quando o meu livro foi lançado uma prima lembrou que na casa da minha avó eu lia no banheiro. morando numa casa cheia de gente, o banheiro torna-se o porto seguro para a leitura. na madrugada é a única luz que pode ficar acesa sem incomodar aos outros. ainda leio no banheiro. mais para não perder uma oportunidade de leitura, do que por necessidade. embora não sei porque sempre a sua luz do banheiro parece ser melhor. a batida do violão da bossa nova foi inventada dentro de um banheiro. pois João Gilberto gostava da acústica do mesmo. caso queira ler em voz alta para melhor absorção da leitura, é uma boa pedida. dizem que o banheiro era o único lugar onde os Beatles não eram incomodados. hoje a leitura deixou de ser prioridade, assim como a verba para a cultura é a menor, a leitura é a última opção de passatempo, ou o que quer seja, para a maior parte das pessoas. com a chegada do livro eletrônico, em países como o Brasil, em que se lê pouquíssimo, a leitura tende a perder espaço. quanto mais se entulha músicas em um equipamento eletrônico, menos se ouve música realmente. poucas pessoas ouvem os discos completos. a maioria vive de sucessos. o chavão do conceito de trabalho parece ter se perdido. no caso da música, talvez o ideal fosse que os artistas lançassem apenas compactos. como acontecia na época da Carmen Miranda. pois hoje, uma música de um ano atrás, é velha para a maioria dos adolescentes, e das pessoas em geral. são raros os artistas que conseguem manter alguma resistência, e lançam o disco no tempo em que acredita ser necessário. por causa desse processo de banalização que estamos vivendo. embora saiba que alguns artistas sentem necessidade de criar mais. mas é bom que isso seja uma opção. durante algum tempo acreditei que o artista deveria tentar negociar com esse modelo que aí se encontra. eu mesmo, quando comecei a escrever para este blog tentei evitar textos longos. hoje não temo mais os caudalosos. é bom ter tempo para ler e pensar um Marcel Proust, que é eterno, ou um Mario Vargas. mas é preciso tempo para isto. e tempo é tudo o que nós não temos hoje. então o tempo passa a ser mais importante que o dinheiro. sempre foi. desisti de acompanhar a evolução tecnológica. não há mais para aonde se evoluir. não duvido mais de nada. temos que resistir um pouco, para que as coisas do espírito não se percam por aí. para que a hegemonia da falta de tempo cesse. quem só tem tempo para responsabilidades pode se considerar morto. pois como diz o filósofo, o ócio também é necessário. principalmente para a observação com a qual se aprende muito. enquanto o mundo, ou seja, nós mesmos, nos faz acreditar que não temos tempo nem para cuidar do próprio umbigo. o tempo investido em uma boa leitura, ou num bom disco, dizem que isso é um conceito relativo, mesmo para os seus criadores, tem um retorno inestimável. que nesta correria, nós não vamos conseguir perceber. mas ler um bom livro, e caminhar numa manhã de sol pensando nas questões que foram abordadas por ele, continua sendo um dos melhores refrigérios para a alma.
sexta-feira, 31 de maio de 2013
domingo, 19 de maio de 2013
Black Alien Se Retrata...
desde que assisti a
este documentário sobre o Black Alien que não consigo parar de ouvir o Babylon
By Gus. sou parte do pessoal da minha geração que era Racionais-Nação-Planet, e
Rappa. vi o Black Alien ao vivo com o Planet, e, em dupla com o falecido Speed.
sei que assim como o Sabotage, e o samba, que é preto na poesia, ele é um
mestre. tem levadas, interpretações, e presença de palco infinita. seu estilo
se aproxima do noir. de um trhiller-psicológico. ou de um filme
pós-apocalíptico. cineasta, mostra cenas em suas letras que conseguimos
visualizar com facilidade. pena não ter conseguido compreendê-lo de imediato.
hoje entendo porque, porque ele desconstrói a linguagem. embaralha
tudo. é um artista sem cerimônia. sem máscara. não é fanático em suas
ideologias musicais, ou políticas. a sua cultura é caótica. assim
como a sua cabeça. é um Itamar Assunção fluminense. é um cabeça de
liquidificador. Black Alien é cru em sua entrevista. lava roupa suja em
público, como poucos artistas, e assume a parte que lhe cabe. um dos melhores
momentos do documentário em minha opinião, é quando ele diz que gastou muito
dinheiro com mulheres e drogas na época do Planet. discorre sobre o
"business" em sua palavras. fala sobre aquelas músicas que
desaparecem nas mãos de produtores. espalhar coisas por aí é ao que me parece,
é uma característica de quem produz muito. ele torna o improviso a
regra. mas o que ele faz no improviso dentro do estúdio, são músicas
antológicas. tenho a impressão de que ele solta frases no ar. volta e meia eu
pego alguma. mas tem que estar concentrado, e saber que o que a primeira
impressão parece uma verborragia, no final tem um significado profundo. pega
essa: eu tive lá. mas não te vi lá. no documentário você vê o Black Alien
gravando com o DJ. e reclamando, às vezes. e pessoas reclamando dele também.
