sexta-feira, 24 de abril de 2020

Como Qualquer Outro Moleque da Minha Rua...

Eu era apenas um moleque sentado numa calçada
Eu era apenas um moleque sentado naquele meio-fio
Como qualquer outro moleque da minha rua
Que tomava banho e que pegava girino no rio

Eu era apenas um moleque que jogava pique-lata
Eu era apenas um moleque que gostava de jogar futebol
Como qualquer outro moleque da minha rua
E que se cortava com a linha de cerol

Mas isto foi antes da moda e da roupa
E de chegar em casa já de manhã
Da música tosca e do beijo na boca
E ter entredentes a pastilha de hortelã

Eu era apenas um moleque achava tudo normal
Eu era apenas um moleque domingo ia à praça
Como qualquer outro moleque da minha rua
Que jogava pelada e quebrava vidraça

Eu era apenas um moleque cheio de figurinhas
Eu era apenas um moleque de inteligência razoável
Como qualquer outro moleque na corrida de chapinha
E que detestava a dita cuja tal comida saudável 

Mas isto foi antes da moda e da roupa
E de chegar em casa já de manhã
Da música tosca  e do beijo na boca
E ter entredentes uma pastilha de hortelã

quinta-feira, 23 de abril de 2020

O Primeiro Livro...

naquele dia eu tinha ido à escola. não lembro se a professora havia pedido para comprar o livro. a "tia" como se dizia naquela época. não sei se foi a tia Cristina ou a tia Nelli, e também não me lembro se nós tivemos que comprar ou se a professora deu o tal livro. mas a questão era que embora minha vida escolar tenha sido um desastre. mais por culpa da escola. eu tinha insônia naquela época. depois que a mãe do último moleque o colocava para dentro, eu entrava. era sempre o último a entrar. eu morava na casa da minha avó. não era neto criado por avó. entrava e comia um pão ou dois que o meu tio que trabalhava na padaria trazia. tomava um café e ia dormir. naquela época havia a extinta TV Manchete que encerrava suas transmissões dia de semana com filmes nacionais. películas maravilhosas que são de uma época em que o cinema nacional não tinha dinheiro. antes disso havia o Documento Verdade, documentários que mostravam a realidade, e que eram impróprios para uma criança da minha idade. Assim como os filmes. mas graças a Deus a minha avó já estava dormindo. eu assistia às atrizes das novelas nuas, os galãs xingando palavrão. aassisti Pixote, Macunaíma, Barra Pesada, Beijo na Boca, Lúcio Flávio O Passageiro da Agonia, Rio Babilônia e etc. só para citar alguns. no fim da programação diária entrava o sinal sonoro. blábláblá estamos encerrando nossas transmissões. o início era com hino nacional. eu sou da época em que entrava aquele cartaz da censura da ditadura, camarada. Foi numa noite dessas, que eu não conseguia dormir, e que eu li um livro durante à madrugada inteira. Nunca mais a minha insônia teve o mesmo impacto. Nunca mais a minha vida foi a mesma. Como dizem.

Não Lavar a Calçada...

Não lavar a calçada
Não lavar a varanda
Não lavar o carro
Pois mesmo sujo ele anda
Pior do que morrer de sede
É de sede ter de morrer
Tem calçada encharcada
E tem a cara lavada
Onde não tem cultura
Ninguém tem nada
Quando é o ponto final
O último pingo faz falta
A última gota derramada
É menos um copo d’água
E não vai ter cerveja
Para você esquecer
Igual Luiz Gonzaga
Tem de rezar para chover
Para o sol cair
E para água descer

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Um Bairro Ali da Zona Norte...

