ele balança o bebê que
parece um embrulho que sorri. eu digo: posso segurá-lo um pouco? ele me passa o
bebê que entorta os lábios, e chora como quem vê uma assombração. ele tem olhos
grandes e luminosos. eu me viro e digo a sua mãe: acho que se assustou
comigo... o moleque não gosta de mim! ela diz: ela não tem do que gostar... e o
pega e me passa. é manhã. ele quer é farra... balança ele! balanço o bebê que
volta a sorrir. olho o seu rosto e penso, meu Deus, parece um homem da minha
família! pela primeira vez vejo os passos do outro. e grito em êxtase a sua
mãe: ele anda igual ao pai dele! a mãe responde num muxoxo: todo mundo fala
isso... fico assustado com a herança genética. o outro me puxa pela perna como
quem diz querer participar da festa. e vejo o seu sorriso lindo de banho de
chuva. o outro diz: o meu pai só que andar de táxi! o meu pai quer andar de
táxi o dia inteiro.... só porque recebeu hoje! então todo mundo para no ponto
de ônibus. eu me lembro da Pais e Filhos da Legião Urbana, e da All You Need Is
Love dos Beatles... e beijo cada cabeça e digo. inclusive para o embrulho que
dorme. te amo. o meu coração palpita ao caminhar para casa e saber que ela está
me esperando. desço a ruazinha que termina com o muro. e dou um mergulho na
noite chinesa...
quinta-feira, 26 de setembro de 2013
quarta-feira, 25 de setembro de 2013
Máquina de Escrever...
ela fuma, e diz: tem aquela festa! ele fuma, e diz: vai rolar aquele evento... ela fuma, e diz: aquele lançamento! ela fuma, e diz: e mais o sarau... ele fuma, e diz: vai tá todo mundo lá! ela fuma, e diz: vamu fazê muito contato... ele fuma, e diz: ainda tem a reunião... ele me pergunta: e você vai? do canto da sala eu berro até sufocar o som do aparelho. vou continuar escrevendo... e peço: tranquem a porta por favor! eles saem... e ao fechar a porta me atrapalham. penso, foda-se. batuco nas teclas da máquina. desligo o som. a pior coisa que existe para um escritor é o silêncio.
segunda-feira, 23 de setembro de 2013
O Fim da Novela...
um cara é atropelado por uma mulher que se apaixona por ele. uma esposa descobre que na verdade é irmã do marido. o casal principal tem um relacionamento vai e vem. um personagem é assassinado e todos os personagens são suspeitos do crime. dois irmãos brigam por causa de uma herança. dois irmãos brigam pela presidência de uma empresa. alguém vai se revelar viado ou sapatão. uma bicha afetada vai fazer fofoca. a empregada preta e pobre vai se meter na vida da família rica. alguém que todo mundo pensava ter morrido vai reaparecer para se vingar. uma irmã vai tentar roubar o namorado da outra. no último capítulo o assassino é descoberto, e o casal principal se casa numa cerimônia com todos os personagens. eu digo, não posso me esquecer do filho rejeitado. ele grita: ele pode ser filho da empregada! falo: eu não havia pensado nisso antes... afirmo: fechou. ele diz. toca aqui. bato em sua mão. bicho, dú caralho! dú caralho, bicho! foda! ele dá um giro. uh! já pensou enviar essa porra pra televisão? eu digo: mas a minha intenção é essa!
domingo, 22 de setembro de 2013
Que Horas Começa o Nacional Kid?
acorda no cubículo. apertado. acende o primeiro do dia. liga a tevê. olha para a garota que está conversando com uma de suas amigas. pensa igual alguns homens pensam... como as duas! a garota diz: gostou do meu bumbum? a outra fecha as duas mãos, e responde animada. ih, garota, adorei... você tem it! (aqui ela balança a cabeça) que sex appeal! depois pergunta: fez onde? ela conta. esfrega na cara da amiga. no Doutor Igor Maguari! diz a frase como uma máxima. e a amiga responde: ah, ficou lindo... você está cheia de bossa! e dos meus seios, gostou? está de arromba! a outra responde. a garota diz num muxoxo. só achei o da esquerda um pouco torto... a outra diz: que nada, você está um estrondo! eu, por exemplo, quero comprar um cérebro novinho, na caixa, lacrado! ele coça o saco. desliga a tevê. e diz: porra, têm uns filmes de ficção que são mentirosos pra caralho! que horas começa o Nacional Kid?
sábado, 21 de setembro de 2013
Acumulador Compulsivo Virtual...
