quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Não Dá Pra Morrer De Fome!

O gás lá em casa havia acabado. Eu tinha de gastar as últimas moedas, ironicamente, com as duas caixas de fósforos. Se estivesse no centro da cidade ia a um bar pedir pra tirar o lixo em troca de um café. O café é a melhor bebida que deus inventou. Depois vem a Coca-Cola. Como eu ia escrever o dia inteiro sem um gole de café. A literatura depende do café. Não do fumo, nem da bebida, nem de memórias afetivas, ou inspiração como alguns calhordas podem imaginar. Os escritores estão no ranking dos profissionais que mais bebem café. No posto de saúde pública não servem café de graça. Nas clínicas particulares é preciso ser paciente. Lembrei-me dos postos de combustíveis. No mais próximo existia uma placa em cima do café dizendo que era uma cortesia para os CLIENTES. O supermercado fica longe e nem sempre se tem a garantia daquele stand com cafezinho grátis. Pus a minha melhor roupa de ficar em casa, e corri para a biblioteca pública. Havia dois livros emprestados comigo. Então fiz cara de escritor em pesquisa para o próximo livro. E como quem não quer nada, eu me aproximei da garrafa térmica. Pena que aqueles copos descartáveis são ridiculamente pequenos. Peguei meu primeiro gole. Dei uma volta. Fingi que estava compenetrado. Voltei para o meu segundo gole. O bibliotecário sorriu com ironia e disse. O café da faxineira é bom... Respondi a ele. De graça é sempre mais gostoso... Sem tirar os olhos do computador ele me perguntou. Dá pra viver mesmo desse negócio de livro? Eu disse. Não dá pra morrer de fome... Nós rimos. Esmaguei o descartável com a mão. Fui. Agora eu poderia escrever em paz o resto do dia. A janta seria outro episódio. Mas a dúvida que pairava sobre a minha cabeça era se os empregados se cotizavam para comprar o café, ou se era comprado pelo governo. Essa dúvida me angustia. Se a biblioteca é pública o certo é que o governo compre o café. Vou perguntar ao bibliotecário da próxima vez...

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

O Papai Noel no Maracanã

Quando eu era criança nós éramos tudo felizes no Rio de Janeiro. Colorido, bonito, gel no cabelo, ombreira, e Atari dos colegas. A Blitz na vitrola e o Balão Mágico na tevê. Todo mundo imitando o Michael Jackson. Nossa vida era uma eterna tarde de sábado no programa do Chacrinha. Eu tinha doenças pra cacete. Diziam que era porque eu bebia água da bica e comia amêndoas do chão. Nós tínhamos pano branco, caxumba, rubéola, e coqueluche. O maior evento do ano era assistir à chegada do Papai Noel no Maracanã. Mas teve um ano que eu peguei catapora. Não queria espantar todo mundo do estádio. Esse até hoje é o maior trauma da minha infância. Se bem que eu não pude ter um videogame… A única desgraça que aconteceu naquele tempo foi o filme Pixote.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

O Meu Nome Não é Elano!

Eu tava bebendo um negócio com dois ou três bêbados amadores, e desconhecidos. A gente tava bebendo e assistindo uma banda de rock ruim. A banda era ruim. Não o rock. Um deles apontou a lata de Coca-Cola em cima da mesa, e perguntou: que porra é essa? Quando olhei percebi que tava escrito: quanto mais Rafa melhor. Alguém explicou que as latas vinham com vários nomes. Então a intenção é sair em busca da sua. Alguém disse: os caras do marketing são foda! Eu pensei. Os caras do marketing são foda. Mas eu nunca teria uma latinha com o meu nome. A vantagem de se ter um nome desconhecido é que as pessoas dificilmente se confundem. Já se você se chama Marcelo, Felipe ou Tiago, fica mais difícil. O lado ruim é ter que ouvir: eu não perguntei teu apelido, eu perguntei teu nome! Ou aquela: o dono da loja de móveis? Na verdade Delano é um sobrenome. O médico que fez o parto da minha mãe se chamava Jorge Delano. Até hoje não entendo a comparação com o ator Alain Delon. Não, eu não sou o Franklin Delano Roosevelt. Pior é ser chamado de Derlano por aqueles que não têm boa pronúncia. Quando o jogador Elano está na seleção... Eu respondo: o meu nome não é Elano!

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Oração de Delano Valentim

Senhor, que num milagre teu, senhor, toda essa gente comece a ler meu livro, que ele se torne um A Cabana, ou o meu Ágape igual ao do Padre Marcelo Rossi. E que o meu livro dispute ombro a ombro as prateleiras, e os passageiros dos ônibus, com o Harry Potter e o Crepúsculo. E que eu seja invejado e odiado como Paulo Coelho. Eu quero ver meu livro na mão daquele homem do povo que lê o Meia-Hora em pé no trem, e que escuta no celular, ou no radinho de pilha, o jogo do Flamengo, e a Patrulha da Cidade. Esse homem que mal sabe mexer na net, que não sabe nem o que é Face. Pois eu estou cansado daquele escritor que é um gênio para a história da literatura brasileira, mas que me dá sono no primeiro parágrafo. Senhor me leva para Hollywood, para que eu possa me prostituir como fez o irmão do Holden Caufield. Eu deixo o James Cameron me filmar. Ele faz do livro o roteiro que quiser, corta o personagem principal, muda o fim, eu não tô nem aí! Eu só quero que o filme propague o meu livro. Eu prometo que não vou à festa da entrega do Oscar. Dou uma de Salinger, que passou a vida toda lutando por aquilo, para no fim dizer que não queria. Os intelectuais adoram isso, escritores reclusos. Lembra-se do Dalton Trevisan? Do Thomas Pynchon? Do Carlos Castañeda? Do Rubem Fonseca? Mas senhor me afasta dos intelectuais, das resenhas, dos Prêmios Jabutis, das Feiras de Parati, da Academia Brasileira de Letras. Eu não quero ser condecorado, premiado, e estudado, para depois apodrecer numa estante empoeirada. Eu quero ser lido!

