sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

O Resto do Ocidente

Eu sou americano.
Eu tenho orgulho de ser sul-americano.
Eu sou latino.
Eu tenho orgulho de ser latino-americano.
Eu sou brasileiro. 
Eu tenho orgulho de ser afro-brasileiro.
Mas, aonde quer que eu vá...
Eu serei sempre um estrangeiro.

Por causa da minha classe.
Por causa da minha cor.
Por causa da minha arte.
Desconhecem a minha dor.

Por causa do que eu faço.
Por causa do que eu penso.
Não é um canto de acalanto.
É só um canto de lamento. 

Caos Menor

Não tem água na torneira. 
Em casa não tem ninguém.
Não tem nota na carteira.
Na biqueira você tem.
Parecia até toada.
Que lambada, você, hein?
Ninguém não me disse nada.
Ninguém não disse ninguém.
Não apontem as suas flexas para o mal...
Nem que seja um mal menor.
Não apostem as suas fichas no caos...
Nem que seja um caos menor.
Sentimento é o que fica.
Pensamentos vem e vão.
No final quem acredita.
É que se sagra campeão. 
Mas nem uma palavra dita.
Mas nenhuma frase, não.
Pois a impressão desdita.
É a primeira impressão.
Não apontem as suas flexas para o mal...
Nem que seja um mal menor.
Não apostem as suas fichas no caos...
Nem que seja um caos menor.

Opinião Pública

O que chamamos de opinião pública é regulada em sua maioria por indivíduos e grupos oriundos de escolas e universidades distribuídos para os meios de comunicação, legislação, instituições religiosas, forças de segurança, saúde,  mercado, e terceiro setor. Mesmo as pesquisas de opinião são enviesadas, pois passam pelo crivo de tais reguladores. É impossível saber o que vai nos corações e mentes das pessoas comuns. Talvez nem elas saibam, ou neguem; pois apenas seguem regras que lhes foram impostas ao nascer. Mas é melhor que seja assim, caso fosse dada voz a todos; a democracia estaria em risco.

Eu fui abandonado por minha mãe

Eu fui abandonado por minha mãe… Ela deixou que um sádico me puxasse de dentro do seu ventre aconchegante e luminoso para esta terra. Ele me agrediu com uns tapas humilhantes na bunda, e quando eu comecei a chorar uma de suas capangas me levou para junto de outros pobres coitados enfileirados distinguidos apenas por pequenas placas de identificação. Depois a minha mãe me deixou com uma mulher que os outros chamavam de "tia" e que me puxava pela mão enquanto eu berrava para que ela não me abandonasse. Eu fui levado para um edifício onde dizem que formam seres humanos melhores e que nos preparam para a vida… mas, como podem perceber, esse não foi o meu caso. Eu pulava de uma instituição para outra e depois ia para esses lugares onde pagam uma miséria para que compre seu uniforme, coma, e volte no dia seguinte. Eu insistia para que a minha mãe fosse comigo; mas ela negava dizendo que eu precisava aprender a me virar, e eu me virava para outro lado. A última vez que minha mãe me abandonou ela se foi sem previsão de volta. Mas próximo a ela pude sentir o céu onde poderemos ficar juntos de novo, dessa vez eternamente. Enquanto isso eu espero aqui neste purgatório com outros milhões de pobres diabos órfãos que vagam sem pai nem mãe por este mundo onde a vida é dura e a morte é certa.


Na Academia

Na academia você percebe que não malha nada. Até que de tão fraco descobre que os mais fortes são os que frequentam os concursos de halterofelista.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

O Estudante

O estudante lê o mesmo parágrafo novamente. Ele está na solidão no silêncio do quarto. Procura o significado de dois conceitos e três palavras. Uma pássaro canta lá fora. Ele se distraí. Lê o mesmo parágrafo novamente. Caí a noite. O mesmo parágrafo novamente…

domingo, 28 de janeiro de 2024

Cidade Nova

A motivação para a escrita veio quando por curiosidade passei a ler sobre a história do samba e cheguei às suas raízes. Desci à Belle Époque com o seu encanto e as suas mazelas. Isso com o apoio de inúmeros autores; entre pesquisadores, jornalistas, cronistas, memorialistas, romancistas, e poetas. Inclusive conversei com guias e malandros vivos. Creio ter escrito do ponto de vista dos pobres; da malandragem, dos capoeiras, dos moradores dos cortiços, dos moradores dos morros, dos artistas, da cidade cosmopolita, das mulheres da vida, e dos boêmios. Além da inclusão de personalidades importantes da época e personagens de sua ficção. Com exceção de alguns autores daquele tempo, não conheço romances produzidos com esse enfoque. Não estou dizendo que não existam. O livro abrange o final do século dezenove e início do século vinte. Mas os acontecimentos nele resgatados nem sempre são fiéis ao tempo histórico. Por isso não pode ser definido como histórico e muito menos jornalístico. Nem era essa a minha intenção. Não sou historiador ou jornalista. A proposta era escrever um livro em que as pessoas pudessem viver por alguns momentos as fantasias e a realidade sombria pouco conhecida daquele tempo do centro da cidade do Rio de Janeiro. Após uma pesquisa de dez anos para Cidade Nova, eu perdi toda a mágoa que sentia por minha cidade ser tão desigual e violenta. Serviu de consolo saber que ela sempre foi assim.