quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Samo Está Morto Basquiat Está Vivo!

Samo is dead. Basquiat está vivo. andando por aí. Basquiat caminha no centro da cidade. anda de um lado para o outro com a pilot na mão. rabisca frases aparentemente desconexas nas paredes. no banco do busão. breath teeth. Basquiat vaga pela cidade. dorme pouco a noite. no sofá de amigos. aqui e ali. mal tem onde dormir. come sanduíches de queijo. anda com roupas folgadas para o seu corpo. o seu cabelo tem um corte peculiar. reconhecível. Basquiat diz que não tem nada diferente para falar. diz que não se lembra do quê sente raiva. Basquiat deu uns pegas na Madonna antes dela ficar famosa. Madonna tem apenas três músicas na época. Basquiat já tem uma obre imensa. sua namorada Vênus, Suzzane, parte pra cima da Madonna na Roxy. Basquiat pinta sobre a briga. Basquiat tem uma banda de jazz. instrumental. e ele quem nomeia as músicas. uma delas se chama Mona Lisa. Basquiat tem uma banda chamada Gray. é um som experimental. será minimalista. não sei. Basquiat caminha sobre os corpos dos viciados em Heroína que infestam o Soho. Basquiat dorme e trabalha no estúdio. vende seus cartões postais com embalagens de bala. Basquiat pinta ouvindo jazz. John Coltrane. escuta David Byrne. pinta ao som da música. faz isso compulsivamente como se fosse a única coisa interessante a ser feita sobre a Terra. Basquiat começa a usar cocaína. fica paranoico. cobre as paredes do estúdio de preto e branco para não ser visto. diz que o serviço secreto está atrás de si. desconfia das pessoas. começa a usar heroína. saí na capa da New York Sunday Times. Basquiat está de terno. mas do mesmo jeito em que podemos encontrá-lo quando pinta. o cara que promove a arte de Basquiat chega ao estúdio. não necessariamente nessa ordem cronológica. Basquiat está chapado de ópio. Suzzane diz que quando Basquiat usa cocaína a sua pintura é mais detalhada e que quando ele está chapado de heroína, a sua pintura é mais expressionista. Ela consegue perceber. Basquiat vende um de seus postcards para Andy Warhol. um desses que valiam dois dólares e que hoje valem uma fortuna. Basquiat decora apartamentos de yuppies de Wall Street viciados em cocaína. que recebem o pó no açucareiro. a sua arte se torna um comodities. Basquiat expõe junto com Andy Warhol. a crítica detona a exposição. Basquiat está deprimido. paranoico. parecendo um velho de oitenta anos. Basquiat morre de overdose. Basquiat morre aos vinte e sete anos. assim como todos os grandes. Jimi Hendrix. Kurt Cobain. Jim Morrison. Janis Joplin. Amy Winehouse...

terça-feira, 15 de setembro de 2015

A Casa da Família...

a casa vivia cheia. eram muitos filhos. eles se reuniam a noite em volta da televisão. iguais famílias de civilizações antigas se reuniam em volta da fogueira. o pai e a mãe conversavam até tarde. todos os dias. mesmo depois que os filhos já estavam dormindo. durante a manhã era aquele alvoroço. e o batalhão, como dizia a mãe, se arrumava para ir à escola. o pai e a mãe saíam trabalhar. nos finais de semana, aos domingos, eles tomavam o desjejum juntos. o pai ia cedo a padaria comprar pão, a mortadela, o leite, e trazia o jornal. eles sorriam. e juntos faziam aquele almoço suntuoso. depois que a mãe morreu todos foram embora. o pai foi  o último a abandonar a casa. agora eles pouco se vêem. se falam sazonalmente. e se cumprimentam educadamente. é como se fossem estranhos. isso quando não param de se falar. a casa está vazia, mas ela continua respirando. é como se sentisse a falta deles. e ainda é possível ouvir suas vozes. e se deparar com o vulto dos vivos. mas isso já é passado. assim como o início do texto que você acabou de ler.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Cadê Você Meu Querido Henry?