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

O Pé de Maria Joana

O Gordo disse pro magro esnobando. Aí tô com um pezinho lá em casa. O Magro surpreso. Mentira! O Gordo birrento. E já tá bem grandinho! O Magro curioso. Tu já fumou? O Gordo: ainda não. Mas tô pensando em estrear hoje. O Magro, vamo lá fumar um! O Gordo fazendo mistério. Mas ele tá no terraço do meu prédio... O Magro ainda sem acreditar. Você tá dizendo que plantou um pezinho no terraço do teu prédio? O Gordo: sim. O Magro: e se os outros vizinhos descobrirem? Eles não gostam, mas não sabem nem o que é. Pensam que é outra coisa. O Magro: o quê, por exemplo, trevo? É por aí! O Gordo disse já desinteressado. Continuou. Eu preciso de ajuda pra resgatar esse pé. O Magro: e qual é o tamanho dele? Vamo lá que você vai ver! Na escada o Gordo contou para o Magro: o porteiro fica admirado de como eu gosto de planta! Quando o Magro viu o pé, falou. Isto não é um pezinho, isto é uma árvore! O Gordo, sem escândalo. Vamo pela escada. Um tiozinho que ia abrindo a porta perguntou: que planta é essa, meu filho? E o Gordo: mandioca da serra! Eles riram desceram para a casa do Magro na noite suburbana. Carregando o vaso, suando. Uma patrulinha passou e um deles comentou. Que babacas, carregando planta uma hora dessa! Na casa do Magro, quando eles começaram a fumar, o relógio ainda estava marcando meia noite.

sábado, 27 de outubro de 2012

Eu Só Tô Com Um Real!

Ela me ligou a cobrar e disse: liga pro meu pai fazendo um favor. Diz a ele pra vir aqui que eu tô sem passagem. Eu liguei pro meu pai e disse: ela pediu pro senhor ir lá que ela tá sem passagem. Ele disse: eu só tô com um real na carteira. Diz a ela, que eu só tô com um real! Eu pensei. Como assim ele só tá com um real? Ele não tá é com nada! O Meu pai, trabalhador, aposentado. Homem honesto a vida toda. E bom profissional... Dos melhores! Ele só tá com um real na carteira. Pagou todos por seus direitos. Tem médico de dois em dois anos. Na escola da filha caçula passa até analfabeto... Ele só tá com um real na carteira.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

A Bela Suzane Richthofen

Quando Hugh Hefner fundou a revista Playboy, ele tinha a intenção de pôr na capa uma mulher de carne e osso que pudesse ser uma vizinha. Assim como a atriz Kristen Stewart que traiu o mocinho indo de encontro à imagem que o seu rostinho angelical representava, Suzane Richthofen nos decepcionou. A sociedade tem dificuldade em aceitar ricos assassinos. Como se o dinheiro tivesse uma capacidade redentora. Provavelmente Suzane é psicopata. Na época o argumento para o destaque do caso foi o parricídio. Mas qualquer leitor de diários sanguinolentos sabe que todos os dias um pobretão enche a cara de cachaça, mata a família, e vai ao cinema. Os casos ganham nomes na imprensa quando algum dos envolvidos, vítima ou agressor instiga nossa curiosidade. Por isso que o caso se chama Suzane Richthofen, e não O Caso dos Irmãos Cravinhos. Assim como O Caso Eloá (vítima), O Caso Isabela Nardoni (vítima), O Caso Bruno (agressor), e O Caso Elise Matsunaga (agressor). Ontem assisti a uma reportagem totalmente tendenciosa, em que os dois marmanjos eram colocados como vítimas inocentes da loura demoníaca. Se a gente fosse falar de frieza, como um adolescente, para quem o contrário do amor é o ódio, eles são tão frios quanto ela! Pois trucidaram aquele casal simplesmente por causa da grana. Não creio que a motivação fossem os supostos abusos, pois lucrariam muito mais indo à polícia e se livrando do pai, que preso ainda ia deixar uma grana para que curtissem em paz. O tom da reportagem foi que o namorado cometeu o crime motivado por sua paixão hollywoodiana. A imprensa ama Suzane, assim como ama Elise. Ela constrói o mito para vender mais. Mesmo que exista uma Suzane em cada esquina, sem o rostinho que representa nosso padrão de beleza atual. Sendo assim não conseguimos nos distanciar para que justiça seja feita. Como um amigo meu disse: eu acredito que o Bruno matou a amante, mas em qualquer país do mundo ele estaria solto, pois sem corpo não há crime. Como disse Hélio Luz: será que o povo brasileiro quer uma polícia justa? Para que a justiça sempre acontecesse, nós teríamos que deixar de lado nossas paixões (vingança).