepper`s e fincada de vez nos anos oitenta. É a explosão visual da sociedade de consumo. E sobrevive porque ao mesmo tempo é a negação de tudo isso. Os transeuntes observam as cenas a serem filmadas. Aparecem no filme como curiosos. Longe daquele um bilhão de figurantes de Hollywood. E distante do neorrealismo onde tudo era ensaiado com não-atores. Embora Godard filme em locais públicos, assim como os influentes neorrealistas ensinaram aos da Nouvelle Vague. A câmera na mão é um trabalho artesanal. Mesmo na cena em que Michel leva um tiro as pessoas andam como se nada estivesse acontecendo. É a representação da apatia. As dificuldades e os poucos recursos parecem ter ajudado Godard na representação do filme. Hoje ele é um oásis no meio de tanta informação perfeita, de tantas máquinas infalíveis, de tanta gente fazendo tanta coisa certinha, da fotografia no lugar certo, das cores berrantes e lindas que cansam os olhos e a própria beleza. O Acossado sobrevive. Pois através do simples foi capaz de representar o sublime. E de ser o três por quatro de uma geração que previu o futuro, mas que debochou dele, assim como fez piada com o passado.


Bibliografia

17. La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega (263-269) 
Jacques Mandelbaum Coleção Grandes Realizadores, Cahiers du Cinéma, Edição exclusiva para o Jornal Público, 2018.

sábado, 11 de abril de 2020

Bolsonaro e a Revolta da Vacina...

A maior parte da população brasileira apoia Bolsonaro. Tarefa árdua encontrar uma segunda opinião. Com excessão de alguns meios de comunicação que se comportam dignamente neste episódio do Coronavírus, os outros não querem se indispor com o governo, por algum motivo que desconhecemos, nem com à maioria do povo, talvez por causa da audiência. Mesmo no YouTube os vídeos a favor do louco, vencem com tranquilidade. A roubalheira do Lula e do PT fortaleceram o monstro Bolsonaro. Agora, como aconteceu no episódio da Revolta da Vacina em 1904, pois tomar à vacina, tornou-se uma briga moral, iam pegar no braço das mulheres, seriam obrigados, liberdade, fake news, blábláblá, e manipulação política. Foi preciso morrer muita gente para que o povo começasse a tomar à vacina. Os dois acontecimentos são muito parecidos. O triste deste episódio, é que assim como aconteceu com o PT, que é apoiado pela massa da intelligentsia brasileira em seu fanatismo, eu tenho certeza que os bolsonaristas, pensam como Bolsonaro, e acreditam em suas diretrizes. Ou você acha que governos totalitários são construídos por um homem só? É muito dificíl acreditar que todos sejam vítimas da falta de educação, e cultura, e não do seu próprio ódio.

sábado, 4 de abril de 2020

Ladrões de Bicicletas...