ontem eu me lembrei de você meu amigo Henry. de quando você descia a rua gingando e sempre trazia uma carta na manga. você se virava e me dizia, hei, man! está com sede? eu dizia. estou. você me perguntava. quer tomar Coca-Cola? eu olhava para a cantina da escola, e dizia. mas eu não tenho dinheiro. e você me dizia, eu perguntei se queria beber Coca-Cola. não perguntei se tinha dinheiro. você via alguém sentado no pátio com a Coca as suas costas. alguém cujo pai devia dar mesada, e daqui a pouco você aparecia com uma Coca-Cola. e matava a nossa sede. e a gente dizia, amo muito tudo isso! eu me lembro quando você se deitava no chão se fingindo de morto. enquanto eu e os moleques da rua acendíamos uma vela ao lado do seu corpo. e te cobríamos com jornal. você com os pés para fora do jornal... a gente adorava quando vinha uma daquelas senhoras, olhava e dizia, coitado, que pena dessa mãe! elas acreditavam que era apenas mais um daquela época que havia sido morto. e a gente caia na gargalhada. eu me lembro que quando a aula estava chata, você entrava na secretaria para roubar as carteirinhas, enquanto eu sempre o mais medroso e o mais covarde, apenas vigiava. você pegava de volta, a minha carteirinha e as sua já com a presença carimbada em azul. e a gente caia fora. ou pela porta da frente. ou pulando o muro. e estávamos livres! livres! eu me lembro de quando não havia dinheiro para comprar fichas de fliperama, e você dava um jeito. para tudo que fosse verdadeiramente importante você dava um jeito. eu me lembro de você travando as bolas do totó. ou virando a mesa para que a ficha caísse. ou pegando um pedaço de arame. para tudo você tinha uma solução. até quando aquele cara mais forte que todos nós resolveu nos bater... e você veio com aquela. eu me lembrei de você meu amigo Henry! e me lembrei de como nós éramos inteligentes naquela época, criativos, espontâneos. quando a mentirinha chamada sociedade não conseguia nos ludibriar com a sua aparência sã. mas você sumiu no mundo... e a gente acaba "crescendo", e ganhando essa aparência de "saudável". de sensato. e temos de sufocar tudo aquilo que cala fundo em nosso coração. pois os clichês quase sempre são verdadeiros e temos de fingir que não acreditamos mais em nada daquilo. e que tudo que pensávamos era coisa de gente inocente. como se toda aquela rebeldia utópica não fosse verdadeira. aí nós temos que fingir, que acreditamos em toda essa mentira. em todo esse circo que os homens criaram. para que a gente possa se parecer com os idiotas.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Qual é a Contrapartida do Artista?

o seu trabalho.
o que o artista faz para contribuir com a sociedade?
o seu trabalho.
assim como,
o médico, o professor, o gari...

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

O Pai da Menina do Vídeo que Vazou na Internet...