A zona norte vai comigo em reverberação.
O meu lugar de fala, a minha identificação.
No jeito de bailar, na maneira de dançar.
Quem conhece sabe, onde fica o meu lugar.
Um estilo de vida, uma saudade mediúnica.
Na Conde escola pública, uma turma única.
Aquela gíria, que só conhece quem é cria.
Que em mil anos, nenhum outro saberia.
Encontro das águas, asfalto e favela.
Nada caricato, como mostra a novela.
Onde se diz fulano, foi criado comigo.
Um vizinho é um irmão, um irmão é um amigo.
Com todo o respeito, ao resto da cidade...
Mas a zona norte... A zona norte sabe!
No dia em que eu esquecer de onde eu vim.
Você pode ter certeza não respondo mais por mim!
Onde a rua se torna um espaço comunitário.
Onde você só fica só, se você for um solitário.
Mas nem todo filho teu tem este mesmo sentimento.
ZN na identidade, Baixada no documento.
Tem quem diga que é azar,
Eu acho que é muita sorte!
Ter sido criado na Penha....
Um bairro ali da zona norte!
No resto do mundo eu sou um estrangeiro.
A minha pátria é à Penha no Rio de Janeiro.
Tudo que eu aprendi e tudo o que eu vivi.
Começou na Couto a quem pertence a ti.
Sair e falar com todo mundo na rua.
Peculiaridades, eu sei, cada lugar tem as suas.
Eu que sou umcosmopolita, um homem do mundo.
Não voltarei para ti, pois preciso seguir meu rumo.
Mas se algum dia pusesse os pés em sua praça.
Alguém sorriria onde o sorriso é de graça.
Eu que sou um ser errante, não posso ficar parado.
Mas nem tempo, nem distância, terão nos distanciado.
Pois acredito que você, é parte do meu ser.
Não há como falar de ti sem ter um clichê.
E mesmo estando aqui, em outro continente.
Alguém há dizer aquilo é gente da gente.
Por isso não me envergonho, de ser um suburbano.
O que nós queremos ser, não anula o que nós somos.
Eu sei que minhas rimas em ti foram espelhadas.
Nos lugares onde andei, nas suas ruas e calçadas.
Tem quem diga que diz que é azar...
Eu acho que é muita sorte!
Ter sido criado na Penha,
Um bairro ali da zona norte!

terça-feira, 21 de abril de 2020

A Flor Medicinal...

A tua língua com gosto de éter
Teu jaleco branco que encobre o céu
Teu batom vermelho da cor do suéter
E você me dizendo que estou num hotel

O sangue que corre nas minhas veias
O fluxo de pensamento das tuas teias
As vias expressas do meu corpo
A maca da tua cama que incendeia

Pitada de sal na sopa
Me dá o veneno na boca
Respingando na roupa

Oh! Minha flor medicinal
Quem me dera passar passando mal
Para no final morrer com o teu beijo
Deitado em teu leito de hospital

Eu que sinto dor e não sofro
Porque o sumo escorre do corpo
O soro que evita o último sopro
Se não for o teu gozo eu estou morto

É você a plantonista louca
Eu quero mais da tua saliva
Que me fez viajar no coma
E que tem me inspirado lida

Pitada de sal na sopa
Me dá o teu veneno na boca
Respingando na roupa

Oh! Minha flor medicinal
Quem me dera passar passando mal
Para no final morrer com teu beijo
Deitado em teu leito de hospital

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Corrida de Chapinha...

Num sei se você lembra do cinema poeirinha
Ou da minha escola Santa Terezinha
Num sei se você lembra do nosso pique bandeira
Como se faz rabiola ou então atiradeira

Num sei se você lembra como é que pega rã
Ou como se faz um carrinho de rolimã
Lembra do hi-fi da festinha americana
Ou de como se começa uma nova gincana

É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Hoje a criança brinca com o computador
É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Mas é que às vezes é tão bom lembrar do tempo que passou

Num sei se você lembra da corrida de chapinha
Ou como se faz uma caixa de bombinha
Num sei se você lembra como se faz garrafão
Do recorde do Enduro ou do carrinho de fricção

Num sei se você lembra da capa de bate-bola
Quem ficava de gelo ou ficava de gaiola
Num sei se você lembra como se joga carniça
Ou do Recreio no Ariosto macarrão com salsicha

É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Hoje a criança brinca com o computador
É que está tudo mudado
É que tudo mudou
Mas é que às vezes é tão bom lembrar o que passou

A Modernidade Cinematográfica Presente em À Bout de Souffle de Jean-Luc Godard...