Antonio Ricci é um trabalhador da classe operária que se encontra há dois anos desempregado na Itália do pós-guerra. Roma segue arrasada. Existe uma vaga de emprego como colador de cartazes da prefeitura. Mas para a vaga é necessário que se possua uma bicicleta. No início ele pestaneja e diz ao empregador que não tem o meio de transporte. Mas ao se dar conta da situação muda o que acabou de dizer.
Ele tinha uma bicicleta que estava na casa de penhores. Aquele trabalho significa tudo para Antonio. É a salvação da sua família. Ele está obstinado e diz ao homem que não pode esperar tanto tempo novamente.
Ao encontrar com Maria, Antonio conta a ela sobre a situação em que se vê envolvido. Na manhã seguinte terá de apresentar-se no trabalho. A mulher toma uma decisão. Puxa os lençóis da cama e os outros que eles têm guardados e que nem foram usados. E diz a ele que irão trocá-los no penhor.
Conseguem recuperar a bicicleta no prego. A alegria do filho Bruno não é menor que a do casal. Ele é apenas uma criança e já tem o seu trabalho regular. Com todo o empenho o menino ajuda o pai a preparar e limpar a bicicleta para o dia seguinte.
Feliz da vida Antonio apresenta-se no emprego. Mas ao colar um cartaz do filme Gilda com Rita Rayworth, a bicicleta que estava encostada é roubada. Antonio corre atrás do homem, mas não consegue alcançá-lo em sua corrida.
A partir daí, Antonio e seu filho vão em busca da bicicleta, na Roma abatida após o conflito, parece ser impossível sobreviver para pessoas como as que pertencem à família Ricci.
Bruno trabalha como um adulto. Se movimenta como um homem, e as suas preocupações estão longe de ser enquadradas como infantis. Pode ser encarado como parte da infância de uma época distante. Mas também, como meninos e meninas da atualidade, que em algumas cidades do mundo ainda trabalham nas ruas. Aqui não existem os culpados, ricos ou poderosos. Apenas os pobres.
Além do empregador da prefeitura, o poder público é representado pela presença de policiais. Antonio diz a um deles, você não sabe o que essa bicicleta representa para mim. Ele é recebido na delegacia por um homem que fica furioso por alguém pedir que procurem uma bicicleta. Eles têm mais o que fazer. Percebemos o quanto é comum o roubo das bicicletas. Existem ruas com feiras onde os ladrões vendem as suas peças. Se a polícia for sair em busca de todas as bicicletas que foram roubadas fará apenas isto.
Antonio persegue um velho que conversou com o rapaz que roubou a sua bicicleta. Adentra uma igreja onde é servida sopa e onde cortam o cabelo e a barba das pessoas, mediante a participação na missa. Bruno briga com o pai pois deseja comer. Leva um tapa no rosto num momento de destempero. O homem a quem Antonio pede ajuda, e que parece exercer liderança na comunidade em que vive, é um simples trabalhador da recolha do lixo.
O tapa que Bruno levou será amenizado com um momento de extravagância. Eles irão comer pizza, e beber o vinho que o pai oferece ao garoto. Um menino que toca uma espécie de sanfona leva um chute de um colador de cartazes. Um homem expulsa Bruno bruscamente enquanto ele procura as peças da bicicleta. Um padre dá um cascudo em sua cabeça quando ele abre o pano do confessionário. Outro oferece coisas a Bruno e parece querer levar o garoto para uma cilada.
Antonio quase é linchado pela população da rua em que o ladrão de sua bicicleta mora. É cercado quando Bruno consegue chamar um agente. Finalmente Antonio consegue confrontá-lo com um policial que faz uma série de exigências para prender o infrator. Ele quer testemunhas. Antonio desiste. Não vai conseguir recuperar a sua bicicleta.
É domingo. Dia de futebol. Antonio vê uma multidão de bicicletas no centro da cidade. Ele pede a Bruno que volte para casa. Vai pestanejar durante muito tempo. Andando de um lado para o outro na frente do garoto que parece perceber as intenções do pai. O menino vai pegar o bonde sozinho. Não conseguiu chegar a tempo. O pai foi roubar uma bicicleta. Não consegue fugir. É perseguido pelo dono da bicicleta, e por uma multidão que grita em sua direção. Novamente é cercado e quase espancado. É acusado de roubo. A situação inverteu-se aqui. Agora é ele quem precisa roubar.
O menino vê a situação do pai. Entra em desespero. O homem tem a mesma atitude que Antonio teve anteriormente. Não vai denunciá-lo pelo furto. É um pobre diabo. Antonio ganha uma lição de moral. Que exemplo ele quer dar para o seu filho? De Sica mostra com este filme como a situação social e o desespero podem transformar uma pessoa. É um filme poético em sua crueza. Existe um ditado no Brasil que diz, a ocasião faz o ladrão. Neste caso a frase fala sobre a oportunidade do delito fácil, e sem punições. Aqui ela parece combinar com a necessidade instada pelo desespero.

Vô Tá On-Line!

De início foi assim começou com o bate papo
Um moleque me disse dá mulher igual mato
E disse que era a grande invenção do homem
Internet banda larga mais que telefone
Quando eu fui ver, estava viciado
O silêncio era quebrado, o barulho do teclado
Todo dia assim, o dia inteiro…
Levantava pra comer ou então ir ao banheiro
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
A extensão do meu corpo era um computador
Para teclar comigo só mesmo com provedor
O Sofrimento do meu pai foi ficando tamanho
Eu não comia, não tomava banho!
Irreconhecível, um ser virtual…
Minha mãe quando me viu desmaiou passando mal!
Só que o pior viria com o tempo
Com um famoso site de relacionamento
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
O meu pai foi para o quarto e quebrou o monitor
Eu sofri tanto perdi o meu grande amor
Tive que roubar para sustentar meu vício
Tive que sair de casa que momento difícil
Cinco da manhã na porta da lan-house
Com a mão tremendo para encontrar o mouse
Ia para outra quando aquela era fechada
Uma que ficasse aberta até de madrugada
Até o próximo clique
Até o próximo time
Pega meu nick
Vô tá online
Nicotina vicia mais que cocaína
E internet muito mais que nicotina
Eu que era ateu pedi a Cristo e a Buda
E frequentei grupo de autoajuda
Ninguém vai te dizer que internet vicia
Tá aí o meu testemunho
A vida que eu vivia
Ninguém vai te dizer que o excesso faz mal
Pois assim como a cerveja é uma paixão nacional!

sexta-feira, 3 de abril de 2020

A Monika de Bergman...

