Ontem a minha mina disse que não aguentava ver os crackudos na linha do trem. Eu já estive várias vezes numa cracolândia, e sei que é o inferno na terra. E que só não vê espíritos vagando quem não quer. Eu disse a ela que escrevesse sobre isso para poder desabafar. Nenhum individuo ou grupo tem o poder de mudar nem uma rua se a maioria não quiser. Nelson Mandela não libertou África sozinho. Alemanha nazista não era Hitler. O ministro Joaquim Barbosa não é o salvador da pátria. O Brasil não funciona. O apoio a cultura é ridículo. A educação é uma piada. E a saúde pública não existe. O sonho de mudar o mundo hoje é patético. O que tem feito o mundo avançar em alguns pontos é a sua própria história. Não há nada que garanta que uma ação vá ter um efeito imediato. Ou mesmo que vá ter um efeito a longo prazo. O quê não nos exime de fazermos a nossa parte. Não só para que possamos deitar tranquilos no travesseiro. Mas sim porque alguma coisa nos diz que a harmonia é o melhor negócio. Quando eu não jogo papel no chão, não faço isso por causa de uma propaganda, porque não tem ninguém vendo, ou porque alguém me disse que não deveria fazer. Faço porque junto a toda a informação que recebi, cheguei a conclusão de que realmente é o certo. Mas podia ter concluído o contrário. Sem essa pieguice de que mundo eu vou deixar para os meus filhos. Ninguém pode se anular como individuo em prol da sociedade. Mesmo nesta época do politicamente correto. Até porque quando somos bonzinhos, não nos desvencilhamos da sociedade. Nós somos o mal e o bem que habita nela. Eu também mato, estupro, e roubo. Embora não seja eu quem puxe o gatilho. Ninguém pode carregar o fardo. Até porque só muda quem está em dúvida. As verdadeiras vítimas são minoria. O Brasil é assim porque nós brasileiros queremos ou deixamos que ele fique assim. E mesmo que tenhamos avanços nas áreas mais críticas, nada nos garante que vamos evoluir como sociedade, ou que seremos felizes, que acredito ser o objetivo final. Em países ricos malucos entram em lugares atirando. E é onde estão os maiores índices de suicídios Por isso o pensamento não pode estar restrito a uma época, ou situação que normalmente é passageira. Mesmo para a minha filosofia teen.
terça-feira, 23 de outubro de 2012
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Foi Por Isso Que Aconteceu Aquilo!
Eu perguntei: você terminou o livro? Ela disse: não. Ah, o garoto queria se matar. Não gosto disso. Eu retruquei: mas você tem que ler para saber o que acontece. Então respondeu: eu nunca leio os livros até o final. Eu disse: porque? Ela: tenho medo de saber o que vai acontecer. Prefiro não ler. Depois eu me pus a pensar que o livro não acaba em suas páginas. Pois assim como na vida a coisa pode se inverter depois. Mudar de rumo, sei lá. Por isso que não gosto de autores que querem explicar tudo, que não deixam a gente imaginar nada, e que pensam que o leitor é um pária sem criatividade, ou inteligência para refletir porque aquele personagem se transformou no quê é hoje, por exemplo. Talvez ela não queira saber o final, por pensar que assim como na vida, ele pode ser bom ou ruim. Depende do ponto de vista. Eu não sei porque, mas a minha intuição me diz que já aconteceu algo que vai voltar depois. Mesmo que não seja nada tão extraordinário como a gente gostaria de imaginar. Alguma coisa que nos conforte. E que nos faça dizer, tá vendo? Foi por isso que aconteceu aquilo!
domingo, 21 de outubro de 2012
Horário de Verão
O meu pai acorda as seis da manhã, e vai comprar o jornal, o leite e o pão. A minha mãe liga o rádio e prepara o café. Ela se arruma enquanto o meu pai não chega. Eu levanto. Nós tomamos o café da manhã juntos. Os dois me beijam e saem de mãos dadas. Sete horas. Ela pega o trem. Ele pega o ônibus. E os dois pegam no trabalho as oito. Saem as cinco. Na volta, se eles apertarem o passo, ainda dá tempo de irem me buscar na escola. Pois levam do centro da cidade ao subúrbio, apenas quarenta minutos. Eu vejo os dois me esperando na saída. Sendo assim nessa época, a gente consegue aproveitar a luz do dia. Talvez a gente caminhe um pouco na praça, ou vá dê uma passadinha na casa de um parente próximo. Por isso que eu adoro este horário.
sábado, 20 de outubro de 2012
Na Casa do Tim
Eu fui a casa do Tim. Ele estava sentado num sofá assistindo televisão. Gordo igual um buda. Uma profusão de crianças correndo para todo lado. Sobrinhos, vizinhos, netos, talvez. O Tim me disse: sem cerimônia, Magrão. O Tim me chamava de Magrão. Ele empurrou o gato que estava ao seu lado. O bichano saiu num pinote em disparada para fora da casa. Eu havia imaginado outro cenário. Pensei que nós íamos para um estúdio cheio de instrumentos pendurados. Não havia privacidade. A tevê no último volume. Ele gritava com as crianças. A menina correu pra rua! Veio uma mulher da cozinha que parecia ser sua irmã. Ela perguntou: vamos comer rabada, Tião? Ele disse: vamos, o Magrão quer provar da tua rabada! E depois disse a ela: esse aqui é um cantor amigo meu, cuidado que cantor é tudo calhorda! Ela deu um risinho e voltou para a cozinha. O Tim em casa era um patriarca. Ele pegou uma lata e começou a enrolar um baseado. E me disse: se quiser mete a mão que do meu você não fuma. Eu fui cheio de esperança de falar sobre música ou quem sabe fazer alguma. Era uma terça feira. E fomos levar uma porção de crianças na escola. E depois fomos ao supermercado. Na volta ele tirou a camisa. Nunca pensei em ver aquela famosa pança preta. Aos poucos comecei a relaxar e a aproveitar o momento, e esqueci o negócio da música. Ele contava histórias engraçadas sobre os músicos. Era um comediante nato que dava a entonação certa imitando as pessoas. Depois que fomos buscar as crianças, o Tim me levou a um ponto de ônibus, e nós nos despedimos. Logo após fiquei sabendo que ele havia morrido. E me veio a mente aquela tarde tão agradável.