Índice


3. Modernidade Cinematográfica

3.1 Renovação Geracional

3.2 Independência Industrial

3.3 O Filme Como Obra Aberta

3.4 Reivindicação do Diretor Como Autor

3.5 Ideologia e Moral

3.6 A Cooperação do Espectador

3.7 Novas Tecnologias

4. As Temáticas dos Novos Filmes dos Anos Sessenta

4.1 Temática Pessoal Individual

4.2 A Infância

4.3 Mitologia Sobre a Juventude

4.4 Questionamento da Família

4.5 Instituições Educativas

4.6 Aprendizagem Sentimental e Sexual

4.7 Relações Entre Pares

4.8 O Filme Dentro do Filme

4.9 Considerações Finais

5.0 Bibliografia


3. Modernidade Cinematográfica


3.1 Renovação Geracional

Usando como base o capítulo 17, La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega, publicada pela Alianza Editorial, é possível perceber que o autor de À Bout de Souflle, Jean-Luc Godard, pode ser enquadrado no que Noriega chama de Renovação Geracional. Pois Godard, realizador pertencente a Nouvelle Vague francesa, também não frequentou a escola de cinema.
Nuevos cineastas se han forma viendo mucho cine en las sesiones de las filmotecas y escribiendo críticas y ensayos.” (Noriega, p.264). Segundo Jacques Mandelbaum: “… ele passa mais tempo nos cineclubes e na Cinemateca Francesa, chumbando no exame de acesso da Escola de Cinema, o IDHEC.” (Mandelbaum, 2018, p. 11).
Godard escrevia para Cahiers du Cinéma, revista fundada por André Bazin, e que possuía em seus quadros; Claude Chabrol, François Truffaut, e Jacques Rivette, críticos que se tornariam fundadores da Nouvelle Vague. Da mesma forma que os neo-realistas italianos romperam com o cinema fascista, os membros da Nouvelle Vague iriam ao encontro de um novo cinema que representasse suas ambições, e não aquele dos seus predecessores que imperava em França. Ao contrário do Novo Cinema alemão; que lutaria por um cinema que fosse uma alternativa ao cinema americano, Godard e os seus compatriotas, buscavam em seu país, um cinema que fosse menos intelectual, e que não recusasse os autores americanos. Humphrey Bogart é uma inspiração para à personagem Michel de À Bout de Souflle, que repete o seu gesto de passar os dedos nos lábios enquanto persegue Patricia, a menina americana. Assim como o filme faz reverência ao cinema noir americano, reconhecido como estilo em França primeiro.

3.1 Independência Industrial

17 de Agosto de 1959 marca o primeiro dia de rodagem, que ficam concluídas a 19 de Setembro, mas que envolveram apenas 20 dias úteis, o que revela o respeito muito relativo do realizador pelo seu plano de trabalho. Um orçamento de um terço do que era prática na altura, uma equipa reduzida…” (Jacques Mandelbaum, p.17).
À Bout de Souflle foi rodado da mesma forma que alguns clássicos do cinema Neo-Realista. Assim como De Sica, em Ladri di Biciclette, ou Luchino Visconti em seu La Terra Trema. Câmera na mão e equipe reduzida. “Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça…” viria a ser o lema do Cinema Novo brasileiro. Em O Bandido da Luz Vermelha de Rogério Sganzerla, filme do movimento sul-americano, fica evidente a influência de À Bout de Souflle.
“(..) Y de directores-productores que frecuentemente financian sus películas con capitales familiares.” (Noriega, p. 264).
Visconti vendeu móveis de sua família para filmar La Terra Trema. O Novo Cinema alemão viria a defender o associativismo e o financiamento alternativo.
Sin embargo, los nuevos cines, salvo excepciones, no interesaron al público, y tuvieran malos resultados en la taquilla.” (Noriega, p. 264).
Os realizadores não tinham como distribuir os seus filmes e divulgar com a mesma intensidade do cinema americano. Da mesma forma que o Neo-Realismo italiano não teve um grande público, eles também sobreviviam dos cineclubes e festivais de cinema. Como foi o caso de À Bout de Souflle, ganhador em 1960 do prêmio Jean-Vigo de Melhor Realizador do Festival Internacional do Filme de Berlim.

