domingo, 28 de janeiro de 2024

Cidade Nova

A motivação para a escrita veio quando por curiosidade passei a ler sobre a história do samba e cheguei às suas raízes. Desci à Belle Époque com o seu encanto e as suas mazelas. Isso com o apoio de inúmeros autores; entre pesquisadores, jornalistas, cronistas, memorialistas, romancistas, e poetas. Inclusive conversei com guias e malandros vivos. Creio ter escrito do ponto de vista dos pobres; da malandragem, dos capoeiras, dos moradores dos cortiços, dos moradores dos morros, dos artistas, da cidade cosmopolita, das mulheres da vida, e dos boêmios. Além da inclusão de personalidades importantes da época e personagens de sua ficção. Com exceção de alguns autores daquele tempo, não conheço romances produzidos com esse enfoque. Não estou dizendo que não existam. O livro abrange o final do século dezenove e início do século vinte. Mas os acontecimentos nele resgatados nem sempre são fiéis ao tempo histórico. Por isso não pode ser definido como histórico e muito menos jornalístico. Nem era essa a minha intenção. Não sou historiador ou jornalista. A proposta era escrever um livro em que as pessoas pudessem viver por alguns momentos as fantasias e a realidade sombria pouco conhecida daquele tempo do centro da cidade do Rio de Janeiro. Após uma pesquisa de dez anos para Cidade Nova, eu perdi toda a mágoa que sentia por minha cidade ser tão desigual e violenta. Serviu de consolo saber que ela sempre foi assim.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Eu leio Henry Miller escondido

Henry Miller é o escritor no qual eu mais identifico a liberdade; a celebração de viver, e a vontade humana. Extremamente sincero expôs as suas incongruências e as da mente dos outros seres humanos num pensamento verdadeiramente livre e independente de influências externas que cerceassem as suas conclusões. Por ser um escritor completamente honesto durante a sua vida foi censurado e boicotado. Hoje é simplesmente impossível sussurrar seu nome em meio ao apagamento sofrido por artistas sem ouvir as recriminações da falta de diálogo. É uma pena. No meu caso, os seus livros sempre foram um apoio nos momentos mais esdrúxulos em que faltava forças para seguir. Junto de seu ânimo inquebrantável ajudou a me tirar do buraco diversas vezes. Com o avanço da idade se tornou um homem sábio. As suas últimas obras são de uma sabedoria suntuosa. A coleção dos seus livros se foi com a nossa biblioteca quando viemos embora. Mas a minha esposa me presenteou com este Plexus que eu camuflado vou reler em meu bunker.


É melhor falar...

É melhor falar. Sabemos que a maioria não entende ou não está preparada para ouvir. Mas o pouco apoio que se recebe já vale a pena. Fraco é o que se fingindo de forte não se fortalece, e sozinho implode. Não viva sob uma carapaça que não é sua. Ela pode pesar. Aparentar força não é ser forte. Mostrar fraqueza não é ser fraco. Pode vir a ser robustez.

domingo, 21 de janeiro de 2024

Transtorno Bipolar

Digo como me sinto. A mulher no telefone diz que precisa mandar uma ambulância. Não quero causar transtorno. Ela insiste que é o seu trabalho. Os enfermeiros chegam e eu repito a mesma cantilena que vou repetir na triagem, e depois com a médica. Fui parar na urgência umas quatro ou cinco vezes num período de meses. Tomo tantos remédios que o meu corpo parece uma farmácia ambulante. A doutora diz que a única coisa que pode fazer por mim é ajustar os medicamentos. Mas, de novo? Ela me pergunta como pode me ajudar. Não sei. As religiões, a filosofia, os vícios, e os grupos de autoajuda também tentaram. Eu torço para que a medicina evolua. Existem boatos sobre novas drogas e impulsos elétricos milagrosos. Sonho servir de cobaia para algum novo tratamento. Desde criança que vivo neste inferno. Uma vez tentei acabar com esta dor. Não deu certo. Meu problema não é a morte, se é isto que esta doença pensa; é a vida. E não tenho apego a ela, e sim temo pela dor dos que vão ficar. Quanto a mim, desconfio que já vivi os "melhores dias de minha juventude". Necessito expor esta maleita, se ela pensa que pode fazer o que quiser comigo... vou gritar por ajuda até o meu último suspiro! Tombarei lutando. Preciso cumprir com as minhas obrigações. A vida continua. Sei que para a maior parte das pessoas é frescura ou algo irreal. Eu mesmo penso se há alguma enfermidade. Pode não ser... embora seja uma ilusão extremamente palpável.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Nós somos os privilegiados