indo para um show passam umas minas de carro, e o confundem com o Falcão. ele
fica puto. Black Alien toca num assunto chato que é o preconceito que um
artista preto pode sofrer de "algumas pessoas" ( as aspas são minhas)
em determinados segmentos, por não ser miserável. de forma madura diz
que não liga mais para isso. ainda rola ele cantando pra dez pessoas no norte fluminense.
sem holofotes. e o Black Alien na banda Reggae Bi, que tem o Bi Ribeiro e parte
dos músicos do Paralamas. Black Alien nos ensina que a música é criação de um
momento. não sei se ele concorda com isso. sem apego. bom filme. e bom disco
para você que não conhece. Ele diz numa letra "tirar foto é fácil, quero
ver quem se retrata". Black Alien se retrata.
domingo, 5 de maio de 2013
No Programa da Igreja...
...vi mendigo virar
empresário. gente começar a andar, ouvir, e enxergar. cadeiras são levantadas
no meio da multidão. quem nunca falou destrava a língua. há vinte anos viciada
em crack, aparentemente sem nenhuma sequela. é água, óleo, rosa,
toalhinha, e outros souvenires que devidamente pagos, auxiliam na
cura. Aids. Câncer. besteira, pra gente não vale isso! sem resenha, filhinha,
conta o milagre! eu quero saber do milagre... o Deus do senhor me curou! acabei
de abrir uma empresa, e fechei um contrato milionário! ganhei uma licitação e
aquela causa na justiça. a minha dívida sumiu. o carcereiro disse: pode ir
embora. sonhei com o senhor. o senhor olhou para mim. eu me lembro de você! o
senhor profetizou que alguém no meio da multidão tinha esse problema. tomei um
gole do resto da sua água senhor, e passei a mão no teu suor. a oferta é
para não tirar o programa do ar. mas ele subiu para o horário nobre na grade da
programação. o representante deixou escapar numa revista, que com 1 culto se
paga um mês de tevê. os milagres não podem parar. o que seria de nós sem esse
ministério? os hospitais lotados. as clínicas de recuperação... fora o LEPROSO
que é curado. e como é apregoado, os milagres da bíblia estão voltando! e se
esses milagres são verdadeiros, Jesus voltou, e ninguém foi avisado. pois até
médicos indicam a cura para os seus pacientes. como é dito no ar. ontem uma
senhora foi ao banheiro, e voltou com pedras enormes na mão, pedras essas que
ela havia expelido dos rins. provavelmente maiores que os rins da coitada. pois
uma pedrinha minúscula dá uma dor tremenda. eu sei o que é isso. é
aposentadoria. aluguel de tevê. pobreza dá dinheiro. que nos digam as ONGs. é
rabo preso. é voto. e nós que somos brasileiros, mas não somos otários, vivemos
a espera de um milagre!
sexta-feira, 3 de maio de 2013
John Coltrane: O Santo
comecei a ouvir jazz um dia desses. não porque tem selo de bom gosto ou porque sou preto. mas por acaso estava ouvindo ao rádio e gostei de um programa de jazz. já fui a festival de jazz, e tentei ouvir diversas vezes. sempre gostei dos filmes. e das histórias dos músicos. o jazz diferentemente do chorinho, que acredito ser a música instrumental mais agradável do mundo, sempre me soou estranho. da mesma forma a música clássica, ainda hoje, embora ouça quando preciso relaxar. e também goste das histórias de seus compositores. mas o meu ouvido finalmente parece ter cansado um pouco, da sonoridade pop, não que eu tenha deixado de amar, ou ouvir a cultura pop, underground ou alternativa. mas é que nessa nova fase posso experimentar coisas que antes não conseguia. ou para as quais não tinha ouvidos. acredito que assim como na literatura, na música, passamos por fases em que vamos amadurecendo. há exceções sempre. mas no geral não adianta pular essas fases. pois sempre dá merda. vejo pessoas que forçam leituras para as quais não estão preparadas, e depois posam de sabichões sem ter entendido bulhufas. com isso se perde a novidade do primeiro contato. talvez acabe o tesão com a descoberta precoce. há livros que leio hoje, que não teria lido antes. então passei a ouvir jazz. não como uma obrigação. ou porque é cult. mas por prazer. estou no início da minha paixão por John Coltrane. ouço John Coltrane todos os dias. o que mais me impressiona em sua música, é que ela se adapta a meu estado de espírito, e o transforma. é a música que não me atrapalha. e não precisa da minha atenção para ser compreendida. ela me pega e me joga na serenidade. mesmo que esteja escrevendo. consigo raciocinar e ouvir John Coltrane. até me ajuda. e tecnicamente não entendo nada de jazz. e se o John é uma música intimista, e de improviso, como acredito ser uma música que pede a proximidade do ouvinte. não sinto nada assistindo jazz na tevê. ou em grandes shows. jazz é música para lugares pequenos. John Coltrane te dá essa sensação. John Coltrane havia dito que a sua música era religiosa. assisti isso num documentário sobre jazz. e nele um cara disse que John Coltrane, um pouco antes de morrer, perguntado o que faria dali para frente, disse que se tornaria santo. e como disse o meu vizinho ao ouvir essa história. ele conseguiu.