3.2 O Filme Como Obra Aberta

Por ello se rechaza el relato novelesco de argumento muy trabado, con personajes definidos y una secuenciación rigurosamente causal; por el contrario, el guión es un apunte abierto a la improvisación y al hallazgo en el proceso de rodaje y de montaje. Hay una nueva aproximación a los textos literarios que son adaptados de modo creativo, sin el academicismo que imperaba en el cine comercial.” (Noriega, p. 265).

À Bout de Souflle é baseado num argumento de François Truffaut, de onde o seu realizador extraiu apenas o fio condutor da história. As filmagens foram improvisadas com Godard dizendo as falas para os atores. A base do filme é o improviso. Assim como fez Luchino Visconti em seu La Terra Trema, em que escrevia os diálogos durante a rodagem, do filme inspirado no livro I Malavoglia, de Giovanni Verga, que seria um documentário, e acabou por se tornar uma longa-metragem de ficção.

3.3 Reivindicação do Diretor Como Autor

“La Cámara como médio de expresión, la mirada a la realidad propia del cinéfilo”, “… se oponen al modo de significación del cine clásico – la transparencia narrativa y el montaje invisible.”, “… el salto de eje e la ausencia de raccord.” (Noriega, p. 265)
Godard é um cinéfilo que se fez autor. É possível ver a sua marca em À Bout de Souflle, filme que ficou conhecido pelo uso que fez do jump cut, e por sua ausência de raccord. É notória à assinatura do cineasta na montagem. Mesmo nos diálogos do casal Michel e Patricia, existem perguntas que ficam sem respostas, e frases que não são concluídas. No filme Câncer de Glauber Rocha; do Cinema Novo brasileiro, o público percebe até mesmo um microfone.

3.4 Ideologia e Moral

En los nuevos cines hay un rechazo del didactismo ideológico propio del cine que expone metáforas políticas o plasma héroes positivos; pero ello es compatible con el compromiso ideológico y el cine mititante de signo anticapitalista y liberador-iszquierdista…” (Noriega, p. 265).

Godard utiliza um anti-herói de filme noir com o seu passado sombrio e sua femme fatale. Como um boxeur de filme noir, Michel dá socos no ar, mas é apenas marginal. Um ladrão contumaz que vive de roubos que pratica a todo o momento. Está preocupado apenas com o presente. Patricia por sua vez sofre com os seus dramas existenciais, fala sobre a morte e a velhice. Parece um personagem existencialista de Camus ou Sartre que estavam em voga nos anos sessenta. Assim como Maria Braun do alemão Fassbinder, estes personagens pairam entre o certo e o errado de acordo com as suas necessidades. Estão afundados num mundo cruel, e não por culpa própria. Eles reagem ao que à sociedade lhes oferece. Godard está próximo dos neo-realistas que romperam com a mitologia nacionalista e o heroísmo guerreiro. Da mesma forma que os personagens de Rio 40 Graus de cinquenta e cinco, obra considerada precursora do Cinema Novo brasileiro, e os marginalizados de Glauber Rocha de Deus e o Diabo na Terra do Sol.

3.5 A Cooperação do Espectador

“… la construcción de un nuevo espectador, más colaborador con el texto fílmico, ante el cual ha de reflexionar para hacer su propria exégesis.” (Noriega, p265).

O novo espectador do cinema é como o novo cineasta. Ele lê revistas especializadas em cinema e frequenta cineclubes. Godard e Glauber Rocha escrevem e pensam sobre cinema antes de produzirem suas obras de estreia. Este novo público, pensa o cinema, e não se importa que ele siga outro caminho para além daquele trilhado pelo cinema clássico. Os novos cinemas têm muitos finais abertos, dos quais os seus espectadores podem chegar às próprias conclusões. Um dos exemplos é Roma Città Aperta, de Roberto Rosselini. É um público aberto a novas experiências estéticas, como aquelas que foram vistas na montagem de À Bout de Souflle.

