Vivemos num tempo em que o cinema é sobretudo diálogo e os nossos sentidos são pouco explorados. É como diz a máxima: “Olha, mas não vê, escuta, mas não ouve”. Nosso repertório de expressões e capacidade de leitura das mesmas engessaram com o tempo. Num contato mais aprofundado com a história do cinema é perceptível como o mesmo tem perdido ao longo do tempo como arte da imagem. O cinema tornou-se uma arte das palavras. A expressão dos sentimentos dentro das imagens cinematográficas tem ficado em segundo plano. Não se pode generalizar, mas é um fato. Os atores em cena estão sempre a nos guiar com as suas palavras. A imagem passou a ilustrar a fala quando poderia ser o inverso. O texto analisado foi escrito em 1923. Com o passar dos anos os estudos de psicologia e neurociência vieram corroborar ainda mais com o que escreveu Beláz quase um século antes. Béla Belázs nos alerta que cada vez mais somos amparados por discursos, e não conseguimos perceber que muitas vezes eles não estão de acordo com gestos e olhares. É crucial para um artista perceber que dentro do universo do cinema; a fotografia é tão importante quanto o roteiro, os diálogos, e a expressão dos atores. Porque não seguir os personagens e suas atitudes e interpretar o que eles sentem e pretendem? E se nós fôssemos educados nesta arte? É sabido que os psicopatas são incapazes de sentir empatia. Nós também seremos dentro de uma sociedade que caminha para se tornar cada vez mais neurotizada e robotizada. Belázs fala em educação dos sentidos. Vivemos no automático, como se diz, com medo dos outros e incapazes de nos pôr em seu lugar. O problema sempre está lá fora, nunca aqui dentro. A arte é apenas um reflexo da realidade, talvez por isto, esta falta de expressão tenha se refletido no cinema. Se hoje o cinema voltasse a ser mudo, quantas pessoas seriam capazes de seguir as suas estórias? Belázs nos lembra que o cinema sonorizado também não explorou os nossos ouvidos de todo. Feche os olhos e ouça quantos sons você não percebe à sua volta. Quantos prédios localizados em ruas pelas quais você passa todos os dias e não os percebe a não ser que alguém chame a atenção para eles. Podemos mesmo tergiversar que se a sociedade receber educação sentir e interpretar o mundo, talvez não fosse tão violenta e desigual. Quantas pessoas podem fazer uma leitura de si mesmas através de um terapeuta? Quantas são as pessoas ao redor do mundo que podem se orgulhar de parar em frente a um quadro e tentar entender as intenções do artista? Não é uma questão de puritanismo, mas sim de escolhas. Quando a maior parte do mundo acredita que uma batida frenética e colorida da música pop é o ápice que um artista pode chegar, há cada vez menos o tempo para a contemplação e exercício do cérebro. Quem perde com este espectador educado para ser um robô; que assim como uma criança de poucos anos que só entende o livro com figuras descritivas, não é o cinema, e sim, todos nós. Estudar Béla Belázs é dar um salto qualitativo na expressão de suas próprias experiências. E ampliar não só sua arte, mas também o seu entendimento e sua capacidade de expressão diante de um mundo que se encontra anestesiado.
https://www.academia.edu/43097441/Recens%C3%A3o_Cr%C3%ADtica_O_Homem_Vis%C3%ADvel_de_B%C3%A9la_Bel%C3%A1zs
Bibliografia:
Ismail
Xavier (org.), Béla Belázs, A Experiência do Cinema, Rio de Janeiro, Graal,
1983. Pp 75-99. Tradução de João Luiz Vieira.https://www.academia.edu/43097441/Recens%C3%A3o_Cr%C3%ADtica_O_Homem_Vis%C3%ADvel_de_B%C3%A9la_Bel%C3%A1zs
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