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
O Artista
Antigamente no subúrbio, quando a criança aprontava alguma peraltice, a mãe dizia: para de fazer arte menino! A criança era tida como arteira. Os malandros chamavam seus chegados de artista. Mas nem todo mundo que faz arte é artista. Nem todo mundo que trabalha com arte é artista. O ator Marlon Brando dizia não ter amor a arte, e que se o pagassem para ficar sem fazer nada, ele ficaria sem fazer nada. Billie Holiday ao ser indagada se sabia cantar, respondeu: e quem não sabe? Tem gente com livro editado, filme pronto, peça ensaiada, quadros expostos, que não é artista. Eu assisti a uma aula em que um professor de filosofia disse que um diploma não faz de ninguém um filósofo. Como Chico Science dizia, computadores fazem arte, e artistas fazem dinheiro. Hoje em dia com a facilidade tecnológica, existe uma enxurrada de gente fazendo arte. Mas são raros os verdadeiros artistas. Conheci pouquíssimos com aquele brilho no olhar. Embora esta frase seja um clichê, não deixa de ser verdadeira. O verdadeiro artista não se preocupa com nada. A única certeza que tem, é a de se dedicar e aperfeiçoar o seu ofício. Pois não tem tempo a perder. Igual aqueles filósofos antigos que não se casavam para não suprimir o tempo dedicado a filosofia. O escritor Charles Bukowski dizia não ter tempo nem para cortar as unhas. O verdadeiro artista pensa como artista, e se movimenta como artista. É como se o mundo fosse a sua tábua de criação. Como Henry Miller dizia: eu leio o mundo. Fama, dinheiro, e reconhecimento, podem fazer parte da vida mundana de um artista. Ou ser até uma necessidade para que continue propagando a sua arte. Mas não são preponderantes no resultado final de sua obra, que tem um valor abstrato para si mesmo, muito maior que esse temporal.
"A arte pertence ao inconsciente! O Artista deve expressar a si mesmo! Expressar a si mesmo diretamente! Não seu gosto, sua educação, inteligência, conhecimento ou habilidade". Schoenberg.
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
2003 Foi Um Ano Ruim
Eu tava magro. Nunca tive tão magro em minha vida. Todo mundo me perguntava se eu tava doente. O meu cabelo não parava de crescer, e eu não sentia nenhuma vontade de cortar. Eu vivia com o meu pai. Ele saia de manhã para trabalhar. Deixava alguns trocados para o pão em cima da mesa. Voltava à noite. Ele me dava boa noite e ia dormir. Eu olhava para as paredes descascadas do quarto, e pensava no que fazer. O que eu ia inventar agora. Todo mundo some quando se começa a envelhecer por baixo. Depois os putos reaparecem para relembrar a velha amizade. Seres humanos. Ninguém tocava a campainha. Ninguém me telefonava. Eu ia a biblioteca pública do bairro, mas já havia lido quase todo o seu pequenino acervo. Um urubu sobrevoava a casa. Eu queria me matar mais não tinha forças pra isso. Então me sentava em bancos de madeira, até a minha bunda criar calos, esperando ouvir alguma coisa que me tirasse daquela procrastinação. Nada. Final de semana eu arrumava uma nota de cinco, e me juntava com algum tipo derrotado. A gente ia ao supermercado, escolhia o vinho mais barato, e virava uma garrafa quente do gargalo. Alguma coisa me dizia que eu tinha que continuar. Viver é tão absurdo, mas ao mesmo tempo tão maravilhoso. Não me pergunte por que. Nessa época eu tive uma ideia de algo novo que podia fazer. Consegui me reinventar. Descobri que não existe luta, e que é preciso ter paciência.
terça-feira, 16 de outubro de 2012
Para Aonde Foram Os Crackudos?
Para aonde foram os crackudos. Hoje eu fui a Biblioteca Parque Manguinhos, e não vi nenhum deles por lá. As ruas estavam limpíssimas. E os traficantes, será que mudaram de ramo. Como uma população inteira evapora. Não que eu me preocupe com isso, pois como qualquer cidadão mediano, eu não me preocupo com ninguém. Mas queria saber. Só por curiosidade. Será que eles ascenderam, como dizem que aconteceu com algumas civilizações antigas. De repente eu estava lá, entre o Jacaré e o Manguinhos. Duas favelas pacificadas. Vi a polícia montada, como na época do Bota Abaixo. Vi o frisson das crianças querendo aparecer na televisão. Tia, vocês vão filmar aqui. As velhinhas felizes da vida. De repente percebi que estava sendo contagiado por aquele clima de Copa do Mundo, de Réveillon, e de Natal, em que mesmo os ateus comemoram. Percebi que era hora de voltar para casa. Pois quando a conta chega, sempre bate o arrependimento. Normalmente ela vem acompanhada da ressaca. E a ressaca moral é a pior delas. Quando você percebe que bebeu demais. E que a festa nem foi tão legal assim.
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