3.7 Novas Tecnologias

“Un factor importante en el surgimiento de los nuevos cines es la evolución de la tecnología con las cámaras ligeras y la toma de sonido direto.” (Noriega, p265).

Da mesma forma que o Neo-Realismo italiano , a Nouvelle Vague francesa beneficiou-se com as novas tecnologias do som direto e da câmera portátil.

“Travelling feito a partir de uma cadeira de rodas, a transformação de uma película cinematográfica ultra-sensível, a câmara escondida num triciclo de um carteiro e um excelente conhecimento do terreno.” Página 20. Jacques Maldebaum Sobre À Bout de Souflle.

4. As Temáticas dos Novos Filmes dos Anos Sessenta

A partir de um enquadramento temático de José Enrique Monterde que Noriega Cita, podemos mostrar À Bout de Souflle se relaciona com determinadas temáticas.

4.1 Temática Pessoal Individual

Protagonizados frecuentemente por antihéroes y seres más o menos marginados en busca de su identidade.” (Noriega p. 268)

Michel é o anti-herói e Patricia busca por sua identidade. A sua indecisão é notória em seu discurso existencial, ela contesta a si mesma: “ Não sei se sou triste porque não sou livre. Ou se não sou livre porque sou triste.” Patricia não sabe se gosta de Michel. Se quer ficar com ele. Ela não tem convicção sobre que rumo dar a sua vida. Mesmo de entregar Michel para à polícia, ela parece se arrepender.

4.2 A Infância

“Y en la que se encuentran claves de la identidad del sujeito…” (Noriega, p.268)

Das personagens de À Bout de Souflle vemos apenas Michel relembrar a infância ao falar de um passeio com um avô, e do seu pai que seria clarinetista. Diz isto quando Patricia põe um disco. Mas pelo tom de mitificação com que ele fala do pai, não fica claro se é sério, ou se é apenas mais uma troça sua. Michel ao passar por uma praça, diz num tom de saudade que é o lugar onde nasceu, e que construíram prédios e estragaram tudo por ali.

4.3 Mitologia Sobre a Juventude

La incorporación de la juventud a la vida social, laboral y de consumo en marco del desarrolismo de los años sesenta…” (Noriega, p.268)

Patricia é um exemplo do ápice de uma cultura juvenil que teve o seu marco nos anos sessenta. Sendo iniciada décadas antes. Ela tem vinte anos e mora sozinha em outro país. E todo o seu estilo de vida corresponde ao de muitos adolescentes da sua época, que adquiriram uma forma própria de viver através da cultura, da moda, e de um estilo de vida identificado com sua geração.

4.4 Questionamento da Família

“En general hay una crítica al autoritarismo y a las incomprensiones de la família que han llevado a diversos traumas.” Noriega, p.268)

Nesta temática À Bout de Souflle não se enquadra. Pois os personagens são muito evasivos sobre o passado. O filme é um recorte de um momento de suas vidas. Num muro está escrito: “Viver perigosamente até o fim.” É isto que Michel faz quando recusa fugir. O único comentário concreto sobre o passado é quando Patricia lê no jornal que ele era casado. Michel diz que abandonou a mulher pois era louca. Não sabemos se ela é a mulher que aparece na primeira cena do filme, que ajuda Michel a roubar um carro, e que pergunta se pode ir com ele. Michel diz que não. Logo após matar o policial Michel vai ao apartamento de uma menina a quem pede dinheiro. E ao contar uma história de que trabalhava em Roma nos estúdios Cinécittà, ela pergunta se na verdade ele não era gigolô. Quando Michel vai ao apartamento de Patricia, ele procura por dinheiro, e não encontrando faz um comentário que mulheres novas nunca têm dinheiro. Quando uma menina tenta vender a ele um exemplar da Cahiers du Cinéma, e pergunta se Michel gosta da juventude, ele responde que não, que prefere as velhas. Não podemos dizer categoricamente que estes fatos estejam relacionados, e que Michel explorasse a esposa, e que esta era mais velha. Mas é uma possibilidade. Esta mulher que não conhecemos é a única informação real da vida pregressa da personagem.