quarta-feira, 1 de maio de 2013
O Lixo da Cidade...
eu vinha pensando numa música sobre o lixo. mas aí pintou aquele documentário Lixo Extraordinário, e era esse o nome que eu queria. desanimei um pouco. eu via isso escrito nos caminhões e achava sensacional. as ideias estão no ar. no carnaval eu fui ao local do Rio que eu acho mais bonito. o Arpoador. aquela vista, não vi todas, mas na minha opinião é a vista mais linda do mundo. vi o calçadão todo sujo. uma sujeira deprimente. não que eu me importe com aquele discurso enérgico dos moradores de Ipanema. eu quero que eles se explodam! mas me preocupo com a imundície. quem joga lixo no chão é porco e nada mais. mas pessoas insuspeitas são porcas, gringos de países europeus limpíssimos, esses que dizem aproveitar um pouco a liberdade que não tem em seu país, como gostam de apregoar sobre o Brasil. sei o tipo de liberdade em que eles estão interessados... o mesmo... que... ah, deixa pra lá. cheguei a conclusão de que quem suja essa porra somos nós. de várias maneiras. e me veio o Robert de Niro de Táxi Driver que chama as pessoas de lixo por sua falta de caráter. ou pelo menos pelo que ele acredita ser falta de caráter dentro da moral de alguém que leva uma dama num primeiro encontro para assistir a um filme pornô num inferninho. Isso me inspirou um pouco. na musica falo de como o corpo expele o seu lixo. e que existem lixos sobre determinados pontos de vista. nós somos lixo orgânico. tenho os meus pecados. e se não existe uma merda de um banheiro químico por perto, eu simplesmente não consigo ir contra a minha natureza, senhor prefeito. não que ache isso bonito. é feio. mas fazer o quê, né? quem tem que limpar a sujeira do cachorro é o seu dono! disponibilizei o vídeo com a música em que estou tocando violão. não é uma música para se dançar ou conquistar garotinhas. a questão está na letra. se tiver interesse, dá uma ouvida. o nome da musica é O Lixo da Cidade.
terça-feira, 23 de abril de 2013
Cena de Filme Nacional...
é um cenário conhecido, uma cena de filme nacional. um bar decadente na rua da zona. num domingo, ou num feriado santo qualquer. três da tarde, aquele sol vespertino, e deprimente. o dono do bar lendo um jornal velho atrás do balcão, com o qual também espanta as moscas. pega a toalhinha que está sobre o balcão e seca o suor da testa. o cheiro de gordura impregna o ar. no boteco adentra um rapaz de outro estado, nordestino, talvez, e que tenta manter algum tipo de raiz com o seu lugar de origem. uma mulher que foge. vai embora com outro. volta para a sua terra. enquanto o rádio ao fundo toca alguma música do Roberto Carlos.
terça-feira, 16 de abril de 2013
A Rua dos Quebra-Molas!
naquela esquina sempre colava uma rapaziada. que fumava um baseado, e que fizesse chuva fizesse sol tava sempre ali no carteado. com o tempo ele mesmos fizeram uma proteção contra a chuva. fizeram bancos mesas, e uma churrasqueira de cimento. sem a ajuda da prefeitura. e alguém arrastou um sofá cortesia de uma tia aposentada. existiam uns que praticamente moravam ali. independente das reclamações de "suas" "mulheres" ou da "polícia", ou dos fofoqueiros da rua. o que eles também eram. mas eram eles também que agitavam os blocos de carnaval e as festinhas juninas. e ainda o campeonato de golzinho. ou seja, eles eram imprescindíveis para a economia, cultura e desenvolvimento local. por isso que todo mundo acabava aturando aquela rapaziada que quando exaltada pelo jogo de buraco, falava mais palavrão que o Kid Palavrão. que era o moleque que mais xingava palavrão nas redondezas. numa manhã de sábado de sol escaldante, e de todo mundo sem um puto no bolso. na sexta feira todo mundo se entocou cedo por falta de grana, tudo que era malandro tava liso. olhando pro tempo naquele sol de onze da manhã. um deles com os olhos perdidos na parede da firma do outro lado da rua, disse: vamos fazer quebra-molas! como assim? lá em casa tá cheio de cimento e de material de construção que sobrou da obra do meu pai. e daí? e daí que a gente passa o caderninho, igual nós fizemos na copa pra pintar a rua. pra poder comprar as coisas pra fazer os quebra-molas. e aí todo mundo vai ficar tocado, e vai querer proteger as criancinhas dos atropelamentos, e vai contribuir nem que for com dez contos. é início de mês, e todo mundo tá com dinheiro. um deles disse: rapa, tu é um gênio! dito e feito. rolou toda aquela encenação de recolher dinheiro, e de ir comprar cimento. e a noite aconteceu o maior churrasco que aquela rua já teve. cortesia do pai do rapaz e dono da obra. pelo aniversário do filho que seria comemorado na semana seguinte. e a rua ficou conhecida como A Rua dos Quebra-Molas.
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