John Smith com apenas 15 anos recebeu o diagnostico de acumulador compulsivo virtual. em sua casa todas as máquinas são infestadas de vírus. a mãe do John, Mary Smith, diz que precisou contratar um técnico para fazer manutenção semanal. a família sofre com o problema. são inúmeros programas e aplicativos que John sabe que nunca irá usar, ou músicas que nunca irá ouvir. pois considera velha qualquer canção que tenha um ano. mas seriam necessários anos, e mais anos, para que John ouvisse todas as músicas que estão em seus aparelhos. as fotos nunca serão reveladas. sobre os livros John admite. não gosto de ler. mas eu baixo porque todo mundo viu o filme. tá lendo. comentando. sobre os filmes John precisaria mais do que seus quinze jovens anos para assisti-los todos. na mesma velocidade em que tecla com o polegar esquerdo, John envia fotos para as redes sociais com o direito. fico surpreso: uau, como você consegue! começo a dizer: John, e se talvez você tivesse vivido... ele me corta. já ouvi esse papo, mas acho que hoje em dia as coisas são assim. faço aquilo que a maioria das pessoas já fazem normalmente, digamos, um pouco mais. eu insisto: isso não te incomoda? John responde: nas festas é um saco. pois eu não vivo. apenas registro o momento.
quinta-feira, 19 de setembro de 2013
Os Órfãos do Mangue...
quando a antiga Zona do
Mangue foi removida do centro perdeu todo glamour. e se transformou no que hoje
chamamos de Vila-Mimosa. o Mangue era frequentado por escritores, músicos e
jornalistas. e lá se encontravam alguma gringas fugidas da guerra, ou não.
dizem que muitas ex-prostitutas daquela época, após remoção forçada,
sucumbiram. como acontece hoje com pessoas que perdem suas casas para a
construção de mais estradas. os terrenos são avaliados. não o imóvel. o valor
sentimental não tem valor algum. chega alguém, e fala: você tem dias pra cair
fora! ela diz. DEMOcracia é isso! deve ser o menos mal... num cortiço do centro
da cidade converso com dois velhinhos centenários para a gravação de um filme
sobre filhos de ex-prostitutas do Mangue que morreram deprimidas. o seu Bob de
cabeça branca, brinca. dois filhos de Maria, um de Mary Jane, assim mesmo, em
inglês, coisa de pobre, ele diz. Peter tem olhos claros e fala, eu sou filho de
Maria Joana! e conclui: que eles acabassem com a zona! que acabassem com a
prostituição! mas que não acabem com nossas mães... pois não temos nada com os
problemas dos outros! os órfãos do Mangue olham tristes para a parede do muro
em frente.
terça-feira, 17 de setembro de 2013
Os Homens do Vagão Feminino!
ele se equilibra e me diz: ler é melhor que tudo. ler é melhor que escrever. vai por mim, escritor. eu digo: tô ligado! quando passa um cara gritando. dois mil louvor num DVD! uma música toca no último volume. o barulho de ferro velho se chocando. alguém grita. o fim do mundo está próximo! um novo grito: costelinha de porco! uma mulher diz: hoje eu mato o meu marido. ah, se não mato! picoto ele todinho e ponho dentro da mala! ninguém vai saber que fui eu... balança as pernas. pulamos na estação. ele diz: ler é mais importante do que ficar estudando 2, mais dois. faz sinais com as mãos. aponta com o nariz. olha esses caras que viajam todos os dias no vagão feminino. você acha que se eles tivessem lido alguma coisa em suas vidas fariam isso? estala a língua com insatisfação. que nada! faço cara de dúvida. nos despedimos.
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