Mesmo depois de tanto tempo eu não consigo superar a sua morte. Embora hoje entenda os seus motivos. Mais do que negros nós éramos pobres. E não quero dizer com isso que os outros em outras condições não sofram. Mas nós tínhamos uma solidão diferente. Este abandono de não conseguir cumprir com o que esperam de nós. Somos homens que, ao carregar o peso da miséria, não comunicamos nossos sofrimentos. Era trabalhar excessivamente, ficar doente, beber a vida, e morrer relativamente jovem. Foi assim com o nosso avô, com os nossos tios, e até primos. Sempre era preciso buscar algum anestésico para aquela dor enorme; fosse o álcool, alguma droga, ou qualquer outro vício. As pessoas decentes e puras podem dizer o que elas quiserem sobre isso. Elas podem até conhecer o tipo de dor com a qual nós precisamos viver ou o contexto em que estamos inseridos. Mesmo assim, simplesmente não conseguem se pôr em nosso lugar. Nós pertencemos a mesma família. E isso faz com que a nós carreguemos esse temperamento. Para que um de nós sobreviva é preciso dobrar toda uma carga que apenas nós conhecemos. Pois ela é ancestral. Assim como um círculo que precisa ser interrompido.
quinta-feira, 31 de outubro de 2024
terça-feira, 22 de outubro de 2024
Hoje ainda é terça-feira
A pessoa no atendimento não era muito simpática. Ela falou sem olhar para o meu rosto. Talvez ela odeie o seu trabalho. Talvez ela esteja na profissão errada. Talvez isso, talvez aquilo, vá saber. A senhora no supermercado passou na minha frente. Foi sem perdão. Não sei se corto o meu cabelo. Ele está igual ao do Jimi Hendrix. Estou com pena de cortar. E com preguiça. A minha barba está parecida com as dos Beatles. As pessoas podem não gostar ou se sentirem ofendidas. Eu estou numa encruzilhada. Essas indefinições e dúvidas da vida é que são chatas. E hoje ainda é terça-feira.
segunda-feira, 21 de outubro de 2024
A Síndrome de Peter Pan
As academias queimam gordura, só não queimam a busca por uma juventude que já passou. Será que é isso o que chamam de Síndrome de Peter Pan? Ficar preso na Terra do Nunca. Nunca crescer. Mas, além dos benefícios de uma boa saúde, é claro. Você procura por seus amigos de infância e descobre que eles já cresceram. Volta ao velho bairro, mas está tudo mudado, os prédios, as pessoas, parece que você não reconhece mais ninguém. Se você estivesse parado, mesmo assim o mundo mudaria à sua volta. Uns mudaram. Outros morreram. Outros são tios e avós. É sempre a mesma velha história todo final de ano e no dia das eleições. Todo mundo está sobrevivendo. É como quando terminam as aulas das universidades e todos vão embora das cidades e não pode ter apego. Sentem saudades, deixam saudades nos que ficam, mas a vida precisa andar. Vamos nos encontrar novamente, não vamos? Sei lá! Se você tentar retornar ao passado para consertar as coisas pode ser que as deixe pior. Você é da antiga e sabe que é preciso tomar cuidado com a boêmia tardia.
terça-feira, 15 de outubro de 2024
Crítica à ignorância coletiva
Proporcionalmente, os apedeutas, ignaros e autômatos são a maioria esmagadora. As pessoas de ideias, curiosas e interessadas em novidades cabem em uma casa de dois cômodos, assim como palitos numa caixa de fósforos.
domingo, 13 de outubro de 2024
Mas só depois de ler os livros
É preciso ler os corpos, as pessoas, as coisas, os bichos, os semáforos. As frases pichadas nas paredes, os discursos, as figuras, as notas de rodapé, o mundo. É preciso ler tudo. Mas só depois de ler os livros.