O gás lá em casa havia acabado. Eu tinha de gastar as últimas moedas, ironicamente, com as duas caixas de fósforos. Se estivesse no centro da cidade ia a um bar pedir pra tirar o lixo em troca de um café. O café é a melhor bebida que deus inventou. Depois vem a Coca-Cola. Como eu ia escrever o dia inteiro sem um gole de café. A literatura depende do café. Não do fumo, nem da bebida, nem de memórias afetivas, ou inspiração como alguns calhordas podem imaginar. Os escritores estão no ranking dos profissionais que mais bebem café. No posto de saúde pública não servem café de graça. Nas clínicas particulares é preciso ser paciente. Lembrei-me dos postos de combustíveis. No mais próximo existia uma placa em cima do café dizendo que era uma cortesia para os CLIENTES. O supermercado fica longe e nem sempre se tem a garantia daquele stand com cafezinho grátis. Pus a minha melhor roupa de ficar em casa, e corri para a biblioteca pública. Havia dois livros emprestados comigo. Então fiz cara de escritor em pesquisa para o próximo livro. E como quem não quer nada, eu me aproximei da garrafa térmica. Pena que aqueles copos descartáveis são ridiculamente pequenos. Peguei meu primeiro gole. Dei uma volta. Fingi que estava compenetrado. Voltei para o meu segundo gole. O bibliotecário sorriu com ironia e disse. O café da faxineira é bom... Respondi a ele. De graça é sempre mais gostoso... Sem tirar os olhos do computador ele me perguntou. Dá pra viver mesmo desse negócio de livro? Eu disse. Não dá pra morrer de fome... Nós rimos. Esmaguei o descartável com a mão. Fui. Agora eu poderia escrever em paz o resto do dia. A janta seria outro episódio. Mas a dúvida que pairava sobre a minha cabeça era se os empregados se cotizavam para comprar o café, ou se era comprado pelo governo. Essa dúvida me angustia. Se a biblioteca é pública o certo é que o governo compre o café. Vou perguntar ao bibliotecário da próxima vez...
Nenhum comentário:
Postar um comentário