quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sexta-Feira Felpuda!

De cima da passarela eu vi o sol no final da tarde. Ele estava deslumbrando. Lindo. As pessoas passavam por mim. O trem embaixo. O motoqueiro passou e disse: Cai fora, cara! Tá atrapalhando o trânsito. Fui embora. Não dava para ficar namorando o sol o tempo todo. Ninguém ia entender. E agora de noite vi a lua. Linda. Fez de tudo para ficar visível. Enfurnou-se entre as árvores. Cheia. Felpuda. Sexta-feira. Todo mundo vai sair. Ninguém que trabalha na cidade vai voltar para casa. Eles vão para todos os lugares. O trânsito em direção ao subúrbio vai ficar tranqüilo na Avenida Brasil. Todo mundo vai beber. Fumar. Cheirar. E serão guimbas e mais guimbas de cigarros. Pontas de baseados. Rapas de pó. Dores de cabeça. Ressaca. Camisinhas sujas. Vai ter um mundo de camisinhas sujas em motéis. Muita camisinha. Imagina uma pilha de camisinha. Ele está deitado enquanto ela toma banho. Veja a cena. Ele diz para si mesmo: sou feliz. Quando toca o despertador. Eu desço da passarela.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Tipo Sócrates

Eu tava maior babaca esse dia. Tava caminhando pela imensidão da Avenida Rio Branco. Segunda-feira de manhã. E eu cá com meus botões tive uns achados filosóficos. Tava me sentindo um puta filósofo. Inteligente pra cacete. Tipo Sócrates. Imagina a cena. Um filósofo no meio de boys e secretárias. Aí eu disse: a verdade é que ninguém trabalha para si próprio. Um trabalha para o outro. Será que alguém já teve essa sacada? E emendei com aquelas perguntas básicas. Um questionamento no mínimo adolescente. Por que somos tão “inteligentes”? Por que fazemos música? Quem criou deus? Quando me toquei que nada sei. Burro.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Cidade Das Mulheres

Eu tava chapado. Muito chapado. Caminhando pela cidade e vendo as luzes. Sempre as luzes. Indo em direção ao metrô. De repente observei que estava num mundo cercado de mulheres. Só existiam mulheres no mundo. E eu era o único homem. Assim como naquele filme do cineasta italiano Federico Fellini em que o ator Marcelo Mastroianni acorda num trem e desce numa cidade onde só existem mulheres. Tava eu ali. Mas como é mundo moderno, metrô ao invés de trem. Calculei estar sonhando. Ou sei lá o quê. Uma delas falou algo comigo. A música do Roberto Carlos em meu ouvido não me deixava ouvir. Eu ia tirar o fone. Quando pintou um guardinha no meio da minha história.  De uniforme, cassetete e tudo. Ah, não! É mole? E ele gritou: vagão feminino! Fui. 

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Teto-Preto

Naquele dia faltou água na favela. A criançada tomava banho no chuveirinho. Uma menina gritou: mãe, eu não tô aguentando esse calor... eu vou meter minha cara no balde! Eu disse a ele: qual é cara, não anda com esse violão na capa não, que os caras vão pensar que é fuzil. Ele tirou o violão da capa e falou: você é muito medroso! Nós fomos para debaixo da escada. O Neguinho tava sentado no sofá com um sorriso congelado e no olhar serenidade como se aquele fosse o lugar mais interessante do mundo. Ele alcançou a iluminação. Entrei naquela nuvem de fumaça. Dois moleques chegaram. Um preto e um branco. Tímidos. Ele disse: esse cara fez aquele som que vocês gostam... Conversamos. Ele segredou: os dois maiores 157 da favela. Quando eu vi o Neguinho começando a se encurvar até tombar do sofá. Um bêbado gritou: teto-preto! As pessoas começaram a se aproximar. E aos poucos vieram os gritos. Teto-preto! Teto-preto! Parecia gol do flamengo. Gritando e dançando, todo mundo. 