4.5 Instituições Educativas

“Las peliculas sobre colegios, internados os reformados que subrayan o autoritarismo…” (Noriega, p.268)

Outra temática que não é explorada em À Bout de Souflle, mas que está fortemente presente no filme de François Truffaut, outro membro da Nouvelle Vague, que escreveu o argumento de À Bout de Souflle, Les 400 Coups, onde o personagem principal, Antoine Doinel se revolta contra uma dessas instituições.

4.6 Aprendizagem Sentimental e Sexual

“En el desequilíbrio afectivo y en la iniciación sexual…” (Noriega, p.268)

Patricia não sabe que caminho seguir tanto em sua vida sexual quanto afetiva. Ainda sente muitas dúvidas. Mesmo em relação a Michel. Tem horas que diz querer ficar com ele, depois se afasta. Quando eles conversam em seu quarto, ela diz querer viver com ele como Romeu e Julieta. Da mesma forma que pergunta porque ele está atrás dela, ou conta que saiu com o repórter. Ela vive a dualidade. Entrega Michel à polícia, mas corre atrás dele como quem teme que aconteça algo ruim com o parceiro.

4.7 Relações Entre Pares

“El adulterio y los tíos amorosos aparecen con un tratamiento renovador, alejado de los postulados dramáticos del cine clásico.”  (Noriega, P.268)

O casal de À Bout de Souflle representa a libertação sexual ocorrida nos anos sessenta por parte da juventude. Patricia vê o sexo de maneira prática, Michel também. Eles não escondem um do outro que têm outros parceiros. Michel fala o tempo todo das suas preferências sobre mulheres. Ele pergunta a ela sobre o jornalista, mas tudo sem alarde, sem dramas ou cenas de ciúmes. O filme é um marco daquela geração por representar o comportamento vigente e longe de julgamentos. Ela é livre e usa o seu corpo como bem entende e não dá espaço para que Michel cobre isto dela, e ele também não parece ter esta pretensão. Michel diz abertamente querer dormir com Patricia, e em nenhum momento ela o recrimina por isto. Eles contam um para o outro o número de parceiros sexuais que tiveram.

4.8 O Filme Dentro do Filme

Reflexiones y la significación fílmicas y homenajes a los géneros.”  (Noriega, p. 269)

À Bout de Souflle exalta o estilo noir. Existe a obsessão da personagem em ir para a Itália, que deu a Nouvelle Vague o Neorrealismo. Uma inspiração com os seus cenários naturais, a sua câmera na mão, o filmar na rua, a inclinação documental, e os seus atores naturais. Tudo isto está em maior ou menor grau em À Bout de Souflle. A menina que Michel visita diz que trabalhava num estúdio de cinema. Michel diz que trabalhou nos estúdios da Cinécittà em Roma. Ele vê um cartaz do filme The Harder They Fall, um filme noir com o seu ídolo Humphrey Bogart, e que fala sobre boxe. Michel diz para Patricia que não é bonito, mas é um boxeur. E ainda é possível ver ao fundo, numa das cenas, um letreiro que anuncia Hiroshima Mon Amour de Alain Resnais.

4.9 Considerações Finais
O autor José Enrique Monterde, citado por José Carlos Sánches Noriega, aborda outras três temáticas que não serão exploradas no presente artigo, por entendermos que não são questões presentes na obra À Bout de Souflle de Jean-Luc Godard. São elas: Contexto Político, Revisão do Passado Histórico, e Debate Ideológico.

5.0 Bibliografia

17. La Modernidad Cinematográfica Y Los Nuevos Cines, da obra Historia Del Cine de José Carlos Sánches Noriega (263-269)
Cinema Contemporâneo: Román Gubern, 1980. Salvat Editora do Brasil
Jacques Mandelbaum Coleção Grandes Realizadores, Cahiers du Cinéma, Edição exclusiva para o Jornal Público, 2018.
Luchino Visconti: Alain Sanzio / Louis Thirard, 1988. Publicações Dom Quixote
Luchino Visconti: Clareta Tonetti, 1983. Columbus Film