Nós somos os privilegiados do mundo ocidental. Vocês vivem em zonas de guerra, miseráveis barracos de madeira, e bolsões de pobreza; nós desfrutamos das nossas casas com aquecimento, planos de saúde, e automóveis. Falamos duas ou três línguas, frequentamos terapia, e tomamos remédios controlados para dormir. Vocês comem  o que tem e cochilam de sobreaviso. Olhem para vocês…  são tão ignorantes que ao dormir não capazes de sonhar. Só porque tal político ou livro diz que sabe o que vocês precisam; nós damos lições de moral nos outros pela Internet. Mas não deixamos de frequentar os cursos e escolas especializadas para que futuramente ocupemos os melhores cargos dentro da sociedade. Sempre teremos uma história triste para contar; de uma vida num subúrbio perigoso ou numa periferia. Até quando somos discriminados fingimos nos preocupar com vocês. Fato é que os nossos filhos estarão bem colocados nas empresas e no serviço público; independente de serem netos de faxineiros ou não. Vocês nunca ouviram a máxima de que conhecimento é poder. Vocês continuarão a viver em meio à desgraça e a fealdade para que nossas vidas se mantenham dentro do expectável. Enquanto debatemos sobre o futuro que para vocês não chegará nunca.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Mesmo não sendo igual você não vai poder ser diferente

Apenas um por cento dos artistas do aplicativo de música que mantém o monopólio da música no mundo obtêm noventa e nove por cento dos lucros. O mesmo acontece com a plataforma de vídeo que abriga praticamente tudo o que é produzido para este meio. Mas os produtores culturais que geram riquezas ainda são burlados em seus ganhos. Da mesma forma as redes sociais se nós acreditarmos que hoje elas são a extensão da divulgação de bens culturais. Quatro ou cinco serviços de streaming corroboram com isto. A cultura ficou à mercê de um punhado de empresas. O domínio da indústria cultural nunca foi tão eficaz. Ou você dança conforme a música do capital, ou você não dança. Se você for pequeno e estiver com sonhos de divulgar a sua arte, simplesmente será irrelevante com os seus poucos cliques, pois os algoritmos são o meio de exclusão mais eficaz criado até hoje. Eles sabem muito bem quem paga e o quanto paga. E não toleram autenticidade, pois o mais do mesmo, de fácil assimilação; é vendido rápido e servido requentado como o prato do dia. Não há como burlar o seu sistema. Tem muita gente pagando muito e recebendo pouco. Pois você pode comprar cliques, mas não a admiração das pessoas. Se você se revolta contra o sistema dos algoritmos não consegue nem fazer cócegas em seus calcanhares; é tão ignorado quanto os que estão dentro. A indústria cultural finalmente conseguiu esmagar os seus inimigos que são aqueles a favor de uma cultura autêntica. Mesmo não sendo igual você não vai poder ser diferente.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

O leitor é um luxo

Os leitores são raríssimos. Os meus são ainda mais raros. E percebo que os tenho perdido paulatinamente. Devem pensar que eu estou louco por causa das minhas opiniões com as quais não concordam. Mas, para se viver é preciso ter o mínimo de elegância. Não confundo as coisas nem ando por aí discutindo. Hoje, não mais... Em minhas relações evito assuntos polêmicos. Até porque atualmente eles me deixam entediado. Apenas gosto de escrever sobre as minhas reflexões solitárias. Meus sobrinhos que estão no Brasil, e que são crianças inocentes, sabem que sou uma pessoa tranquila no convívio. Fora isto, sinto uma pena imensa de mim mesmo... ah, como eu sinto pena de mim! Fico escrevendo feito um louco para pouquíssima gente. Mesmo com tanto desperdício de papel e de espaço na nuvem. O que serve de consolo é que figuras do naipe de um Kafka ou de um Fernando Pessoa também passaram por isso. Então, nós, os simples mortais, precisamos perseverar fazendo o que nos dá mais prazer; que é escrever.