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Tática Covarde de Guerra

Faz calor. Estou no quarto. O chão é de ladrilho. Deito ali sem camisa. Não adianta. Acordo suado. Boto o ventilador em cima de mim. Ele ri e sopra um ventinho de vez em quando. Um calor dos infernos, eu digo. Não dá para ficar na sala perto da janela; pois é onde bate o sol. As moscas atacam. Moscas do inferno, eu digo. Nesses dias em que estamos lesados pela quentura, elas usam essa tática covarde de guerra. Não dá para ficar em lugar algum. O termômetro zomba da gente marcando quarenta e cinco graus. Ele sabe que a sensação de calor é bem maior que isso. O motorista passa a toalhinha na cara. O cara no elevador diz: tá abafado. A fumacinha sobe do asfalto da Avenida Presidente Vargas. Eu penso que deus deu uns moles. Podia organizar tudo. Chover toda segunda de madrugada para não atrapalhar ninguém. E sem essa de quentura. Fodam-se os eco-chatos e suas teorias. Agora eu só quero matar essa mosca desgraçada que não me deixa escrever.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Cena de Cinema

O menino leva a menina à esquina. Eles acabaram de comer um cachorro quente na praça. É sábado à noite. Os dois caminharam por ruas escuras até lá. Ele tentou beijá-la. Ela virou o rosto. Ela disse: você tá aonde? Ele respondeu: em casa. Ela disse: então vem pra cá. Ele se lembrou dela dizendo: eu te amo, porra! Mas agora ele ouviu: nós não podemos ficar juntos, pois somos muito malucos. Fazer o quê? Ele pensou que o melhor momento que tiveram foi aquele em que ela encostou a cabeça em seu ombro dentro do ônibus. Mas agora eles estão parados na esquina. Ela dá um beijo em seu rosto.  Ele retribui com uma cara de bunda. E já decidiu uma hora antes que nunca mais vai ligar para ela. Que olha para ele com aquela cara triste de quem sabe disso. Os dois se despedem. Futuramente ele vai passar do outro lado da rua e não vai falar com ela. Normal. Eu saio do cinema com os olhos destruídos e vermelhos. Vou ao banheiro lavar o rosto.

terça-feira, 5 de julho de 2011

O Terror Dos Intelectuais!

Ela subiu para o ônibus que eu estava.  Roendo unha. Saia rodada.  Faixa na cabeça. Cara de hippie arrependida. De quem voltou de Woodstock a pé. Eu pensei “ih... essa mina tá por fora do Brasil. Tá por fora. Nem sabe aí. Nem sabe.” O Velho ao meu lado falava sozinho. “eu parei de ir ao Maracanã quando o Zico parou. Num vô mais. Pra quê? só chutão! Só tem chutão pro alto hoje em dia!” Eu percebi que ela me olhava por cima do livro. E quando isso acontecia tinha que evitar o olhar. Só que meu interesse era maior. Ficamos naquele jogo uns vinte minutos. Ela olha. Eu desvio. Ela olha. Eu desvio. Até que vi o nome do livro. Harry Potter. Se não fosse o Harry, seria Crespúsculo, A Cabana ou um Código da Vinci ensebado. Esses são os hits dos ônibus. País que ninguém lê. Que leiam essa porcaria mesmo. Nada de clássico. Nada de Prêmio Jabuti. Feira de Paraty. Eu sou o terror dos intelectuais!

sábado, 2 de julho de 2011

Pagode Meloso

Ele arrumou a casa toda. Posicionou os cigarros que ela gosta estrategicamente. Preparou a comida e pôs o vinho na geladeira. Só lamentou não saber fazer todas aquelas coisas direito. A felicidade subiu da virilha quando ouviu a campainha. Na verdade era o telefone. A voz de taxi-girl do outro lado da linha disse: você me desculpa? Desculpo. Primeiro ele desejou ser uma mulher histérica para dar um chilique. Depois se sentiu uma mulher de malandro. Mas foi o pagode meloso do outro lado da rua que estragou o seu sábado.