sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Mais um Dia de Verão...


A brisa que passa, na beira da praia, no rastro da onda do mar

Deixando um lastro, de luz solar

É um atropelo, do que está para chegar

O destempero, que vem acomodar

Dentro do quarto, no escuro da tela, eu quem te vejo dormir

A visão mais bela, daqui da janela, é sempre você a sorrir

Futuro sem trela, numa esparrela

Todo o prazer vem daqui

Vamos mergulhar na escuridão do mar

Fazer amor até o dia raiar

Em teu calor e sem saber nadar

Chegar tão fundo até o sol brilhar

A vida que resta, a tarde da sesta, é mais um dia de verão

A sua mão destra, a rede na aresta, o rés desnível do chão

Biquíni aperta, eu quem não presta

Você chamando a atenção

Todas as férias, com alguma féria, então será sempre assim

Na casa fresca, de segunda a sexta, dentro do meu pixaim

Com ânimo dobre, você quem resolve

Por mim nunca mais vai ter fim

Vamos mergulhar na escuridão do mar

Fazer amor até o dia raiar

Em teu calor e sem saber nadar

Chegar tão fundo até o sol brilhar

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Nelson e Otto...

             Esses dois sujeitos mal-ajambrados caminhavam numa rua do centro baforando os seus mata-ratos importados do Paraguai, quando uma viatura apinhada de policias com braços e armas de fora se aproximou. Uma voz gritou: “Polícia!” Nelson comentou entredentes para Otto: “Como se a gente não soubesse.” O policial ao sair do carro disse para os dois – Documentos! - Nelson se preparava para pegar a carteira no bolso detrás da calça, quando ouviu a pilhéria do amigo – Só temos instrumentos… – o policial se virou para os dois irritados.

 – O que foi que disse cidadão? – Eu disse que está aqui. Otto respondeu enquanto o amigo suava frio. O homem perguntou: “Vindo de onde indo para onde?”, “Atrasados para uma entrevista de emprego, doutor.”, “Tem certeza de que estão procurando trabalho?” o policial franzia o cenho enquanto conferia os documentos. De repente os outros policiais acenaram para que o colega se fosse. Devia ter surgido alguma ocorrência. O soldado devolveu os documentos e disse: “Se adiantem cidadãos!”

Os dois chegaram ao rabo da fila que dava volta no quarteirão. Homens e mulheres com expressões cansadas e olhares sonolentos. Nelson disse para o amigo: “Mas Otto, como aquele policial pôde me chamar de cidadão se o meu auxílio é tão pouco?”, “É mesmo, como é que pode?” o amigo respondeu enquanto mais gente parava atrás deles. O senhor que vendia cafezinho cochilava com a TV ligada. Uma mulher próxima abria a boca num bocejo.

Na televisão um político dava entrevista num desses jornais que pegam o trabalhador ao sair da cama. Ele dizia: “O homem da rua sabe do que eu estou falando!” Nelson tentava acender a guimba quando disse – Otto, será que quando fala sobre o “homem da rua” ele está se referindo à gente? - “Creio que sim, Nelson. Creio que sim.”, “Otto, o que você prefere, ser um homem da rua, ou um cidadão?” Otto como um personagem de novela coçou o queixo antes de responder: “Nelson, com sinceridade. Eu acho que prefiro ser chamado de cidadão. É mais moderno!”

As vagas oferecidas não passavam de setenta, mas havia um mar de pessoas encostado naquelas paredes. Foi quando apareceu um morador de rua. Ele carregava sua sacola nas costas, e era uma espécie de “homem do saco” com o qual as mãos atemorizavam as crianças antigamente. Usava barbas longas e estava todo sujo. Parou à frente da fila na altura em que os dois amigos estavam e disse – Vocês só querem trabalhar com a caneta… Na pedreira tem vaga! - parte dos desempregados desabou numa gargalhada contagiante. Nelson comentou com o amigo – Otto, olha como é o humor do povo brasileiro! Mesmo na desgraça ele faz piada! Olha a veia cômica do brasileiro!”, Otto perguntou: “Mas então Nelson, o que você prefere: homem da rua? Homem do povo? Ou Cidadão?” Nelson pensou um pouco e respondeu - Eu fico com homem do povo. Sei lá, soa mais original!

Um helicóptero de noticiário da manhã sobrevoava o lugar onde estavam como que para fazer alguma matéria. Desceu de um carro o homem de óculos; celular numa das mãos, e uma revista Piauí na outra. Ele se dirigiu a eles - Os senhores podem me informar que fila é esta aqui? - Nelson mais escrachado respondeu: “Só se o senhor emprestar a revista para passar o tempo!” O homem entregou a publicação mensal sem pestanejar. “É uma fila de emprego para faxineiros de uma cadeia de lojas.” O sujeito falou no aparelho espreitando a aeronave: “É uma fila de emprego.” Eles ouviram a voz do outro lado – Os populares disseram isso? - Sim! ele respondeu e partiu.

Agora Nelson e Otto estavam vidrados na revista. “Então Otto, nós somos cidadãos, homens da rua, homens do povo, ou populares?”, Otto respondeu: “Eu acho que nós somos isso tudo, Nelson!” O amigo disse: “É por isso que te admiro, Otto! Você representa a inteligência brasileira!”, “É, mas agora para que ela seja mantida necessito de um café.” Nelson contou as moedas e viu que a quantia estava certa para a passagem da volta. Então leu uma frase na revista, se virou para Otto e disse: “Imagine-se num barco num rio com árvores de tangerina e céu de goiabada!” Otto lendo a revista respondeu por sobre os seus ombros: “E bebendo tubaína!”. Nelson ao perceber que o amigo descobrira o plágio disse: “Otto, ainda serei um frasista como você!”. Nesse momento um funcionário da empresa apareceu - “Vamos organizar a fila!”, “Amém!”, disse uma voz sufocada por uma máscara.

 

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Emanuel e Isabela...


Emanuel era um cachopo de Abrantes…

Era um puto diferente dos restantes!

Enquanto todos só falavam de internet e outros bichos

Emanuel sempre dizia: por aí, mas nem por isso!

Emanuel escrevia, e lia poesia

E discutia sobre tudo, mesmo, até filosofia

Emanuel era um cachopo de Abrantes…

Dos antigos dos que existiam antes!

Emanuel era um tipo muito louco diferente

E sabia lidar, lidava com toda a gente

Da Doutor Manuel, da ESTA, da Solano

Emanuel era DJ, e tocava piano

Emanuel era um cachopo de Abrantes…

Bastante sossegado, e contagiante

E ele se apaixonou pela linda Isabela

E disse a ela: rapariga tu és bela!

Comparou a sua beleza com os jardins da fortaleza

Usava um vocabulário, abissal, da profundeza

Emanuel era um cachopo de Abrantes…

Com uma miúda apaixonante!

Emanuel mostrou a ela como o tempo se divide

Eles assistiam séries e caminhavam ao ar livre

Gostavam de jogar, mas amavam a cultura

Inclinados ao teatro, ao cinema, e a leitura

Emanuel e Isabela de Abrantes…

Coração lapidado em diamante!

Emanuel e Isabela com planos para o futuro

Um casal de miúdos e um sentimento puro

Ninguém duvidava que eles fossem ficar juntos

E hoje por onde passam continuam sendo assunto

Emanuel e Isabela de Abrantes

Emanuel e Isabela de Abrantes


Imagem: CM Abrantes