domingo, 13 de outubro de 2013

Vômito...

euforia. crise nervosa. agressividade repentina. coragem em excesso. palavras inoportunas. cara na lama. dedo na goela para voltar a beber. a garrafa vazia jaz na mão. vomita no ônibus. desonra a família. remédio no banheiro. uns, cantam. outros, batem. dança desengonçado. fuma cigarro. dorme com a cara no prato de comida. cochila no vaso sanitário. acorda ao lado de alguém que não conhece. sexo de risco. má conduta. conduta libidinosa. pega uma doença. o vômito jorra de todos os poros. vaga pela cidade de madrugada. esquece o caminho de casa. volta pra casa. ciúme desperto. chaga exposta. briga. larga o pescoço. vê o corpo inerte. trabalha com bafo. suor. delirium tremens. julgado. espancado. morre sem saber que morreu.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Levantou Poeira...

duas horas da tarde. o moleque sentado na grade olha o céu. passa o ferro velho sacolejante. as pessoas atravessam por aquele buraco na parede. o velho caboclo de chapéu toma o guaraná que é vendido numa garrafa de cerveja, e diz: nossa, parece até que alguém esqueceu esse lugar... o outro que passa o pano no balcão, retruca: esse lugar não evoluiu... mas não fica nem uma hora do centro! os evangélicos de domingo atravessam a rua. o moleque pula da grade. ele pula, e corre atrás da pipa. a minha cerveja esquenta no balcão empoeirado. um ônibus lotado levanta toda a poeira que cabe num pulmão. o moleque da grade canta com a pipa na mão... levantou poeira...

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

1904...

pulo do bonde. desço a ladeira com as mãos nos bolsos. assoviando. ele me pergunta: você está assobiando, porquê? digo: não sei. está feliz? pergunta. respondo. talvez... diz: talvez, você está assobiando, e não sabe porque está assobiando? eu digo: tudo bem, talvez o fato de eu estar assobiando não seja tão importante assim, entendeu? ele diz: então você está me dizendo que é um bobo alegre? não, só que existem coisas mais importantes que isso. a revolta nas ruas... sei lá! e você acha que com toda essa náusea, com todo esse medo, e essa sensação de sufocamento que a sociedade nos dá, como se alguém estivesse com as duas mãos colocadas sobre nossa garganta, ainda exista motivo para se andar assobiando cançonetas populares, por aí? eu digo: cara, se isso te irrita tanto assim, eu não assobio mais, falou? muito obrigado, senhor, com licença, passar bem. e ele seguiu com o seu chapéu e a sua bengala de escritor famoso. entrou na rua do teatro.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Alice no País das Maravilhas...

Alice pergunta ao segurança com toda a educação. vai ter de dar a carteira de identidade? o segurança do local diz com ironia, sim, e ainda vai ser revistada! é uma casa famosa onde se toca jazz de raiz universitário. Alice toma chá para ficar mais tranquila. o centro boêmio e histórico foi revitalizado depois de uma novela das seis. um pouco antes da cidade ser eleita sede dos jogos. Alice olha para o resto da fila cheia de japoneses. brasileiros. americanos. italianos... faz um escândalo, e berra: é lógico que eu vou ser revistada neste país! com os olhos em brasa. vermelhos. balança o black power com todo o poder. por ser da sua cor, seu cretino! qual o nome do filme? Alice No País Das Maravilhas!

domingo, 6 de outubro de 2013

Programa de Domingo...

rola um louvor na maquininha de música. aquela hora não tem ninguém na rua. não, aqui, neste lugar, ermo. ela atravessa. está com um salto que não combina bem com a sua saia rendada. cheia de babados de festa de quinze anos. o salto branco, também, não. a pobreza é uma tristeza. o andar desengonçado. a gordura da comida grudada em nossos óculos. em nossas casinhas. assim como os canos de descarga dos caminhões estão enfiados em nossas narinas. o centro da cidade abandonada é assim. a poeira pinta todas as paredes de cinza. a menina do outro lado da rua está sentada em frente a uma casinha. sentada numa estrutura de cimento feita para barrar a água da enchente. a tevê ao fundo. a porta de madeira entreaberta exibe o programa de domingo. é um programa apresentado por um rapaz louro. e afetado. é domingo na zona...

sábado, 5 de outubro de 2013

...Pra Todo Mundo!

acorda no escuro. beija a mulher que diz: quero dormir! beija o bebê que produz o som de quem não quer ser incomodado. na sala vê a luz do aparelho do filho adolescente que cobre a cabeça com um lençol. sons de teclas. diz: bom dia... o filho não escuta. na rua da favela diz a um policial: bom dia... fica no vácuo de novo. o cara da plataforma diz: pô... tá foda esse trem atrasando todo dia... encontra o amigo de infância. por educação, pergunta: e aí? o amigo responde: tá foda... e começa a falar mal do trabalho. da mulher. de toda a família. do time. do governo. chega ao supermercado. encontra o colega na escada. com o aparelho em uma das mãos, antes dele abrir a boca, sem tirar os olhos do aparelho, o colega diz: hoje tá foda... ele irritado responde: tá foda pra todo mundo! e pensa, será que eu sou o único norueguês que vê isso!

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Em Frente ao Buraco!

o segurança em frente a loja. o camelô desmonta a barraca de CDs e DVDs originais. ela olha para o meu black. para o meu casaco que parece ter saído de dentro de uma garrafa. pra minha cara de chapado. pros meus olhos vermelhos e gigantes como os do Lobo Mau, e me pergunta sobre o papelão em frente ao banco. fico em silêncio. ela estala a língua irritada, e diz para o menino: eu, hein... parece um retardado! eles desistem, e vão embora. graças a Deus. eu penso, quem me dera fosse um catador de papelão nesta cidade! um carro passa tocando funk. outro policial me pergunta: ocupação? e respondo: se disser escritor o senhor vai acreditar? ele me olha com pena, e me libera. acho que eles temem mais os terroristas. eu espero por minha mina em frente ao buraco de uma das estações do metrô de Nova Iorque. e o cara do transporte alternativo berra em nossas orelhas: Brooklyn, Bronx, Manhattan, Harlem!