a menina está deitada na cama. ela acabou de descobrir que o seu corpo está exposto por toda a internet. todo mundo acordou podendo ver seu corpo na rede mundial de computadores. em cada parte do globo que existisse um mínimo equipamento que se conectasse a internet poderiam ver seu copo. ele agora era de domínio público. a intimidade que ela tanto tentara preservar, até a sua noite de núpcias com o namorado. como ele, dizia. estava em toda a rede mundial de computadores. ela queria ser descolada como uma daquelas mulheres que exibiam os seus corpos em revista sem o menor constrangimento, talvez não fossem ligar para nada daquilo. ela não era uma mulher posando ganhando milhões para tirar a roupa. não. ela havia tirado a roupa para o namorado. e não ia depois de aquilo dar entrevista, ou subir para a cobertura de um prédio. ela teria de encarar as pessoas no dia a dia. na escola. na rua. os vizinhos. o ataque havia começado. quando ela abriu o seu Facebook, já havia mensagens sobre o seu peitinho. Suzana só tinha uma certeza. ela iria dar um jeito de se matar o mais rápido possível. agora ela não entendia porque o pai viera até ali. porque ele não a deixava sozinha. ela estava com a cabeça embaixo do travesseiro de tanta vergonha que sentia. o pai sentou a cama, e ela sabia que ele iria contemporizar. e tentar dizer alguma coisa que desestimulasse uma atitude mais drástica. Jorge sabia que era jogo perdido tentar chamar atenção da filha. o pior de tudo já havia acontecido. quando ele se dirigiu a ela, e disse, Suzana, ela disse, eu tenho vergonha de você. a voz de Suzana parecia saída de um túmulo. de um buraco muito escuro. Jorge disse, pior do que isso, eu fiz abandonando você ainda criança. Jorge continuou. sabe Suzana, o quê você fez, está feito. e você vai sofrer as consequências do quê fez. agora, eu te pergunto. quem nesse mundo todo, de bilhões de pessoas, que vai assistir a esse vídeo ou a essa foto. quem deles se preocupa verdadeiramente com você. quem deles já te perguntou algum dia, como você estava se sentindo, ou te ofereceu alguma coisa. ou mudou de opinião por algo que você disse ou pensou. você é apenas uma Suzana. existem milhões de Suzana. você vai se matar, por isso? mas e as pessoas da escola da minha família. o pai disse, filha. a gente se muda. faz o que for. mas a vida irá continuar. e a partir de agora esse vídeo faz parte da sua história. não para te lembrar que cometeu um erro. mas sim, que a vida continua. pois ela sempre continua, independente de você.

sábado, 29 de agosto de 2015

Sherazade...

a senhora diz detrás do balcão. vai começar a minha novela, a Sherazade! para de ficar para lá e para cá com esse controle! o velho com o controle na mão diz a Dilma. você foi trabalhar de bicicleta, Dilma? um cliente está encostado num balcão com uma cerveja esquentando a sua frente. num daqueles botecos debaixo do viaduto. o velho continua, ela engarrafou tudo. ela foi de bicicleta. mas levou carros com ela. e ainda atraiu a atenção dos curiosos. o cliente sorri. o velho continua. não vai de Bike, Dilma! não tem ciclovia! alguns presidentes vão trabalhar de metrô porque em seus respectivos países dá pra fazer isso. coitada da Dilma que tem que pedalar num canteiro. cuidado Dilma, para que não apareça o filho do Eike Batista derrapando, e te jogando longe! ou o filho do Pitanguy subindo na calçada de repente numa numa rua tranquila. ou o filho de alguém que nunca vai ser preso porque tem dinheiro. e cuidado para que os ladrões de bicicleta não roubem a sua bike. cuidado com as facadas por todo o país. seja por nosso machismo. ou por nossa agressividade. que não é associada a imagem melíflua que o nosso turismo sexual criou. quem não vai sorrir com uma gorjeta em dólar, ou em euro, Dilma? mesmo depois de ter devorado uma de nossas criancinhas. ou uma de nossas lindas "meninas", e nossos lindos "meninos". o cliente diz para descontrair. mas esse Pitanguy é velho! acho que ele vai substituir o Niemeyer! a mulher diz. a Dilma emagreceu. ah, ele emagreceu sim... emagreceu, e muito! agora se foi por stresse. ou para se manter a forma... é o preço do poder! começa a Sherazade. e todos olham vidrados para a tevê.

Prometeu Acorrentado...

O menino dorme sozinho num dos quartos do segundo andar da casa grande, e branca. dorme é uma forma de dizer. pois aquela noite será tão longa quanto as outras. O menino teme o mico que se encontra preso a árvore. ele ouve o guinchar ensurdecedor do mico durante o dia. o medo agora é a enorme aranha na parede. ou melhor, a sombra enorme da aranha. de manhã, com a chegada da luz do dia. o medo se desvanece.