Monika é a puta. A Vagabunda… A piranha! A nora que nenhuma sogra deseja. A destruidora de lares. Desviadora de destinos e índoles. A vadia! Harry é à sua presa mais fácil. Monika é à adolescente eternamente entediada; que acende o cigarro logo que acorda, e que mastiga o chiclete enquanto a tia do noivo fala. É uma espécie de Madame Bovary em seu tédio profundo, e depressão. Ela tem um ataque dos nervos quando começa a chorar naquele barco. Monika quer mais. Monika sonha ser uma mocinha do cinema clássico americano, onde galã encantado sempre aparece. Mas, volta e meia tem de voltar para o muquifo onde dorme com à família; à sua triste realidade de menina pobre, completamente diferente daquela exposta na tela, no breu do cinema ao fundo onde acontecem os amassos. Mas ela é uma Lolita encapetada. Tem o diabo no corpo! Aquela vida é um tédio. O que mais Monika deseja além de Harry? O príncipe que abandona tudo para fugir com ela? O que mais se pode desejar além de uma amor e uma cabana? Nada. Ninguém sabe. Quando chega lá Monika já deseja outra coisa. Parece até essas adolescentes atuais que sonham o tempo todo com a festa, e quando chegam na festa enfurnam a cara no celular e só levantam o rosto para bocejar de vez em quando. O objectivo foi alcançado. Não há mais caminho a percorrer. É uma fome de tudo. Uma insatisfação infinita. A libido nunca é saciada. Os desejos são mórbidos. Quanto mais se deseja mais se vai desejar. Somos seres insatisfeitos por natureza. Harry aceita a vida. Ele gosta dela. Ela diz: saia! Ele sai. Do emprego. Da sua vida. De tudo. É o corno não conformado. Monika agora quer um casaco novo. Monika tardiamente descobriu que não tem nada. Monika diz que quer se divertir. Ela vai dar para Lelle novamente. Àquele vagabundo do bairro onde ela cresceu e por quem viverá apaixonada. Monika vai abandonar o bebê. Os bebês só são bonitos nos filmes. São fofinhos. Berrando de madrugada são insuportáveis. Harry está resignado. Vai cuidar da criança. Talvez entre para uma igreja e case com uma outra mulher menos esbelta que Monika. Talvez ela não se mantenha em forma com o passar do tempo. Talvez o seu corpo irresistível que levou Bergman à loucura naquela praia, ceda ao tempo. Um dia desses, talvez, Monika esteja sentada num bar, e seja aquela senhora gordinha ao canto. Longe dos seus dias de glória. Com a voz enrouquecida. O cigarro entre dedos. Vai lembrar de Harry, e mostrar fotos para alguém. E dizer, ele cuidou do meu filho, o pai do meu filho é bom! E Harry vai ter uma família feliz. Ou quem sabe não aconteça nada disso, e Monika vire uma carola com uma família feliz assim como à de Harry. Talvez seja Harry que comece a beber, enquanto a sua criança anda sozinha pelas ruas. Talvez ele morra de cirrose. Talvez o destino seja diferente de tudo isto. Pois assim como o cinema de Bergman... A vida um final sempre aberto!

Poeminha a Favor...

Ainda hoje, na Crimeia, alguém dormiu com o seu amor.
Ainda hoje, na Galileia, alguém acordou com estupor.
Ainda hoje, no Butão, alguém soube o que é felicidade.
Ainda hoje, no Japão, alguém gritou por liberdade.
Ainda hoje, em Amsterdã, alguém se disse feliz.
Ainda hoje, no Irã, alguém fez o que quis.
Pois existe um outro mundo,
Do lado de lá, outra cidade.
Nem sempre o que acontece no Brasil…
pode ser encarado, como verdade.
Pois mesmo longe, em Chernobyl,
existe outra realidade.