domingo, 24 de maio de 2020

Considerações Sobre um Filme Universitário

Eu tinha bastante material à mão. Gravava entre uma e outra tarefa do dia a dia. Como era um filme sobre o isolamento social filmava em casa. O que facilitou filmar à vontade na obtenção de imagens que pudessem ser interessantes aos meus objetivos. Tenho pouca experiência como operador de câmera, e o equipamento que possuía era um aparelho celular. Já participei da produção de documentários, videoclipes e curtas em que estive presente em todo o processo. Mas sempre assessorado por ótimos profissionais. Então esta era a primeira vez em que atuava sozinho nestes campos.
Embora quisesse reproduzir em meu filme à ideia de câmera na mão, referência direta a  movimentos cinematográficos alternativos de vanguarda e autorais. Mas durante as filmagens estava preocupado se iria balançar muito o celular. E até que ponto isto poderia ser considerado como uma opção artística ao invés de uma deficiência técnica. A câmera a balançar desde o início fazia parte de uma opção estética para o filme. Quando filmei algumas fotografias que aparecem na edição final não dei estabilidade completa à câmera. O que me deixou inseguro. Munido do material filmado iniciei a montagem. Durante o processo fui em busca de takes que me satisfizessem, e consegui selecionar os que me pareciam mais aprazíveis.
Em relação ao equipamento eu não tinha intimidade com os filtros e com o set da câmera do aparelho. Mas busquei o filtro clássico que dava o efeito de imagem antiga que artisticamente fazia parte da proposta inicial do filme. Eu iria usar o preto e branco que assumi como uma das marcas do trabalho em questão. Mas esta não foi uma escolha aleatória, pois ela veio junto da necessidade de mostrar as dificuldades da produção, e de fortalecer à insinuação de trabalho “artesanal” com poucos artefatos tecnológicos sofisticados. Além, de como já foi dito, exaltar novas vagas presentes na história do cinema. Utilizei a vinheta e isto me deixou satisfeito, já que desejava sublinhar os muitos objetos circulares presentes em meu filme, que remetiam ao ciclo que se repetia nos longos dias trancados que transcorriam lentamente. Tentei adaptar as minhas opções estéticas às limitações de recursos.
Sobre o áudio do filme adaptei o som à minha volta ao ritmo da montagem. É possível ouvir algumas marteladas. Ficou de fora uma furadeira que ainda ouço enquanto escrevo este texto. Existe uma obra no prédio ao lado que começou na época das filmagens. Alguns cortes foram feitos no intervalo das marteladas e dos sons graves como a marcação do bumbo de uma bateria. E isto despertou uma vontade imensa de aprofundar ainda mais o tratamento do som. Ao fazer este filme a sonorização mostrou a sua enorme importância na montagem. Foi uma redescoberta. E senti ânsia de aprofundar com mais afinco o trabalho e conhecimento da mixagem de som.
Não obstante tenha ficado satisfeito, pois tendo em mãos o imenso material bruto que possuía, as minhas escolhas foram facilitadas. Eu podia cismar com um take, mas sempre havia outro para substituí-lo, e se um take estava insatisfatório, ou uma cena apresentava muitos ruídos, eu tinha em minha mão um leque de opções. Acho que isto ao final foi o que fez toda a diferença. A quantidade de cenas filmadas se tornou essencial para que eu pudesse ter opções, o que me deixou com uma gama de possibilidades que facilitaram a construção do curta.
O filme é dividido em dois capítulos. Eu havia feito um primeiro corte da segunda parte que tive de refazer completamente. Não gostei da soma final e cheguei à conclusão de que era precipitado. Estava correndo demais com o ritmo do filme. Mesmo que a velocidade dos cortes fosse uma de suas características.  Apesar do que havia concebido inicialmente, senti necessidade de que os planos fossem um pouco mais contidos
Existe um respiro no meio do curta. Tive receio, mas precisava que o filme desacelerasse naquele ponto. Eu temia que no primeiro corte da segunda parte, ele corresse tanto que fosse impossível acompanhar seu raciocínio. Tanto é que tive de refazer o corte completamente, como já citado acima. Apaguei tudo que estava na timeline. Não fiquei satisfeito com o resultado e parti para outra montagem. Percebi outro problema de minha concepção anterior; o tempo do filme não era o tempo de sua realidade.
Na nova montagem utilizei duas vezes o efeito chamado de cross dissolver. Eu tinha consciência de que este efeito era muito usado em determinadas situações, e que em outras ele havia caído em desuso. Ele é utilizado sobretudo em algumas ocasiões para representar passagem de tempo. Não usei o efeito com esta premissa. E sim por um viés artístico em que entendi que a regra do filme pedia. Senti necessidade que soasse daquela forma. Eu queria usar o cross dissolver mesmo que parecesse tosco como o jump cut de Jean-Luc Godard quando ele era apenas uma novidade. Eu sabia que era um clichê. Mas quando editei o filme, senti necessidade que ele soasse daquela forma. Utilizei o efeito na junção de dois planos longos. Embora pudesse simplesmente suprimir esses quadros. Ao invés de usar o esteticamente feio, mas instigante jump cut como fiz em alguns momentos.
Aprendi muito com este processo. E o interessante foi que pelo fato de estar sozinho, como todo mundo, aliás, tive de me virar e encarar situações que evitava. Como segurar uma câmera e editar completamente sozinho.
Um erro crasso que cometi foi com os créditos. Usei um crédito criativo que não desejava mexer, pois foi apresentado de forma inusitada como o resto do filme. Mas deixei de fazer uma ficha técnica mais apurada, e que estivesse de acordo com um trabalho profissional. Novamente de maneira optativa. Depois repensei bastante sobre o caso, e concluí que realmente poderia ser refeito. Tem simplesmente os títulos e o crédito do realizador. Pensei que por se tratar de um filme de âmbito escolar e interno, seria adequado. Deixei passar a oportunidade da premissa profissional.
No processo de um filme existem problemas na organização que acabam por ter implicações no trabalho artístico. Mas no geral, realmente fiquei bastante satisfeito com o filme. E sempre que tiver oportunidade irei mostrá-lo para alguém. Aprendi muito com este processo. E o interessante foi que pelo fato de estar sozinho, como todo mundo, aliás, tive de me virar e encarar situações que temia. Perdi o medo. E o mais importante senti prazer com o trabalho.  

Referências:

Valentim, Delano; Pré-produção de Curta Universitário: A Curva Achatada. Delano Valentim, Ano 2020
A Curva Achatada… (2020)
https://www.youtube.com/watch?v=9F5peLXblD0&t=9s
https://www.academia.edu/43151233/Considera%C3%A7%C3%B5es_Sobre_um_Filme_Universit%C3%A1rio

Nenhum comentário:

Postar um comentário